domingo, 19 de junho de 2016

A maldição do petróleo - Merval Pereira

- O Globo

A crise econômica que levou o Estado do Rio a decretar o estado de calamidade pública tem, sem dúvida, como analisei ontem aqui, a responsabilidade fundamental da crise do petróleo mundial, que afetou a base da economia do Rio como maior produtor do país. Mas contou com um ingrediente de irresponsabilidade administrativa, que está sempre presente nas crises de países (ou estados) que têm abundância de recursos naturais.

No caso do Brasil, o governo abandonou projetos de combustíveis alternativos como o etanol, porque considerava que havia tirado o bilhete premiado com o pré-sal. Essa situação recorrente é conhecida como a “maldição do petróleo”, que gera desperdícios em meio à corrupção. Foi o que aconteceu no Brasil e, também, no Rio, onde os gastos correntes cresceram, e o estado se endividou acima de sua capacidade.


O ex-governador Sérgio Cabral declarou que a mudança no marco regulatório do pré-sal causou esse desequilíbrio econômico no estado, mas ele, que reagiu inicialmente à mudança do sistema de concessão para o de partilha porque prejudicaria a distribuição de royalties para os estados produtores, acabou fazendo um acordo com o governo federal em troca de ações na infraestrutura.

Sem dúvida, o estado e o município do Rio, devido à Olimpíada, obtiveram muitos investimentos federais: PAC Comunidades, Minha Casa Minha Vida, metrô, BRT, VLT, entre outros. Mas, com base nas receitas futuras do pré-sal, o governo do estado endividou-se acima de suas possibilidades, ficando com um déficit de R$ 20 bilhões entre receita e despesas, além de uma conta negativa de cerca de R$ 5 bilhões de restos a pagar com fornecedores.

Com o barril de petróleo a US$ 100, o governo do Rio endividou-se pegando R$ 1 bilhão no Banco do Brasil, R$ 2,3 bilhões na Caixa Econômica Federal e, até mesmo, R$ 2,3 bilhões em debêntures nos Estados Unidos, e acabou ficando com uma dívida até 2022, difícil de pagar com a queda do preço do barril.

Com a crise da Petrobras e a queda do preço internacional do petróleo, o Estado do Rio perdeu receita, teve a indústria naval afetada, os incentivos fiscais para as montadoras, aumentando a crise com o preço do combustível congelado pelo governo federal reduzindo a arrecadação do ICMS do estado em cima dos derivados. O Polo Petroquímico de Itaboraí — o Comperj — também foi afetado pela crise do petróleo.

O Rioprevidência acabou tendo uma sobrecarga com planos de cargos e salários dados pelo governador Luiz Fernando Pezão. A folha salarial foi a R$ 23 bilhões, e os inativos consomem outros R$ 17 bilhões. Os royalties acabaram sendo usados para esses pagamentos. O deputado estadual Luiz Paulo discute na Agência Nacional de Petróleo o preço de referência para o pagamento dos royalties, para amenizar a crise. Mas considera que a irresponsabilidade gerencial pode ser até razão para um impeachment.

O especialista Mauro Osório, atualmente presidente do Instituto Pereira Passos do município do Rio, em recente artigo no GLOBO, ressaltou os desafios que teremos este ano, como o término das obras relativas à Olimpíada e o aumento das demissões na construção civil.

Um desafio para o Estado do Rio é diminuir a dependência das receitas de royalties do petróleo, diz ele, e para tanto “será necessário aprimorar o planejamento público, buscando o adensamento produtivo e o aumento da base para arrecadação de ICMS”.

Para Osório, as principais janelas de oportunidade encontram-se em torno dos complexos produtivos de turismo, entretenimento, esporte, cultura e mídia; da economia da saúde; e do petróleo e gás.

É importante, também, analisar as prioridades dos gastos públicos, alerta Osório. Em 2014, por exemplo, o gasto público per capita para o conjunto das atividades vinculadas ao Legislativo e ao Judiciário no Estado do Rio foi em torno de 70% maior do que as despesas verificadas nos estados de São Paulo e Minas Gerais. Não é à toa que o governador em exercício Francisco Dornelles, depois de ter decretado o estado de calamidade pública para viabilizar um financiamento de R$ 3 bilhões do governo federal, promete medidas duras.

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