segunda-feira, 6 de junho de 2016

Cerveró relatou propinas de mais de meio bilhão de reais

• Delator apontou 11 políticos como beneficiários de desvios

Em delação premiada, ex-diretor da área internacional da Petrobras disse que maior suborno foi pago no governo FH

Nestor Cerveró, ex-diretor da Petrobras apadrinhado por PT e PMDB, revelou na delação premiada ter facilitado repasses de pelo menos R$ 564,1 milhões em propinas nos negócios da estatal. Ele apontou 11 políticos dos dois partidos como beneficiários dos subornos,
informam André de Souza e Carolina Brígido. Mas o maior valor individual, segundo Cerveró, ocorreu numa negociação da Petrobras na Argentina, em 2002, quando teriam sido pagos US$ 100 milhões para integrantes do governo FH, cujos nomes não revelou.

Propinas desde 2002

• Ex-diretor da Petrobras, Cerveró delata 11 políticos como beneficiários de esquema de corrupção

André de Souza e Carolina Brígido - O Globo

-BRASÍLIA- O ex-diretor internacional da Petrobras Nestor Cerveró apontou o pagamento de pelo menos R$ 564,1 milhões em propina envolvendo negócios da estatal e de uma de suas subsidiárias, a BR Distribuidora. Onze políticos são nominalmente citados como beneficiários dos desvios. Os detalhes estão na delação premiada de Cerveró, que está colaborando com a Justiça em troca de redução da pena. A cifra deve ser maior, uma vez que os valores não estão atualizados e não há informação de quanto foi pago em propina em parte dos negócios com irregularidades.


Individualmente, o valor mais alto se refere à aquisição pela Petrobras, em 2002, da empresa petrolífera argentina Pérez Companc. Segundo ele, o negócio rendeu US$ 100 milhões em propina para integrantes do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Usando o câmbio de sexta-feira passada, mas sem correção monetária, a cifra chega a R$ 354 milhões.

Em 2007, outro negócio relativo à Pérez Companc voltaria a render propina, segundo Cerveró. Foi durante a venda da Transener, principal linha de energia que liga a Argentina de norte a sul e que era da Pérez Companc. Em 2003, Nestor Kirchner assumiu a Presidência da Argentina e, segundo Cerveró, fez pressão para a Petrobras vender a Transener. O negócio foi fechado com um amigo de um ministro da administração Kirchner e rendeu pelo menos US$ 300 mil (R$ 1,06 milhão) para Cerveró e outros US$ 300 mil para o lobista Fernando Antônio Falcão Soares, mais conhecido como Fernando Baiano. Mas, segundo o próprio Cerveró, a maior parte da propina ficou na Argentina.

De acordo com o ex-diretor da Petrobras, a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, rendeu US$ 15 milhões (R$ 53,1 milhões) em propina para o ex-senador Delcídio Amaral, Fernando Baiano e o ex-diretor de Abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa, entre outros. Mais R$ 4 milhões foram pagos a Delcídio em razão da reforma da refinaria. Em 2014, o Tribunal de Contas da União (TCU) concluiu que Pasadena causou um prejuízo de US$ 792,3 milhões (R$ 2,804 bilhões) à Petrobras.

A aquisição de sondas também levou ao pagamento de pelo menos US$ 24 milhões (R$ 84,96 milhões) em propina. Cerveró apontou como beneficiários o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o senador Jader Barbalho (PMDB-PA) e Delcídio, entre outros.

Segundo Cerveró, a compra de blocos de petróleo em Angola gerou propinas de R$ 40 milhões a R$ 50 milhões para a campanha presidencial do PT de 2006, quando Luiz Inácio Lula da Silva era candidato à reeleição. O ex-diretor da Petrobras disse que obteve essa informação de Manoel Vicente, presidente da Sonangol, empresa estatal de petróleo de Angola. As negociações do lado brasileiro teriam sido conduzidas pelo ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci.

Cerveró citou ainda várias propinas para Fernando Collor envolvendo negócios da BR Distribuidora. Seriam pelo menos R$ 26 milhões. Em algumas das negociações, porém, não há informação de valores. Ele também falou de propina, mas sem entrar em detalhes, para a campanha de alguns petistas, como Jaques Wagner, em 2006.

Além de propinas, Cerveró mencionou ingerências políticas, como a interferência da ex-ministra Ideli Salvatti para que a BR Distribuidora renegociasse uma dívida de R$ 90 milhões que a transportadora Dalçoquio tinha com a estatal. Outro ponto da delação é o prejuízo de US$ 40 milhões (R$ 141,6 milhões) com a interrupção da obra da fábrica de lubrificantes em Duque de Caxias (RJ). Disse ainda que o ex-ministro de Minas e Energia Edison Lobão ordenou o fundo de pensão da estatal, Petros, a investir no Banco BVA, que viria a falir.

Quando as primeiras informações da delação de Cerveró vieram a público, o ex-presidente Fernando Henrique soltou nota defendendo o ex-presidente da estatal Francisco Gros. “Na época o presidente da Petrobras era Francisco Gros, pessoa de reputação ilibada e sem qualquer ligação politico partidária. Afirmações vagas como essa, que se referem genericamente a um período no qual eu era presidente e a um ex-presidente da Petrobras já falecido, sem especificar pessoas envolvidas, servem apenas para confundir e não trazem elementos que permitam verificação”.

O Instituto Lula sempre rechaçou todas as acusações vindas de Cerveró, assim como o ex-ministro Jaques Wagner. Os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e o afastado da Câmara, Eduardo Cunha, negaram ter recebido quaisquer vantagens indevidas. Os senadores Jader Barbalho e Edison Lobão adotam a mesma posição em relação a Cerveró. O senador Fernando Collor disse repudiar “os termos da delação que são absolutamente inverídicos”. Ideli Salvatti disse que Cerveró “mente em todas as suas declarações”. Apesar de ter feito delação premiada, o ex-senador Delcídio Amaral afirmou à Polícia Federal não ter recebido propinas.

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