terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Luiz Carlos Azedo: Doações sob suspeita

• O desvio de recursos da Petrobras para os envolvidos no escândalo está sendo comprovado por meio de farta documentação sobre operações bancárias

- Correio Braziliense

O juiz Sérgio Moro, responsável pela Operação Lava-Jato na primeira instância da Justiça, enviou para a Justiça Eleitoral diversas denúncias e sentenças relacionadas às empreiteiras Camargo Correa, UTC, Engevix, Galvão Engenharia, Mendes Júnior, Setal Óleo e Gás, Odebrecht e Andrade Gutierrez que mostrariam o desvio de propinas para campanhas eleitorais. Sugeriu ainda que delatores do esquema de corrupção da Petrobras fossem ouvidos dentro de uma ação que investiga a eleição da presidente Dilma Rousseff e do vice Michel Temer.

O assunto é nitroglicerina pura, para usar um velho jargão. Esse explosivo líquido foi descoberto pelo italiano Ascânio Sobrero em 1847 e continua sendo um dos mais potentes que existem. Amarelo-esverdeado, tem moléculas muito instáveis, liberando grandes quantidades de gás e calor. O gás produzido se desloca a 7.700 metros por segundo, ou seja, tem potência maior que a TNT, cujas moléculas de gás se deslocam a 6.700 metros por segundo. Qualquer queda, fricção ou aumento de temperatura causa sua explosão. Em 1866, o químico sueco Alfred Nobel misturou-a com uma substância inerte para criar a dinamite, tão potente quanto, porém, de manuseio mais seguro.

A sentença de Moro relativa à Setal é explosiva: “Destaco que na sentença prolatada na ação penal 5012331-04.2015.404.7000 reputou-se comprovado o direcionamento de propinas acertadas no esquema criminoso da Petrobras para doações eleitorais registradas. Por ora, é a única sentença prolatada que teve fato da espécie como objeto””. Declararam que parte dos recursos do esquema da estatal era destinada a doações eleitorais o doleiro Alberto Youssef, o ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa, o ex-gerente Pedro Barusco, o executivo Augusto Mendonça, o lobista Milton Pascowitch e o dono da UTC Ricardo Pessoa.

A ação em exame no TSE é uma das quatro já propostas pelo PSDB para cassar o mandato da petista e do vice, e visa à diplomação do senador Aécio Neves (PDSB-MG), segundo colocado na disputa eleitoral. O partido aponta abuso de poder político e econômico no pleito. O PT reage à denúncia com o argumento de que todas as doações foram legais. Em sua defesa, o vice-presidente Michel Temer (PMDB), que se antecipou à presidente Dilma, também afirma que as doações que recebeu das empresas investigadas foram legais. Segundo ele, a ação do PSDB não passa de inconformismo de perdedor. As empresas investigadas doaram mais de R$ 40 milhões para a campanha do tucano Aécio Neves (MG), argumenta.

A decisão no TSE em relação às doações de campanha antecipará o debate jurídico sobre o envolvimento do PT no escândalo da Lava-Jato que será travado no Supremo Tribunal Federal. A campanha de Dilma Rousseff teria recebido do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto R$ 4 milhões desviados da Petrobras. Caso isso seja comprovado, haveria base legal para cassação da chapa. A relatora do processo é a ministra Maria Thereza de Assis Moura, que decidirá se vai incluir no processo os novos materiais da Lava-Jato. Ela havia proposto a rejeição da ação, mas foi voto vencido no tribunal. Mesmo assim, foi mantida na relatoria pelo presidente do STF, ministro Dias Toffoli, como é de praxe naquela Corte. O julgamento do TSE, porém, deverá ocorrer sob a presidência do ministro Gilmar Mendes, que assumirá o lugar de Toffoli.

Lavagem
A discussão sobre a natureza das doações eleitorais é complexa. No caso da Operação Lava-Jato, o desvio de recursos da Petrobras para os envolvidos no escândalo está sendo comprovado por meio de farta documentação sobre operações bancárias. É com base nelas que o ministro Sérgio Moro tem proferidos sentenças condenatórias. No caso dos recursos destinados aos partidos legalmente, também há comprovação da origem do dinheiro pelo rastreamento das operações bancárias, no caso, a Petrobras, mas todos os políticos e partidos citados nas delações premiadas, inclusive alguns da oposição, alegam que as doações suspeitas foram legais.

A cassação dos políticos comprovadamente envolvidos será líquida e certa no caso de comprovação de caixa dois; no das doações “legalizadas”, a decisão é mais complexa. É nessa zona de sombra que o Palácio do Planalto trabalha para evitar a cassação de Dilma. Mas o que será feito com os partidos que “lavaram” o dinheiro da corrupção ao declarar as doações, especialmente o PT, cujo tesoureiro comandava o chamado petrolão? A cassação do registro partidário é uma decisão tão ou mais difícil do que a da chapa de Dilma Rousseff. Em ambos os casos, o que está em questão é o Estado de direito democrático.

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