sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Para Lava- Jato, propina da Petrobras pagou marqueteiro

• João Santana diz que não sabe origem dos US$ 7,5 milhões

Procurador acredita que US$ 4,5 milhões recebidos por casal em conta no exterior foram destinados a quitar dívida de campanhas do PT. Iniciativa teria sido do ex- tesoureiro do partido João Vaccari Neto

A força-tarefa da Lava- Jato suspeita que o PT usou dinheiro desviado da Petrobras para quitar dívidas que o partido tinha com o marqueteiro João Santana, responsável por campanhas do ex-presidente Lula e da presidente Dilma. “Vaccari mais de uma vez disse a operadores: ‘ Paga lá que estou devendo a tal pessoa e você abate aqui.’ Suspeito que isso aconteceu”, disse o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, referindo- se ao ex- tesoureiro do PT. À PF, Santana negou que o dinheiro na Suíça tenha relação com campanhas no Brasil e afirmou não saber a origem dos recursos. Para a Lava- Jato, depósito de US$ 4,5 milhões que o lobista Zwi Skornicki fez na conta do marqueteiro era propina da Petrobras.

MP: propina irrigou conta

• Lava- Jato investiga se PT pagou serviços de marqueteiro com dinheiro desviado da Petrobras

Renato Onofre, Cleide Carvalho e Thiago Herdy* - O Globo

- SÃO PAULO e CURITIBA- O marqueteiro João Santana negou ontem ao depor que o dinheiro recebido em uma conta na Suíça tenha relação com campanhas políticas no Brasil, mas a força-tarefa da Lava- Jato já relaciona o dinheiro recebido por ele, que fez campanhas para o PT, com o esquema de propina da Petrobras. Os procuradores investigam se o operador Zwi Skornicki depositou US$ 4,5 milhões na conta de Santana na Suíça a pedido do ex- tesoureiro do PT João Vaccari Neto, que, dessa forma, quitaria despesas do partido com o publicitário.

Para os investigadores, a propina teria saído da plataforma P- 52 da estatal ou de sondas do pré- sal contratadas do estaleiro Keppel Fels, representado por Skornicki.

— A Lava- Jato mostra que o pagamento a partidos políticos é um sistema de conta e compensação. O Vaccari mais de uma vez disse a operadores: “Paga lá que eu estou devendo a tal pessoa e você abate aqui”. Suspeito que isso aconteceu. Zwi foi orientado a pagar Santana por algum serviço que lhe deviam — disse ao GLOBO o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima.

O delator Pedro Barusco, ex- gerente de Serviços da Petrobras, disse em depoimento que Skornicki liquidou em 2013 uma “alta soma de propina”, acumulada em contratos de 2003 a 2009, e que costumava “conversar diretamente com Vaccari”. Em janeiro, em novo depoimento, Barusco disse ter ouvido de Skornicki que ele “havia pago cerca de US$ 4,5 milhões adiantados para Vaccari” por contratos de sondas com a Sete Brasil, que tem a Petrobras como sócia. O valor e as datas coincidem com os pagamentos a Santana. Entre as campanhas que ele fez, estão a do ex-presidente Lula (2006) e da presidente Dilma Rousseff (2010).

Mônica liga depósitos a campanha em Angola
Os pagamentos de Skornicki a Santana foram feitos entre 2013 e 2014, em nove parcelas — três durante a campanha de reeleição de Dilma. O banco usado para fazer as transferências, o Delta, foi o mesmo usado pelo operador para pagar propina a Barusco no exterior. Segundo o delator, o dinheiro da P- 52 foi todo para o PT e para Renato Duque, então diretor de Serviços da Petrobras.

Para o procurador, o dinheiro que chegou a Santana saiu da Petrobras. Em depoimento à LavaJato, anteontem, Mônica Moura, mulher de Santana, disse que os depósitos de Skornicki são vinculados à campanha presidencial de Angola.

— Não existe explicação lógica para não dizer que o dinheiro pago por Skornicki não saiu da Petrobras. Depois de tudo que aconteceu no mensalão, é no mínimo ingenuidade — disse o procurador.

