sexta-feira, 27 de maio de 2016

Sinais de fragilidade - Eliane Cantanhêde

• Temer frágil em Brasília e nas ruas, cresce a teses das 'eleições já'

- O Estado de S. Paulo

Michel Temer é alvo de três frentes de ataque: as gravações do delator Sérgio Machado com os generais do PMDB, a cobrança de soluções urgentes para uma economia em frangalhos e o desequilíbrio entre as manifestações, que são muito contra e nada a favor do presidente interino. Temer parece paralisado, enquanto Lula está à espreita, esperando reverter o impeachment no Senado. Não a favor de Dilma Rousseff, considerada fora de combate, mas sim de uma batalha por “eleições já”.

O ambiente está conturbado e há um descompasso entre o que as ruas vêm cobrando desde junho de 2013 e o que a Câmara e o Senado produziram em 2016. As ruas rebelaram-se contra a corrupção, já o Congresso aprovou o processo de impeachment com dois objetivos. Um, explícito: resgatar a economia e os empregos (“o País explode com mais 2 anos e meio de Dilma”). Outro, implícito: o sonho de conter o avanço da Lava Jato (“estancar a sangria”).


Sendo assim, os milhões que fizeram manifestações pelo impeachment recolheram-se ao sossego do lar, sem ânimo para dar suporte à interinidade de Temer. Mas a minoria militante que era contra o impeachment não só continuou nas ruas como atraiu nichos, inclusive corporativistas. Ou seja: não se vê uma bandeira de apoio a Temer, mas se veem muitas fotos e reportagens contra ele, o que aumenta a sensação de fragilidade.

Para alimentar esse processo corrosivo, só faltam pesquisas de opinião confirmando que, se Dilma era uma recordista em rejeição, Temer não está se saindo melhor. Além da pressão organizada e da qualidade assustadora do Congresso, o governo interino – com o PMDB, os partidos aliados, os homens-fortes de Temer e o próprio Temer – é pródigo em dar motivos para apanhar. Ele assumiu em meio a um processo naturalmente traumático de impeachment e a um alto grau de desconfiança de uma sociedade exausta de desvios, incompetência, mistificações. Tinha margem muito estreita para errar, mas vem errando muito. E o PMDB... bem, o PMDB é o PMDB.

O vazamento da fita em que Romero Jucá fala em trocar o governo para circunscrever a Lava Jato (aos empreiteiros, diretores da Petrobrás e doleiros), deixando os políticos a salvo, já seria péssimo mesmo se tudo caminhasse bem, com os movimentos petistas isolados e a sociedade encampando um “pacto nacional” contra a recessão. Mas, com “o povo” em casa, os movimentos ativos, as categorias agitadas e o País mal humorado, o péssimo vira tragédia. E vem mais!

Os dois lados, pró e anti-impeachment, já adaptam rapidamente suas estratégias diante dessa conjuntura. Os favoráveis correm para antecipar a votação final no Senado, temendo – com razão – a reversão fatal de quatro a oito votos. Os contrários tratam de articular uma virada espetacular do jogo: eles derrubam o impeachment, Temer sai e Dilma Rousseff volta. Mas não para ficar, só para segurar a cadeira até as “eleições já”. Cabe a Lula botar o guizo no gato.

Esse script, aliás, já foi discutido por Lula com senadores petistas no dia do acatamento do impeachment no Senado, quando ele sabia que Dilma perderia e visualizou o seguinte cenário: a economia explodindo, o País de pernas para o ar, militantes e simpatizantes gritando “golpe” nas ruas, a Lava Jato chegando no PMDB.

Tudo isso, previa, iria asfixiar Temer, que perderia apoios dos partidos e abriria caminho para a reversão do impeachment e, enfim, a antecipação das eleições. A previsão ainda não se confirma, mas o PV já se declarou “independente”, outros partidos poderão ir na mesma direção e o PT moderado até imagina atrair parte do PSDB para a tese de novas eleições.

Quem sonhava com um novo pacto nacional a la Itamar Franco acordou num pesadelo, com o País dividido e parado, políticos apavorados com a Lava Jato e um inferno de interrogações.

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