sábado, 28 de maio de 2016

Mistificação eficiente - Merval Pereira

- O Globo

Uma coisa é preciso reconhecer: esses petistas são bons de mistificação na oposição. Só conseguem ficar no poder às custas de acordos espúrios como os que estão sendo revelados nas diversas investigações criminais que atingem em cheio a gestão nos últimos 13 anos.

Mas na oposição, não se vexam com as revelações de seus crimes e partem para o ataque como se não tivessem nenhuma culpa pelo o que aconteceu na Petrobras, assaltada e dilapidada por uma quadrilha de políticos comandada pelo próprio ex-presidente Lula, como mais uma delação premiada, a do ex-deputado Pedro Corrêa, confirma.


Ninguém se mexeu para dar um abraço na estatal, mas para impedir a fusão do Ministério da Cultura com o da Educação, a indignação cívica tomou conta de nossos intelectuais. A lista de salários astronômicos pagos pela estatal Empresa Brasil de Comunicação (EBC), falida e sem audiência, talvez explique a gana com que defendem um governo criminoso.

Ninguém se mexeu para protestar pelos escândalos do mensalão e do petrolão, muito menos contra o desastroso governo de Dilma Rousseff, mas para espalhar pelo mundo afora a honestidade da presidente afastada, mesmo diante de diversas delações sobre sua atuação pessoal no uso de verbas desviadas pela corrupção na Petrobras e outras estatais nas campanhas presidenciais que a elegeram.

Agora mesmo, uma conversa do ex-presidente Sarney gravada pelo delator Sérgio Machado, revela uma faceta dessa atuação: foi a própria Dilma quem pediu à Odebrecht que pagasse por fora ao marqueteiro João Santana, cuja mulher está fazendo delação premiada e confessando que recebeu propina da empreiteira no exterior. C.Q.D. .

No mensalão ainda houve um grupo de deputados petistas que acabou se retirando do partido para criar o PSOL, um dos poucos não envolvidos nesse esquema de corrupção que atinge praticamente todos os partidos políticos.

A Rede de Marina Silva é outro, embora se beneficie de ter sido criado mais recentemente. Mas, pelo menos, tem um sistema de triagem que até o momento parece funcionar. E Marina sai ilesa dessa geleia geral da corrupção em que se transformou o país, pronta para se apresentar como das poucas alternativas para uma mudança de atitudes.

Embora minoritários, os petistas conseguem se mobilizar nacionalmente, e até pelo mundo, em demonstrações que sugerem haver uma revolta contra os “golpistas” que assumiram o poder, como se esses mesmos “golpistas”, a começar pelo presidente interino, não fossem íntimos parceiros dos petistas nos últimos 13 anos, e não dividissem o butim das estatais em partes iguais.

Todos os que hoje fazem parte do governo interino do PMDB e estão enrolados nas investigações, foram líderes de governos petistas, foram ministros de governos petistas, foram parceiros de falcatruas. Nas gravações, vê-se que Renan Calheiros é o Eduardo Cunha do PT. O que fragiliza o governo interino de Michel Temer, mas tira também a credibilidade dos movimentos petistas que, no entanto, parecem não ser afetados pelas evidências. Se sentem no direito de acusar de “golpistas” os cúmplices de ontem, e tudo fica semelhante a uma briga de bandidos em que todos têm razão.

Os petistas tiveram um ganho formidável com o impeachment de Dilma: a oposição atingiu seu objetivo, mas não tem empolgação (nem razão) para ir para as ruas defender o governo Temer, cheio de dívidas com o seu passado e incertezas quanto ao presente.

Apoiar o impeachment, por ser uma solução constitucional para o descalabro do país, deu à oposição uma vitória que periga não ser consolidada pela História pregressa que vem sendo revelada nas investigações da Lava-Jato, atingindo inclusive líderes do DEM e do PSDB, e ao PT uma palavra de ordem mentirosa, mas eficiente (“Não vai ter golpe!”), como as campanhas dos marqueteiros petistas presos.

O presidente interino, Michel Temer, tolhido por compromissos políticos que refletem os velhos vícios em que o PMDB foi cevado, precisa ainda provar que pode vir a ser um Itamar Franco, embora se aproxime mais de um José Sarney, pela História política que liga os dois caciques do PMDB, mais uma vez reafirmada nas conversas gravadas clandestinamente, mais reveladoras da alma dos interlocutores do que as declarações formais.

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