sexta-feira, 22 de abril de 2016

Golpe jabuticaba - Eliane Cantanhêde

- O Estado de S. Paulo

Dilma Rousseff está enxovalhando a imagem do Brasil para tentar salvar a própria pele. E inutilmente. Se até Lula admite que Dilma foi o seu maior erro e se dez entre dez líderes petistas dizem que ela jamais deveria ter sido presidente da República, há um problema de origem aí, confirmado pela realidade destes cinco anos e meio.

O impeachment tem lógica, além de ser legal, e vai passar no Senado. O que falta para terminar essa agonia longa e inútil para ela própria e para o País?

Dilma tenta obter apoio da ONU e forçar uma ingerência da Unasul, mascarando o seu retumbante fracasso com versões mirabolantes de “golpe de Estado”, difamando o Brasil para o mundo e dificultando ainda mais as condições para a retomada da credibilidade, dos investimentos e da economia. Os mais de 10 milhões de desempregados não merecem mais essa.

A presidente viaja, o vice “golpista” assume, ela volta dois dias depois e o “golpista” lhe devolve o cargo. Nem o mais criativo gênio da ficção imaginaria um golpe tão jabuticaba quanto este, com o impeachment votado pela Câmara, agora em análise pelo Senado, desejado pelos principais atores econômicos, apoiado pela maioria da população e com os ministros do Supremo Tribunal Federal no centro do palco – aliás, reagindo duramente à investida da mandatária contra a imagem do País no exterior.

Tudo isso embalado por motivos fartamente divulgados e debatidos na mídia. Alguém conhece golpe com transmissão ao vivo das manifestações diárias da presidente, dos protestos a favor e contra, dos votos do Congresso e dos julgamentos do Supremo nesses meses todos?

O processo tem apoio legal, tem lógica, sofre críticas e... seu desfecho é ainda desconhecido. Dez entre dez políticos sabem que o impeachment vai passar no Senado e que Dilma é uma “carta fora do baralho” – o que confere um ar patético, ou perigoso, à sua ida a Nova York –, mas este não é o fim, é mais um lance num processo que, além de uma Lava Jato onipresente, tem frentes demais e certezas de menos.

Pela Constituição, presidentes são sujeitos a impeachment por crime de responsabilidade e, quando caem, o vice assume. Se o vice falhar e/ou também for acusado de crime de responsabilidade, ele é igualmente sujeito a impeachment. Se a chapa presidente-vice é cassada pelo TSE, há eleições diretas na primeira metade do governo e indiretas na segunda metade.

Assim, a democracia brasileira está bem calcada legalmente, contempla todas as possibilidades e cada um que se cuide para não ser atingido por incompetência, “pedaladas” de qualquer espécie ou desvio ético comprovado. Depois de atingido, ou atingida, não adianta berrar ao mundo como vítima. Vítimas são os que sofrem as consequências dos erros.

Defender a posse do vice Michel Temer não é golpe, não é ser de “direita” ou “esquerda”, não é ser do PMDB, não é vingança contra o PT, não é contra os programas sociais, não é para enterrar a Lava Jato, não é pela “bela, comportada e do lar” virtual primeira-dama. É, pura e simplesmente, a defesa da legalidade.

Como é questão de justiça defender o julgamento o quanto antes de Eduardo Cunha. Mas o que o vice pode fazer? Temer não tem capacidade de arregimentar 367 votos da Câmara e mais de 60% da população a favor do impeachment de Dilma. Nem tem poderes para punir Cunha, que não é caso do Executivo, mas sim do Supremo, onde é réu, e da Câmara, onde sofre processo de cassação.

O sucesso de Temer depende de agir pensando no que é mais importante para o País e menos no que é interessante para o seu entorno e seus aliados. Se acertar, ótimo para sua página na história e para o Brasil. Se errar, há instrumentos, instituições e uma Constituição para lidar perfeitamente com a situação. Logo, não à ingerência externa! E viva a democracia!

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