segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Marcus Pestana: A crise da saúde no Rio: a ponta do iceberg

- O Tempo (MG)

Grande repercussão obteve a crise da saúde no Rio de Janeiro no fim de 2015. Atraso de salários, fechamento de hospitais, restrição ainda maior de acesso. Cartão de visitas do país, Estado das Olimpíadas de 2016 e endereço de importantes veículos da imprensa nacional, tudo o que ali acontece reverbera por todo o Brasil.

Prontamente, a presidente da República e o Ministério da Saúde ensaiaram uma operação emergencial de socorro, com promessa de repasses adicionais. Nada contra. Todos nós torcemos para que os moradores do Rio de Janeiro tenham uma saúde digna. A questão é outra.

Em primeiro lugar, os direitos assegurados pela Constituição de uma assistência integral, universal e de qualidade é para todos os brasileiros. Em segundo lugar, a crise de financiamento e gestão do SUS não se circunscreve só ao Rio de Janeiro. E, em último, como vou tentar demonstrar, a situação do Rio de Janeiro não é, nem de longe, a pior. Se lá há complicações, imaginem a crise silenciosa, sem repercussão na mídia nacional, nas regiões mais pobres. Além de tudo, como herança do período em que era a capital da República, a cidade do Rio é a única que possui uma rede hospitalar federal para além dos hospitais universitários.

Os números são chatos, mas não mentem. Vamos a eles. A crise no Rio se concentrou na assistência ambulatorial e hospitalar em que residem as ações de média e alta complexidade. Em 2015, o ministério repassou ao Rio de Janeiro, no teto de média e alta, R$ 268 por habitante/ano. Comparemos com quatro outros Estados selecionados: Minas Gerais recebeu R$ 224; Piauí, R$ 204; São Paulo, R$ 188; e Bahia, R$ 177.

Poderíamos imaginar que os outros Estados compensam a diferença de tratamento por serem mais ricos, prósperos e com arrecadação anual tributária por habitante maior. Ledo engano. Pegando dados de 2014, vemos que não. Enquanto São Paulo teve R$ 4.757 de receita orçamentária anual por habitante, Rio ficou com R$ 4.604, Minas, com R$ 3.537, Bahia, com 2.508, e Piauí, R$ 2.241. Ou seja, excetuando São Paulo, é o Rio de Janeiro que tem maior capacidade autônoma de dar respostas.

Sou um apaixonado pelo Rio. Longe de mim aqui questionar qualquer coisa que possa ajudar o Estado a superar sua crise na saúde. A preocupação é outra: demonstrar o estrangulamento financeiro do SUS e as dificuldades derivadas no cotidiano da população. Se no Rio temos problemas, muito maiores temos no resto do país.

O Brasil precisaria investir cinco vezes mais se quiséssemos dar ao SUS o padrão de bons planos privados de saúde ou o oferecido em países como Portugal. Vivemos uma profunda crise fiscal. O esgotamento do Estado de bem-estar brasileiro fundado em 1988 é evidente. Temos de discutir o SUS a sério, e não ficarmos com atitudes reativas, como na recente crise do Rio, de soluço em soluço, dentro de uma crise que é crônica no sistema público de saúde.
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Marcus Pestana é deputado federal (PSDB-MG)

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