quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Dora Kramer: Silêncio eloquente

- O Estado de S. Paulo

Apesar de todos os pesares e dissabores desabonadores vividos ultimamente, o ex-presidente Luiz Inácio da Silva ainda não perdeu o posto de personagem central da política brasileira. De longe é a figura que desperta maior interesse e recebe mais destaque por parte dos meios de comunicação. Basta acontecer com Lula para que qualquer fato, fala e/ou ato virem notícia.

Câmeras, luzes e microfones estão permanentemente à disposição dele. A recíproca, contudo, não é sempre nem necessariamente verdadeira. Em situações adversas, por exemplo, prefere fazer de conta que não dispõe desse acesso pleno, cala e foge de contato com pessoas ou ambientes passíveis de questionamentos.

Nessas ocasiões entra em cena o “Lula fraquinho”, esculpido pela imaginação publicitária de João Santana. É o perseguido, vítima das elites revoltadas com seu sucesso e absolutamente inconformadas com a redução da miséria no País. Trata-se de um contraponto ao “Lula fortão” (criado pelo mesmo autor) que por enfrentar tudo com o destemor de um legítimo sertanejo, tornou-se todo poderoso.

A este é dado o direito de desfrutar de todo o tipo de favores concedidos por áulicos oriundos das elites, claro – e beneficiamentos a título de compensação pelos serviços prestados ao País, ainda que ao arrepio da legalidade e da moralidade. A “coisa mais natural do mundo”, nas palavras do companheiro Gilberto Carvalho.

Àquele, o fraco, é concedida a prerrogativa do silêncio conveniente. Faz o papel do ofendido, enquanto os porta-vozes escalados para sua defesa rebatem as “calúnias” com muitos adjetivos e nenhum argumento substantivo.

Lula é alvo de quatro investigações: no Ministério Público do Distrito Federal, por suspeita de tráfico de influência em favor de empreiteiras que o contrataram para palestras; na Operação Lava Jato por suposta ocultação de patrimônio do sítio Santa Bárbara, em Atibaia; na Zelotes, em decorrência de medidas provisórias que beneficiaram o setor automobilístico; e no MP de São Paulo, por força de inquérito que apura a compra de um apartamento no Guarujá e a muito mal explicada reforma feita pela construtora (OAS) na unidade 164-A.Obra supervisionada por Marisa Letícia até o momento em que a existência da empreitada veio a público.

Diante disso, Lula silencia e o PT põe em marcha uma estratégia de defesa em duas frentes: uma para pedir “respeito” à história e à trajetória do comandante – isso sem o menor pudor em distribuir ofensas e acusações a torto e a direito em relação aos ditos perseguidores – vítima de “linchamento político e moral”, e outra para convidar o País a mudar de assunto. “Vamos deixar de lado o pessimismo e construir vitórias”, apela a mais recente propaganda do partido.

Esse esforço seria apenas inútil não fosse antes de tudo contraproducente. Além de não corresponder à verdade, a alusão ao linchamento não responde às questões objetivas em jogo, apenas tergiversa. A ideia de mudar de assunto equivale à confissão de que o PT não compartilha do interesse público pelo combate à corrupção.

A única maneira decente e eficaz de reduzir ou mesmo eliminar os danos tão temidos pelo partido ao seu último bastião, seria Lula se valer do monumental espaço permanentemente franqueado a ele nos meios de comunicação e rebater com lógica, moderação, franqueza, consistência e, se possível, farta documentação, cada uma das acusações desmontando, com fatos, as versões que lhe mancham a reputação.

O silêncio, ao contrário, confere ares de consentimento às suspeitas e serve como terreno fértil às alegadas difamações.

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