domingo, 6 de março de 2016

Lava-Jato desmente versão de Lula sobre tríplex

• Ministério Público diz que explicação ‘não corresponde à realidade’

Dilma vai a São Paulo para demonstrar solidariedade ao ex-presidente; Moro defende condução coercitiva, alegando que medida não é antecipação de culpa, e repudia incitação à violência

A força-tarefa da Lava-Jato, em documento da 24ª fase da operação, diz que a explicação do ex-presidente Lula ao negar a propriedade do tríplex em Guarujá “não corresponde à realidade”. Segundo o Ministério Público, a OAS informou que todos os apartamentos do prédio estão vendidos desde agosto de 2011, relata Cleide Carvalho. Assim, a alegação de que Marisa Letícia, mulher de Lula, seria dona de uma cota do empreendimento, sem ter adquirido uma unidade, “não faz sentido”. Ontem, a presidente Dilma foi a São Paulo visitar Lula. O juiz Sérgio Moro disse que a condução coercitiva não significa antecipação de culpa e visou a preservar a ordem pública.

Versão insustentável

• Força-tarefa da Lava-Jato diz que justificativa de Lula para tríplex ‘não corresponde à realidade’

Stella Borges - O Globo

O Ministério Público Federal (MPF) encontrou novos indícios de que o tríplex no edifício Solaris, no Guarujá (SP), era destinado à família do ex-presidente Lula, suspeito de ocultação de patrimônio e lavagem de dinheiro desviado do esquema de corrupção na Petrobras. Em janeiro, em nota, o Instituto Lula admitiu pela primeira vez que o ex-presidente esteve no tríplex 164-A, com o ex-presidente da OAS Léo Pinheiro, e informou que o petista e sua mulher, Marisa Letícia, apenas visitaram “uma unidade disponível para venda no condomínio”. No documento em que pedem a realização de buscas e apreensões para a investigação de Lula, os procuradores afirmam que, segundo documento da própria construtora, há mais de quatro anos não há unidade sem proprietário no condomínio.

Segundo o MPF, em petição enviada em 29 de agosto de 2011 ao Conselho Superior do Ministério Público de São Paulo, a OAS “expressamente” informou que, das 112 unidades do Solaris, 111 haviam sido sido vendidas a ex-cooperados da Bancoop (cooperativa do Sindicato dos Bancários que se tornou insolvente) e uma unidade para novo adquirente.

Apesar de a construtora ter informado sobre a venda de todas as unidades, no cartório de registro de imóveis o tríplex segue em nome da OAS, o que reforça a suspeita dos procuradores de ocultação de patrimônio — outras unidades mantidas em nome da empreiteira no Solaris também são investigadas.

Instituto Lula nega compra de imóvel
O documento do MPF diz ainda que, em nota publicada em 14 de agosto de 2015, o Instituto Lula informara, em resposta a uma reportagem do GLOBO, que Marisa era titular de uma cota do empreendimento e que o casal não havia decidido se compraria um imóvel ou pediria ressarcimento.

“O posicionamento de Lula para negar a propriedade do apartamento 164-A no condomínio Solaris, invocando inclusive suposta cota de Marisa Letícia no empreendimento, não corresponde à realidade”, conclui o Ministério Público.

O Instituto Lula informou que desconhece o documento e reafirma o conteúdo da nota anterior: “A família cogitou comprar, não comprou, a escritura não foi transferida, não frequentaram, não é deles”, informou.

Os procuradores lembram que a opção entre desistir do imóvel ou acatar novas condições contratuais da OAS foi ofertada aos cooperados em 2009, com prazo de 30 dias para a escolha. A OAS moveu ações judiciais contra os que não respeitaram os prazos. Várias ainda tramitam no Judiciário.

O Ministério Público de São Paulo também investiga se o ex-presidente ocultou a posse do tríplex. No fim de fevereiro, os advogados de Lula entraram no Supremo Tribunal Federal (STF) com pedido de suspensão das duas investigações em curso — no Ministério Público Federal e no Ministério Público do Estado de São Paulo sobre o tríplex do Guarujá e o sítio Santa Bárbara, em Atibaia. Eles argumentam que a legislação impede duplicidade de investigações sobre um mesmo objeto e pedem que o Supremo decida quem deve fazer as apurações.

Para a Lava-Jato, o tríplex e as reformas de R$ 1 milhão feitas nele podem ter sido uma forma de pagamento de vantagem indevida a Lula pela OAS, uma das construtoras que participaram do cartel da Petrobras. Entre 2007 e 2012, a OAS fechou mais de R$ 7 bilhões em contratos com a estatal.

“Há indícios de que, como constatado em relação a outros agentes públicos e políticos já denunciados no âmbito da denominada Operação Lava-Jato, empreiteira participante do cartel defraudador de licitações da Petrobras, OAS, entregou vantagem indevida por meio de manutenção dissimulada de propriedade e de pagamento de reforma de imóvel”, diz o documento.

Depoimentos de funcionários da OAS e do Solaris, segundo o MPF, mostram que a família de Lula acompanhou a reforma e esteve no prédio mais de uma vez. Letícia Eduarda Rosa, que trabalha na portaria do edifício, disse que viu Lula no prédio no começo da reforma do apartamento, no fim de 2013: “Ele entrou, subiu até o apartamento 164 A e foi embora”. Lula havia admitido ter visitado o apartamento em 2014.

O engenheiro Igor Pontes, da OAS, disse que foi informado no fim de janeiro de 2014 que era necessário limpar e pintar o apartamento 164-A, devido a visita de um “potencial comprador”. O serviço foi feito e, depois, Lula e Marisa teriam visitado o imóvel com o então presidente da construtora, Léo Pinheiro. Pontes disse que, em agosto de 2014, Marisa e seu filho Fábio Luís foram ao apartamento e que, segundo Roberto Moreira, diretor da OAS, “o intuito seria acompanhar a execução da obra”.

Pontes afirmou que “é possível concluir que as reformas dizem respeito a possíveis ajustes comerciais entre OAS e ex-presidente Lula".

Rosivane Cândido, ex-funcionária da empresa que reformou o tríplex, disse ter presenciado reunião de Marisa, um filho de Lula e executivos da OAS “para apresentar as modificações executadas e em execução do apartamento”.

Quatro diretores da OAS disseram que a empresa não vendia imóveis com armários de cozinha e dormitórios personalizados e eletrodomésticos. Segundo eles, serviços de adaptação de plantas, como os que ocorreram no tríplex, só eram feitos após a compra das unidades habitacionais por clientes.

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