terça-feira, 14 de junho de 2016

A economia sob a lógica congressual - Raymundo Costa

• Como todo político, Temer também está atrás de aplauso

- Valor Econômico

A lógica política vai determinar o prazo para a vigência do texto para os gastos públicos, cujo projeto será entregue amanhã pessoalmente ao Congresso pelo presidente interino Michel Temer. O mais importante, para a cúpula do governo, é encontrar uma fórmula de consenso entre o Executivo e o Legislativo, a fim de sinalizar aos mercados que a proposta será aprovada sem maior dificuldade, como foram todas as outras que levou até agora à votação.

O que os últimos 30 dias demonstraram é que a engenharia construída pela articulação política do Palácio do Planalto é consistente e capaz de assegurar os votos de que o governo precisa para fazer as reformas, especialmente aquelas relacionadas com a economia. Foi assim com a aprovação da DRU na Câmara dos Deputados e a aprovação do nome do novo presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, no Senado. E Michel Temer não quer perder o pique, depois das vitórias iniciais, por isso vai arbitrar um prazo que permita uma composição com Congresso, uma casa gastadora por excelência.


Isso não quer dizer que a área econômica do governo será derrotada. Não existe propriamente um racha no governo sobre este assunto. A equipe econômica, tendo à frente o ministro Henrique Meirelles (Fazenda), defende um prazo longo o bastante para sinalizar aos mercados que o controle de gastos será pra valer e não apenas um remendo. Algo como dez anos. A área política, com Eliseu Padilha (Casa Civil) e Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo) na posição avançada, defendem um prazo menor, mais realista quanto à relação de forças no Congresso Nacional. Talvez quatro anos, a duração de um mandato presidencial.

O ideal é que a equipe econômica e a área política cheguem a um denominador comum. Se for necessário, Temer vai arbitrar. A decisão pode sair ainda hoje, antes da caminhada de Temer entre o Palácio do Planalto e o prédio em frente do Congresso Nacional. Existe a possibilidade de o presidente interino fazer uma simples média aritmética: sete anos, com o teto valendo até 2023, no mandato do presidente da República que suceder ao sucessor de Temer. Caberia então a este presidente decidir e negociar com o Congresso o fim ou prorrogação do teto de gastos.

Sete anos é um prazo negociável com o Congresso. Seja qual for o prazo, em caso de sobra de recursos, mais adiante, o Congresso sempre poderá fazer algum tipo de mudança. É o Congresso quem vota e aprova a lei do Orçamento-Geral da União (OGU), a cada ano. Logo, quem vai alocar eventual sobra de recursos. O teto para as despesas com os gastos públicos também pode ser um passo para a adoção do Orçamento impositivo, um antigo e quase irrealizável sonho dos congressistas.

Passados 30 dias, o governo Temer está convencido de que montou uma equação política funcional no Congresso e de que tem os votos necessários para tocar sua agenda econômica. Na verdade é uma engenharia complexa, que requer cuidados permanentes, pois a construção está assentada sobre o colégio de líderes na Câmara dos Deputados. Na prática, isso significa que, em vez de negociar com um comandante (Eduardo Cunha) forte, o presidente, a cada votação, terá de atender líderes de uma dezena de partidos com objetivos e interesses diferentes.

Isso exige mais esforço e é muito mais complicado que conversar com um só líder, como era o caso do presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha, seguramente uma peça-chave do impeachment da presidente Dilma Rousseff. Mas essa é a praia de Michel Temer, três vezes presidente da Câmara dos Deputados, e da retaguarda política que montou no Palácio do Planalto, com Padilha, na Casa Civil, e Geddel Vieira Lima na coordenação política. O fortalecimento do colégio de líderes, por outro lado, é uma blindagem de Michel Temer em relação a um aliado incômodo, como é Eduardo Cunha, que talvez já não disponha do mesmo poder de fogo de dois meses atrás

O sucesso nas votações leva o governo a acreditar que agiu de maneira acertada, mesmo naquelas decisões para as quais a opinião pública torceu o nariz. A designação do deputado André Moura (PSC-SE) para a função de líder do governo na Câmara é um desses casos. Moura é demasiadamente identificado com o deputado Eduardo Cunha e integra o chamado baixo clero da Câmara, cujos votos todos os presidentes cobiçam mas em cuja companhia não querem aparecer na fotografia. Se tivesse recusado o nome de Moura, o presidente teria comprado uma briga, e acredita-se sinceramente no Palácio do Planalto que a negociação das reformas seria mais difícil.

O que Michel Temer quer no curtíssimo prazo é criar um ambiente para que as rodas da economia voltem a girar. Disso depende a sua permanência no cargo, que é praticamente irreversível mas ainda não foi legalmente sacramentada, e o futuro de seu eventual governo. Pesquisa da Confederação Nacional dos Transportes (CNT), divulgada semana passada, revela que uma grande parcela do eleitorado ainda não sabe o que acha de Temer. Está em cima do muro, observando, e também ainda não tem certeza se o grupo político do presidente - e ele próprio - está ou não na Lava-Jato.

Temer aposta na economia para tentar ganhar a popularidade ainda negada. Como todo governante, Temer também está atrás da aprovação. O presidente interino vai começar a viajar, na tentativa de fazer uma agenda positiva que ajude a melhorar sua aprovação na opinião pública. Compromissos formais, adaptados ao estilo formal do presidente interino, mas sem mesóclises de marketing, como vestir camisa polo, posar para fotos com as mãos sujas de petróleo ou comer buchada de bode. Mas Temer sabe que nada disso surtirá efeito se a inflação não baixar e o mercado de trabalho voltar a contratar.

Do lado adversário do governo, o PT rifou Dilma, a tese do golpe murchou e foi substituída pela convocação de um plebiscito que, no fundo, é o reconhecimento de que não tem volta para a presidente.

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