quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Dilma e Cunha jogam tudo para controlar o PMDB

• Preocupado com impeachment, Planalto tenta reeleger Picciani

• Em meio à tragédia da zika, ministro da Saúde vai tirar licença do cargo só para voltar à Câmara e votar em aliado; presidente da Casa, que apoia Hugo Motta, passará por um teste importante para seu futuro

No primeiro enfrentamento deste ano, a presidente Dilma e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, jogam pesado para ter o controle do PMDB na Casa, onde terá início a análise do impeachment. Em votação secreta, a bancada peemedebista escolherá hoje seu líder entre Leonardo Picciani, que se associou ao Planalto, e Hugo Motta, ligado a Cunha. Com a disputa acirrada, o governo liberou o ministro da Saúde, Marcelo Castro, que vai se licenciar em meio à epidemia de zika para votar em Picciani. Para o presidente da Câmara, que enfrenta processo de cassação, será teste de força.

Soa o gongo para Dilma e Cunha

  • Preocupado com impeachment, Planalto joga pesado para controlar PMDB na Câmara

Júnia Gama, Leticia Fernandes - O Globo

- BRASÍLIA- Em uma disputa apertada, a liderança do PMDB na Câmara será definida a partir das 15 horas de hoje tendo como pano de fundo uma queda de braço entre o governo e o presidente da Casa, o oposicionista Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), que trará repercussões para ambos os lados. O governo aposta suas fichas na recondução de Leonardo Picciani ( PMDB- RJ) e para tanto deu aval para que o ministro da Saúde, Marcelo Castro, deixe o cargo em meio à crise do vírus zika para dar seu voto ao aliado. A saída será publicada no Diário Oficial de hoje. Uma vitória de Picciani pode garantir maior tranquilidade na votação de matérias do ajuste fiscal e na tentativa de sepultar o impeachment.

Para o governo, a vitória de Hugo Motta (PMDB- PB), cuja candidatura foi criada por Cunha, significará o aprofundamento da instabilidade no Congresso vivida no ano passado e uma barreira a medidas de recuperação da economia. Por outro lado, para Cunha, a recondução de Picciani ao cargo exporá seu enfraquecimento em um momento em que necessita de todo o apoio político para sobreviver às denúncias de que é alvo na Operação Lava- Jato. Já a vitória de Motta mostrará que, apesar das seguidas denúncias, o presidente da Casa ainda é o grande líder do maior partido da Câmara.

Os dois grupos trabalharam intensamente nos últimos dias para conquistar votos e, apesar de ambos candidatos cantarem vitória, aliados admitem que o resultado da eleição, que será feita por voto secreto em urna eletrônica, é imprevisível. Enquanto Hugo Motta contou com o engajamento pessoal de Cunha em sua campanha, Picciani teve apoio do governo e dos correligionários no Rio de Janeiro, inclusive com a exoneração de secretários do estado e do município para ampliar sua votação.

A saída temporária do ministro da Saúde dá a dimensão da incerteza que ronda a eleição. Ele só desejava deixar o ministério caso seu voto fosse considerado essencial para a vitória de Picciani. Diante das pressões de Eduardo Cunha, que procurou o ministro nos últimos dias para tentar demovêlo da ideia e alertar que poderia sofrer constrangimentos na Câmara, Castro ensaiou recuar. Ontem, o ministro Jaques Wagner ( Casa Civil) veio a público incentivar a saída do colega, afirmando que não havia “óbice” do governo e que ele tem o “mandato a preservar”.

Auxiliares do Planalto avaliaram que, mesmo que o voto isolado de Castro não altere a disputa, será uma forma de o ministro trabalhar para o governo, que neste momento considera mais importante reconduzir Picciani à liderança que evitar eventuais estragos à imagem do ministro. Mais do que o voto em si, o sinal de prestígio com a ida do ministro poderia influenciar a decisão de alguns deputados, segundo análise de assessores da presidente Dilma Rousseff.

— Houve uma avaliação de danos e ficou constatado que o dano maior e mais extenso é se Picciani perder a liderança do que um arranhão de imagem para o ministro Marcelo Castro e um estremecimento com o grupo de Hugo Motta — afirma um auxiliar do Planalto.

No início do ano passado, Cunha venceu a disputa com o governo pela presidência da Câmara, o que resultou no aprofundamento da crise política, com consequências na economia, já que o peemedebista se dedicou a armar as chamadas “pautas- bomba”, obrigando o Planalto a concentrar esforços em desarmálas. No fim do ano, Cunha realizou o que o governo mais temia: aceitou um pedido de impeachment contra a presidente Dilma.

Agora, enfraquecido pelas denúncias de corrupção no esquema de desvios na Petrobras investigado pela Operação Lava-Jato, Cunha tenta novamente derrotar o governo, desta vez usando o deputado de apenas 26 anos, de quem se aproximou no ano passado. Foi neste contexto que Dilma abriu uma interlocução direta com Picciani em meados de 2015 e, agora, abraçou sua candidatura — que também é patrocinada pela cúpula do PMDB carioca — como forma de fazer um contraponto ao oposicionismo de Cunha. Para interlocutores de Dilma, o que o governo mais busca neste momento é estabilidade no Congresso para ter chances de prosperar na recuperação econômica, o que não será alcançado caso o grupo de Cunha saia vitorioso hoje.

— Ao governo interessa tudo, menos instabilidade no Congresso. Não só por temas específicos, como o impeachment e a CPMF, mas para que seja possível retomar a previsibilidade e a confiança no país. Embora Hugo Motta tenha lançado algumas pontes de diálogo com o governo, a influência de Cunha sobre ele é clara — afirma um auxiliar da presidente.

Apesar de Picciani ter dado sinais a Cunha de que não haverá perseguição caso se mantenha na liderança, o presidente da Câmara teme que seu destino se complique com a derrota, que passaria a impressão de esvaziamento de seu poder entre os deputados do PMDB. Cunha enfrenta processo de cassação do mandato no Conselho de Ética e denúncia ao Supremo Tribunal Federal, que pode torná-lo réu em breve. Por esse motivo, em seus pedidos de voto, o presidente da Câmara tem dado o tom de se tratar de uma disputa de vida ou morte. Se por um lado a estratégia garante alguns votos de indecisos, por outro, a pressão aumenta a possibilidade de traições por parte de apoiadores dos dois lados.

A eleição promete ser disputada voto a voto. Ontem, os candidatos e seus principais cabos eleitorais montaram uma força-tarefa: revisaram suas listas de apoio, se reuniram com parlamentares, telefonaram para uns, almoçaram com outros e comentavam com frequência sobre a suposta lista de apoios do adversário. O grupo que apoia Hugo Motta orientou os deputados a pedirem votos para parlamentares com quem têm mais afinidade pessoal.

— Quem falar que tem uma margem folgada está mentindo, vai ser voto a voto. Não tem nada folgado, mas trabalhamos para ter alguma margem para compensar possíveis mudanças — disse o deputado Lúcio Vieira Lima (BA), aliado de Motta.

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