quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Vinicius Torres Freire: A baixaria

- Folha de S. Paulo

O crédito do governo do Brasil foi rebaixado de novo, ontem. O governo do Brasil se rebaixou ontem a cabo eleitoral em uma disputa baixa do PMDB, portanto à altura de quem em tese nos governa. Agachou-se assim para cortar um rabicho da possibilidade de impeachment, rabicho que pode voltar a crescer, porém.

Tratava-se de vencer a eleição para líder do PMDB na Câmara. De derrotar o candidato de Eduardo Cunha e de apoiar o candidato do PMDB em tese governista, aquele PMDB que no Rio de Janeiro pretende lançar um candidato a prefeito que espancava a mulher.

Dilma Rousseff venceu a refrega ao preço de se tornar inimiga de metade da bancada do PMDB, ontem derrotada. Em tese, precisaria desses votos para catar dinheiros, a fim de aumentar impostos e votar suas reformas informes que promete um dia enviar ao Congresso.

O governo interferiu abertamente na pendenga. Adquiriu apoios com a promessa de dinheiro de emendas parlamentares. Demitiu por um dia aquela figura que ocupa o Ministério da Saúde, que pôde assim voltar à Câmara e votar na eleição do líder do PMDB. Essa figura volta logo ao cargo de ministro, à chefia do ministério que diz derrotado pela "mosquita", como diz a presidente.

O suposto delegado de Dilma Rousseff no PMDB, líder do partido, vai indicar os nomes para a Comissão Especial do impeachment na Câmara e o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), um grande diretor de trânsito das leis na Casa, lugar onde pode se decidir o destino de Cunha. Foi para isso que o governo gastou seu, digamos, prestígio.

Ainda mais avariado ou não pela derrota de ontem, Cunha continua, porém, capaz de paralisar a Câmara. As comissões de trabalho não funcionam enquanto o STF não responder às questões de Cunha sobre o rito do impeachment. Na luta terminal pela sobrevivência, deve "tocar o terror" na Câmara.

Descrédito
O governo se passa ao vexame de catar votos no chão peemedebista enquanto o país ainda baixa às profundas do fundo do poço.

A ruína é cada vez mais tida como irremediável por longos anos. É esse o significado do "ponto negativo" extra que o governo recebeu ontem da S&P. Não deve causar dano imediato: é um lembrete de que vamos penar para sair do buraco.

O rebaixamento adicional do crédito brasileiro não é mais do que o reconhecimento em cartório da impressão geral de que: 1) O ano extra de recessão profunda agravará a pindaíba do governo; 2) A recuperação será lenta; 3) Não há perspectiva de reviravolta, pois, além de um governo à deriva, há convulsão político-partidária sem fim.

Assim, a perspectiva é de que a dívida pública continue a crescer sem limite. Daí o descrédito adicional.

A única reforma vagamente proposta pelo governo, a da Previdência, deve estar rascunhada apenas em abril, se não for ainda mais retardada pela oposição interna no próprio governo.

Antes disso, o PT promete lançar um programa econômico que pretende desmoralizar mesmo as mínimas intenções reformistas, da boca para fora, de Dilma Rousseff. Portanto, deve assim oferecer um álibi para que outros partidos se abstenham de votar mudanças impopulares.

O Brasil baixa.

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