terça-feira, 24 de maio de 2016

Grampo derruba Jucá, desafia Temer e alarma cúpula do PMDB

Peemedebista falou em pacto contra Lava-Jato. - Presidente ouve gritos de ‘golpista’ no Senado. - Machado também gravou Renan e Sarney

Com apenas 11 dias no cargo, o presidente interino, Michel Temer, perdeu seu primeiro ministro, Romero Jucá (Planejamento), que pediu licença e foi exonerado após ser flagrado num grampo em que conversa com o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado sobre um pacto contra a LavaJato. Investigado no escândalo, Jucá disse ao ex-senador, na gravação de março, que era preciso “estancar a sangria” causada pela operação. Machado também grampeou, segundo LAURO JARDIM, o presidente do Senado, Renan Calheiros, e o ex-presidente José Sarney, o que deixou a cúpula do PMDB alarmada. O episódio criou novo embaraço para Temer. Ao levar ao Senado a proposta da meta fiscal, antes do anúncio do afastamento do ministro, o presidente ouviu gritos de “golpista”, principalmente de petistas.

Jucá, o breve

• Gravação revela tentativa de barrar Lava-Jato, e ministro é exonerado 11 dias após assumir

- O Globo


-BRASÍLIA- Um grampo em poder da Operação Lava-Jato levou ontem à primeira queda de ministro no governo de Michel Temer, 11 dias após ele assumir o comando do Palácio do Planalto. Romero Jucá, que já vinha sendo investigado pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal, foi gravado pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado — seu correligionário do PMDB — falando de um pacto para conter a Lava-Jato. O áudio, revelado pelo jornal “Folha de S. Paulo”, faz parte de um acordo de delação premiada de Machado que está prestes a ser homologado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki.

A saída de Jucá do Ministério do Planejamento pode ser apenas o primeiro capítulo de uma nova fase da crise política, que atinge o governo, envolve o PMDB e tende a chegar ao Senado, onde matérias fundamentais do ajuste fiscal precisam ser aprovadas. Conforme revelado ontem pela coluna de Lauro Jardim no site do GLOBO, os dois políticos mais influentes na Casa — o presidente Renan Calheiros e o ex-presidente da República José Sarney — também foram gravados por Machado, e quem teve acesso às gravações diz que o áudio de Jucá “não é nada” comparado ao que Renan e Sarney disseram. Além dos três políticos gravados, Machado teria comprometido também os senadores peemedebistas Jader Barbalho (PA) e Edison Lobão (MA). As revelações deixaram alarmados a cúpula do PMDB e o próprio governo Temer, obrigado a enfrentar uma crise em pouquíssimo tempo.

Tentativa de se licenciar
Recém-empossado no Ministério do Planejamento e um dos mais importantes aliados de Temer, Jucá ainda tentou pela manhã se segurar no cargo, concedendo uma entrevista coletiva. Ele disse que sua afirmação de que era preciso “estancar a sangria” se referia à crise na economia, mas a divulgação do áudio completo o desmentiu. No meio da tarde, após se encontrar com Temer, Jucá informou que iria se “licenciar” até que o Ministério Público dissesse se havia crime em alguma de suas falas. Ele, no entanto, foi exonerado. Por sua indicação, quem comandará interinamento o Planejamento é o secretário-executivo do ministério, Dyogo Oliveira.

— Eu sou o presidente do PMDB e um dos consultores deste governo. Não farei nada que possa prejudicar. Vou sair de licença amanhã. Enquanto o Ministério Público não se manifestar, dizer que não houve crime, eu aguardo fora do ministério — disse Jucá.

É a segunda vez em sua carreira que Jucá deixa o governo pouco depois de ser nomeado, em meio a acusações de envolvimento em irregularidades. Em 2005, no primeiro governo Lula, Jucá foi nomeado ministro da Previdência. Quatro meses depois, em meio a denúncias de irregularidades em empréstimos contraídos junto ao Banco da Amazônia, deixou o cargo. Agora, o tempo foi tão curto que alguns assessores dele nem tinham chegado a desocupar as mesas no Senado.

No diálogo com Sérgio Machado, Jucá tratou de um pacto para conter a Lava-Jato, que passaria pelo afastamento da presidente Dilma Rousseff. Depois de ouvir de Machado, também investigado no escândalo, que a situação está gravíssima, Jucá diz que com Dilma “não dá” e que era necessário haver o impeachment. O agora ex-ministro de Temer sugere a Machado procurar seu advogado para “estancar essa sangria”. Na entrevista que deu para explicar o conteúdo da gravação, Jucá diz que falava de economia.

