quinta-feira, 9 de junho de 2016

As mariposas do Congresso - José Roberto de Toledo

- O Estado de S. Paulo

Fazia anos que o PMDB não votava tão unido na Câmara dos Deputados. Mais do que o novo líder, um ministro genial ou qualquer pessoa, quem operou o milagre foi o magnetismo do poder. Atraídos para o centro do governo federal após a posse de Michel Temer, os deputados peemedebistas voltaram a ser tão governistas quanto eram no começo do primeiro mandato de Dilma Rousseff. Os desobedientes contam-se em uma mão sem o polegar.

Nas primeiras 24 votações nominais do governo interino, a taxa de governismo do PMDB foi de 98%. Mais impressionante ainda: 61 dos 67 deputados do partido votaram 100% das vezes seguindo obedientemente a orientação do líder do governo. Antes que algum apressado comece a tecer loas à liderança e ao chicote de André Moura, ou usar isso para polir o ego de Temer convém comparar.


Pois nas primeiras 24 votações nominais do primeiro mandato de Dilma, a taxa de governismo do PMDB foi de 89%. E nas primeiras 24 votações do segundo mandato de Lula da Silva, o governismo dos peemedebistas foi de 96%. Naquele longínquo começo de 2007, 67 deputados do PMDB também votaram 100% das vezes obedecendo ao líder do governo petista. Os dados são do Basômetro.

Como se vê, o alto governismo não se explica fulanizando a resposta. A chave para entender esse comportamento está nas circunstâncias que envolvem os governantes e os deputados.

Se os presidentes eram diferentes, se suas capacidades de diálogo com a base parlamentar eram distintas e se os líderes variavam, o que, então, poderia explicar taxas de governismo tão altas nessas três ocasiões, sob Lula, Dilma e Temer? A popularidade do presidente, talvez? Lula (mais de 50% de ótimo e bom) e Dilma (mais de 60%) eram populares quando o PMDB era extremamente governista, mas Temer não é (11% de aprovação).

Sobra uma variável: o grau de inserção do PMDB no governo. Em 2003, no começo do primeiro mandato de Lula, a taxa de governismo da bancada peemedebista na Câmara era bem menor: 82%. Só 9 deputados votaram 100% das vezes com o governo nas primeiras 24 votações nominais do petista. Isso está em linha com a tese da inserção, pois o PMDB estivera na chapa do tucano José Serra na eleição de 2002, com Rita Camata (PMDB) como vice.

Em tese, no começo de 2003, o partido deveria ser de oposição a Lula – embora, na prática, já fizesse movimentos para aderir à base do governo, o que viria a ocorrer formalmente em 2004.

O teste final fica por conta de 2015, no começo do segundo mandato de Dilma. Pois o PMDB nunca foi tão oposicionista: apenas 62% de votos seguindo a orientação do líder do governo. Naquelas primeiras 24 votações, Eduardo Cunha mostrou a que viera como presidente da Câmara. Derrotou o governo em várias votações e levou o PMDB consigo. Quando não traiu Dilma, o partido rachou. Era o começo do fim da governabilidade da petista. Parte do PMDB já articulava sua deposição.

Não era apenas uma demonstração de força para ocupar mais e melhores cargos na administração federal. Era um movimento para comandar toda a administração, o que só foi possível graças à perda abrupta de popularidade de Dilma após a reeleição – graças, em parte, à adoção de uma agenda econômica oposta a que a elegera, ao degringolar da economia e da confiança do consumidor e ao avanço das investigações da Lava Jato.

Depreende-se que para as mariposas da Câmara, melhor do que algum poder agora é a perspectiva de ainda mais poder no futuro. Os deputados peemedebistas trocaram uma lâmpada quase queimada pela promessa de um poderoso refletor – que Temer precisa manter aceso a qualquer custo. Por enquanto, até o PT ajudou.

Em metade das votações, o partido de Lula votou junto com o rival. É que dar aumento de salário é fácil. Duro mesmo é cortar.

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