terça-feira, 24 de maio de 2016

Desemprego crescente pode dificultar reforma trabalhista – Editorial / Valor Econômico

O ministro da Fazenda do governo interino, Henrique Meirelles, disse que o desemprego pode chegar a 14% se nenhuma medida for tomada para deter o crescimento explosivo da dívida pública, de modo a restaurar a confiança e reativar a economia. No entanto, o desemprego já superou o nível temido pelo ministro em várias partes do país. A mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, feita pelo IBGE, mostrou que o desemprego chegou a 10,9% no trimestre terminado em março, nada menos do que três pontos acima dos 7,9% do mesmo período de 2015. O percentual significa 11,1 milhões de desempregados no país para uma população ocupada de 90,6 milhões, com 23,1 milhões trabalhando por conta própria.

Em três Estados o desemprego já supera os 14% de Meirelles, provavelmente pela dependência dos investimentos e transferências federais e características econômicas. Na Bahia, a desocupação chegou a 15,5%, o que significa 3,2 milhões de desempregados, quase 30% do total do país. No Rio Grande do Norte e no Amapá é de 14,3%. Em São Paulo, o desemprego está acima da média nacional, em 12%, e o mesmo acontece em Minas Gerais, com 11,1%. Na outra ponta estão Estados do Sul, com desemprego de 6% em Santa Catarina e 7,5% no Rio Grande do Sul.


Se os dados da Pnad forem examinados de outros ângulos vão mostrar que o mercado de trabalho é também menos favorável para os jovens de 18 anos a 24 anos, geralmente em início de carreira, segmento em que o desemprego chegou a 24,1%, bem acima dos 17,6% do primeiro trimestre de 2015 e dos 14% do ministro. As mulheres também enfrentam dificuldades adicionais e desemprego de 12,7%.

Se o aumento do desemprego é consequência da retração da economia, ele também acaba acentuando-a, em uma relação perversa de retroalimentação. Atribui-se ao crescimento do desemprego a queda de 3,2% da demanda por serviços nos 12 meses terminados em maio, além da diminuição generalizada do consumo e o aumento da inadimplência. Em seu mais recente levantamento, a Receita Federal culpou principalmente a redução do emprego e dos salários pelo recuo de 7,91% da arrecadação de janeiro a abril. A renda média do trabalhador teve queda de 3,2% no primeiro trimestre deste ano em comparação com igual período de 2015. Somente em Imposto de Renda retido na fonte da pessoa física e contribuição previdenciária, a perda esperada para este ano é de R$ 12 bilhões, o equivalente ao que o governo ganharia se a CPMF fosse recriada na metade do ano.

O governo ainda perde com medidas adotadas exatamente para tentar conter o desemprego, que parecem não apresentar bons resultados. A desoneração da folha de pagamentos não está evitando a redução dos postos de trabalho como prometia e ainda resulta em perda de arrecadação para o governo, estimada em perto de R$ 16 bilhões apenas neste ano.

Esse é também o caso do Programa de Proteção ao Emprego (PPE), plano lançado em 2015 que reduz a jornada de trabalho e corta salários de funcionários de empresas em dificuldades financeiras. O PPE permite a diminuição temporária de até 30% das horas de trabalho, com redução proporcional do salário pago pelo empregador. A diferença do salário é parcialmente compensada pelo governo, com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), limitada a um valor. Até agora, pouco mais de 80 empresas aderiram ao PPE, envolvendo ao redor de 50 mil trabalhadores, ao custo de cerca de R$ 200 milhões por mês ao governo.

Nesse cenário conturbado, o governo interino de Michel Temer pretende avançar com uma reforma trabalhista para flexibilizar a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), privilegiando as negociações coletivas para determinados temas como a redução de jornada e salários, manter os direitos assegurados pela Constituição, como o 13º salário e a licença-maternidade. A terceirização da atividade-fim faz parte do pacote. Especialistas acreditam que a expectativa de que as mudanças vão estimular a criação de empregos pode atrair a boa vontade dos trabalhadores para a reforma. Mas há dúvidas se o momento atual de fragilidade do mercado de trabalho é o mais adequado a esse tipo de negociação. Já as centrais sindicais estão arredias. O debate seria certamente mais promissor em outros tempos.

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