quinta-feira, 5 de maio de 2016

Anastasia rechaça tese de golpe e endossa impeachment

Por Vandson Lima, Thiago Resende e Fábio Pupo – Valor Econômico

BRASÍLIA - Apontando indícios "robustos" de fraude fiscal e rechaçando a tese de que um golpe de Estado esteja em curso, o senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) apresentou ontem à comissão especial do impeachment seu parecer a favor do prosseguimento da denúncia contra a presidente da República, Dilma Rousseff.

O relatório será discutido hoje e votado amanhã pelo colegiado. Depois irá a voto no plenário na quarta-feira, dia 11, quando os senadores poderão, se admitirem a denúncia por maioria simples, afastar a presidente do cargo por até 180 dias.

O documento se limita a implicar Dilma pelos dois fatos apresentados na acusação encaminhada pela Câmara dos Deputados. A primeira é a abertura de créditos suplementares, por meio de decretos assinados pela presidente entre julho e agosto de 2015, sem aval do Congresso Nacional; a outra são os repasses feitos com atraso pelo Tesouro Nacional ao Banco do Brasil para subsídio de juros referentes ao Plano Safra em 2015.

O parecer é claro em delimitar a denúncia a esses dois pontos, podendo os senadores alterar a tipificação dos crimes, mas não acrescentar novas acusações. Havia dúvidas se Anastasia deixaria alguma brecha ou mesmo incluiria de pronto novos fatos - como possíveis ilegalidades cometidas na gestão da Petrobras ou as pedaladas fiscais de 2014, que constavam na denúncia original.

Anastasia sublinhou que "dado o contexto, merece destaque o fato de que o exercício de 2015 foi marcado pela repetição, senão aprofundamento, de situações críticas verificadas em 2014" no campo fiscal, sem, no entanto, adentrar a questão. O relatório sequer faz referências à Operação Lava-Jato, justamente para se ater às possíveis ilegalidades relativas a 2015.

O tucano refutou o argumento da defesa de Dilma de que o processo deveria ser anulado por ter sido deflagrado como "vingança e retaliação" do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). "Não é demais lembrar que a autorização emanada da Câmara não é um ato pessoal do deputado, mas sim do plenário", que autorizou a abertura de processo de impeachment com mais de dois terços dos votos, disse o tucano. Anastasia frisou também que a decisão de Cunha fez um "recorte substancial" comemorado pela defesa de Dilma, ao acatar apenas as denúncias que tratavam de fatos ocorridos em 2015 - atual mandato da presidente.

Para o senador, as acusações "revelam contexto que pode demonstrar desvio de finalidade em favor de interesses políticos partidários, na medida em que, em contexto eleitoral, sonegaram informações à sociedade brasileira, a constituir pano de fundo relevante para apuração dos fatos praticados em 2015". Anastasia pontuou que "a partir do exame dessas operações [...], não é razoável supor que a presidente não soubesse que uma dívida da ordem de R$ 50 bilhões junto a bancos públicos pairava na atmosfera fiscal da União, até mesmo porque esse endividamento foi utilizado como forma de financiamento de políticas públicas prioritárias. Não se trata, portanto, de 'pedir impeachment porque alguém rouba um grampeador', como afirmou o Advogado-Geral da União perante este colegiado", lembrou.

Para Anastasia, a possibilidade jurídica de julgamento político é a razão de ser da previsão dos crimes de responsabilidade. "Presidencialismo sem possibilidade de impeachment é monarquia absoluta, é ditadura, por isso que o mecanismo foi previsto em todas as nossas Constituições, e inclusive já utilizado sem traumas institucionais", escreveu.

Anastasia argumentou que o impeachment é um mecanismo de "controle e repressão de delitos presidenciais"; e que não se trata de contrastar o mandato da presidente Dilma "com índices críticos de impopularidade; com o sentimento de rejeição, latente ou explícito, que se alastra em redes sociais irosas ou moderadas; com eventuais condutas veiculadas em áudios e delações". "Aqui, não aduzirei inverdades, não admitirei construções jurídicas fraudulentas", frisou no parecer.

Ele rechaçou ainda a alegação da defesa de que era necessário aguardar emissão de parecer prévio da prestação de contas de 2015 pelo Tribunal de Contas da União (TCU). "Não é condição de procedibilidade para se admitir, processar e julgar o crime de responsabilidade na esfera jurídico-política", afirma.

Senador do PT, Lindbergh Farias (RJ) disse que a menção a anos anteriores será judicialmente contestada. A ala governista da Casa foi após a sessão para uma reunião com Cardozo para definir a "estratégia jurídica" de reação ao relatório.

Antes da leitura, Lindbergh voltou a levantar possível suspeição de Anastasia por editar 55 decretos de crédito suplementar em Minas Gerais quando era governador. "Se fosse pelos decretos de crédito, não teríamos mais governador no país. Isso é cinismo", disse. O senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) chamou a fala do petista de "teatro patético". Anastasia se defendeu, argumentando que a lei estadual mineira - ao contrário da lei federal - autoriza os decretos. "O Estado tem mais flexibilidade", afirmou.

Do lado de fora da comissão, um grupo de 40 manifestantes protestou. Eles carregavam cartazes com as inscrições "Temer traidor", "Anastasia pedalador" e ainda chamaram o eventual novo governo do vice-presidente de ilegítimo. O deputado Vitor Lippi (PSDB-SP) interferiu no protesto e começou a gritar palavras contra o governo e contra Dilma. Os manifestantes, então, se voltaram em meia-lua contra o parlamentar e o chamaram em coro de "golpista".


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