Ao depor ontem, Santana admitiu ser o controlador da conta da Shellbill na Suíça, mas atribuiu à mulher a responsabilidade pela movimentação financeira. Ele não soube esclarecer a origem dos valores que entraram nessa conta, nem o destino deles. Afirmou que Mônica sempre cuidou da área administrativa e financeira das empresas, mas não soube dizer se ela tinha procuração para movimentar a conta fora do Brasil.

Santana alegou que a conta na Suíça foi aberta no fim dos anos 1990. Garantiu que pretendia legalizá-la, mas “sempre houve dúvidas em relação a qual país devesse fazê- lo”, já que a conta recebia recursos de campanhas no exterior.

O publicitário disse ainda desconhecer os depósitos de Skornicki e o bilhete apreendido pela Polícia Federal, enviado ao operador por Mônica. Nele, ela afirma que havia apagado, “por motivos óbvios”, o nome de uma empresa.

Santana disse que esteve uma só vez com Marcelo Odebrecht, em evento social, e que não conhece o avô e o pai do empresário. Acrescentou que não tem relação com “Feira”, apelido citado numa planilha de propina apreendida e que Polícia Federal acredita se referir ao publicitário. Santana autorizou a quebra de sigilo da conta na Suíça e negou ter outra no exterior. O advogado de Santana, Fábio Tofic, disse que seu cliente não tomava conhecimento dos valores que recebia e que chegou a chamar a conta na Suíça de “um tormento”.

— O João não sabia disso, ele é um criador, não trabalha com questão financeira.
Segundo Tofic, o casal quer regularizar a situação da offshore Shellbill, com sede no Panamá, e da conta na Suíça. O casal está preso desde segunda-feira. A defesa de Skornicki informou que se manifestará nos autos do processo.

* Enviado especial

Perguntas e respostas

– Por que, mesmo depois de retificar declarações à Receita Federal, João Santana e Mônica Moura seguiram omitindo a existência e a propriedade da offshore Shellbill Finance?

– A defesa diz que o casal achava que não teria problemas com o Fisco brasileiro, ao receber recursos de campanhas no exterior, embora tenha passado a declarar outras cinco empresas. A PF investiga se a Shellbill foi usada para receber recursos de campanhas no Brasil de forma oculta.

– Há relação entre o dinheiro das contas no exterior não admitidas por Santana e Mônica com as campanhas no Brasil comandadas pelo publicitário?

– Por enquanto, a Lava- Jato trabalha com a hipótese de que o dinheiro da corrupção de contratos da Petrobras abasteceu as contas de Santana no exterior. O juiz Sérgio Moro já disse que “é extremamente improvável que a destinação de recursos espúrios e provenientes da corrupção na Petrobras aos dois, no exterior, esteja desvinculada dos serviços que prestaram à aludida agremiação política (PT)”. Mas falta comprovar o vínculo.

– Por que o casal usou um antigo operador da Petrobras para fazer transferências para o exterior? Qual o vínculo de Zwi Skornicki com os políticos das campanhas comandadas por Santana?

– A defesa do casal diz que os US$ 4,5 milhões depositados por Zwi Skornicki são provenientes de campanha em Angola. Zwi, na condição de representante do estaleiro Keppel, que faria doações ao partido político angolano, teria sido orientado a quitar a dívida desse partido com João Santana. “Ela ( Mônica) disse que tinha este valor a receber, que cobrava insistentemente, e que foi informada de que deveria buscar este rapaz (Zwi Skornicki)”, afirmou o advogado do casal.

– Por que Mônica se preocupou em ocultar detalhes da offshore no bilhete que enviou a Zwi Skornicki, em que revela a existência da conta?

– Segundo a defesa, a preocupação dela era com o Fisco brasileiro. Mas a Lava- Jato suspeita que a intenção era esconder movimentação de caixa dois de campanha.

– Por que há um volume tão grande de pagamentos de cartões de créditos, compra de automóvel e transferência milionária entre o casal, sem movimentação correspondente nas contas de Mônica Moura e João Santana?

– Eles ainda não explicaram essa divergência.

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