— É muito importante estancar a paralisia do Brasil, estancar a sangria da economia e do desemprego e também delimitar quem tem culpa e quem não tem culpa — afirmou na entrevista.

Outro ponto da gravação que agravou a permanência de Jucá no cargo foi a citação de que conversou com alguns ministros do STF. No início da conversa, Machado demonstrou receio de que a investigação contra ele saísse do âmbito do STF para a Justiça Federal em Curitiba (PR), sob o a jurisdição do juiz Sérgio Moro.

— O Janot (procurador-geral da República) está a fim de pegar vocês. E acha que sou o caminho — disse Machado, que pediu ajuda:

— Como montar uma estrutura para evitar que eu desça? — perguntou a Jucá. O senador então responde: — Conversei ontem com alguns ministros do Supremo. Os caras dizem: “oh, só tem condições sem ela. Enquanto ela estiver ali, a imprensa, os caras querem tirar ela, essa porra não vai parar nunca”.

Jucá informou Michel Temer ainda no domingo sobre o vazamento da gravação. Ontem, amanheceu no Palácio do Jaburu onde voltou a conversar com o presidente interino. Mas desde o primeiro momento sua situação já era considerada delicada. E veio da própria base aliada de Temer os pedidos abertos para que Jucá deixasse o governo. Ainda antes da entrevista coletiva, os líderes do DEM na Câmara e no Senado, Pauderney Avelino (AM) e Ronaldo Caiado (GO), além do líder do PPS na Câmara, Rubens Bueno (PR), pediram publicamente o afastamento do peemedebista do cargo. Avelino sustentava que Temer deveria seguir o exemplo de Itamar Franco, afastando o ministro Romero Jucá até que tudo fosse esclarecido.

— O presidente Itamar e o próprio Henrique Hargreaves, quando pesou sobre ele uma acusação, ele saiu da Casa Civil, se defendeu e voltou forte. Nós sabemos da importância do Jucá, extremamente habilidoso e importante no governo — disse Pauderney Avelino pela manhã.

Com a opção pela licença, os neoaliados saíram em defesa do governo. Pauderney disse que a decisão de Jucá demonstrava uma mudança em relação ao governo Dilma Rousseff. Pauderney se referia ao fato de a presidente afastada ter mantido o então ministro Aloizio Mercadante no comando da Educação após ele ter sido gravado em situação semelhante a Jucá. Após a prisão de Delcídio Amaral, Mercadante encontrou-se com um assessor do ex-senador e disse que poderia buscar “uma saída” para a situação de Delcídio com o presidente do STF, Ricardo Lewandowski.

— Eu entendo que já há uma demonstração clara e inequívoca sobre este governo e o anterior, do PT. Há uma solução precisa para uma eventual crise que não se consuma. O ministro Romero Jucá vai se defender e tem a oportunidade de se defender fora do governo. Ele é senador da República, portanto, acredito que ele, ao se defender, poderá retornar ao governo — afirmou Avelino.

Pedidos de cassação e prisão
O líder do PPS, Rubens Bueno, no entanto, lembrou que, antes mesmo da nomeação de Jucá, vários aliados de Temer já apontavam o risco de o senador levar uma crise para dentro do governo: — Ele nem devia ter sido nomeado. O ex-vice-líder do governo Dilma, Silvio Costa (PTdoB-PE), criticou a situação. Segundo ele, a saída de Jucá foi planejada pelo então ministro e não pelo presidente interino. Para Costa, o plano do ex-ministro seria evitar um embate com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

— O Michel (Temer) não teve coragem de demiti-lo. Ele arranjou esse papo de se licenciar, enquanto o procurador (Janot) não se pronunciar. Ele é uma piada. Ele se demitiu, não teve a coragem de usar a palavra — declarou Costa.

Agora na oposição, o PDT informou que vai pedir a cassação do mandato de Jucá como senador. Já o PSOL anunciou que entrará na Procuradoria Geral da República (PGR) com representação para pedir a prisão do ministro por obstrução da Justiça. (Bárbara Nascimento, Catarina Alencastro, Eduardo Bresciani, Isabel Braga, Júnia Gama, Letícia Fernandes, Maria Lima, Martha Beck, Simone Iglesias)

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