sexta-feira, 24 de junho de 2016

Dinheiro de consignado irrigava caixa do PT

• PF prende Paulo Bernardo, ex-ministro dos governos Lula e Dilma. Esquema desviou R$ 100 milhões

Petista é acusado de receber R$ 7 milhões desviados de taxas cobradas de servidores que contraíam empréstimos; esquema, que arrecadou R$ 100 milhões, abastecia o partido, alvo de buscas em SP

A Operação Custo Brasil, derivada da Lava-Jato, prendeu Paulo Bernardo, ex-ministro dos governos Lula e Dilma, por envolvimento em esquema que desviava taxas pagas por servidores em empréstimos consignados. Em cinco anos, R$ 100 milhões irrigaram o caixa do PT e de políticos. A fraude usava empresas de fachada. Também são investigados o ex-ministro Carlos Gabas e o jornalista Leonardo Attuch, do blog Brasil 247. No Planalto, a avaliação é que a prisão representa uma “pá de cal” nas pretensões de volta ao poder de Dilma.

Fraude consignada

• Desvio de taxa paga por servidores em empréstimos leva à prisão ex-ministro de Lula e Dilma

Renato Onofre e Cleide Carvalho - O Globo

SÃO PAULO - Em desdobramento da Operação Lava-Jato, o ex-ministro Paulo Bernardo, marido da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), foi preso em Brasília acusado de movimentar R$ 7 milhões num esquema de propina organizado no Ministério do Planejamento, pasta que ele comandou. O petista é peça central do desvio de R$ 100 milhões cobrados de milhares de servidores federais que tomaram empréstimos consignados — descontados na folha de pagamento — entre 2010 e 2015. A operação de ontem foi batizada de Custo Brasil, referência ao prejuízo que a corrupção causa aos trabalhadores.


O esquema também abasteceu o caixa do PT. O ex-tesoureiro João Vaccari, que já foi condenado na Lava-Jato e cumpre pena, teve nova prisão decretada. Ele comandava a distribuição do dinheiro desviado no partido. A operação de ontem, liderada pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal de São Paulo, revela que a corrupção não se limitou à Petrobras e que as investigações avançam além de Curitiba.

— É uma resposta àqueles que celebravam com champanhe o declínio do caso em Curitiba, para mostrar que não é só Curitiba que faz investigação, o que faz muito bem. Isso é uma meta de todas as instituições: perseguir a corrupção — disse o procurador Andrey Mendonça, do Ministério Público Federal de São Paulo.

Juiz decreta prisão de 11 envolvidos
No esquema descoberto pela Custo Brasil, os servidores endividados pagavam R$ 1 de taxa de gerenciamento em cada prestação mensal do empréstimo. Esse gerenciamento das dívidas era feito pela empresa de informática Consist. No entanto, esse serviço custava apenas R$ 0,30; R$ 0,70 era destinado à propina, que, por meio de empresas de fachada, chegava aos envolvidos. Em cinco anos, os pequenos desvios resultaram no montante de R$ 100 milhões.

— É um exemplo de como a corrupção e a sonegação prejudicam o cidadão e aumentam o custo das operações — disse Fábio Ejchel, da Receita Federal, um dos investigadores.
O juiz Paulo Bueno de Azevedo, da 6ª Vara Criminal de São Paulo, determinou a prisão preventiva de 11 pessoas. Entre eles, mais um ex-tesoureiro do PT: Paulo Ferreira, marido da ex-ministra Tereza Campello. Ferreira deve se apresentar hoje à Justiça.

Bernardo foi ministro do PT por dez anos. No governo Lula, comandou o Planejamento. No de Dilma, Comunicações. Segundo a investigação, ele usou o escritório de advocacia Guilherme Gonçalves, de Curitiba, para receber a propina. O escritório pagou empregados, aluguéis de lofts e serviços jurídicos de Bernardo e Gleisi. Dos R$ 7 milhões destinados ao ex-ministro, 20% eram descontados pelo escritório e R$ 5,6 milhões foram para Bernardo. A investigação sobre Gleisi está no STF.

Ex-vereador petista delatou esquema
A ação teve como peça importante a delação de Alexandre Romano, ex-vereador do PT que operou para a Consist e foi preso em agosto de 2015 na Operação Pixuleco 2. Segundo Romano, Paulo Bernardo ficou com um terço da propina, que era dividida com funcionários do segundo e terceiro escalões do Planejamento.

O PT abocanhava dois terços. Caberia a Vaccari distribuir o dinheiro. O ex-tesoureiro determinou, segundo o delator, depósitos, inclusive a empresas de fachada. A Jamp, do delator Milton Pascowitch, pagou R$ 120 mil à Editora 247, que edita o site Brasil 247. Também recebeu dinheiro do esquema a Focal Comunicação Visual, que trabalhou na campanha da Dilma em 2014.

O esquema foi revelado pela primeira vez pelo GLOBO, em agosto de 2015. Segundo Romano, participaram das primeiras reuniões para organizar a fraude, além de Paulo Bernardo, Vaccari e Paulo Ferreira, o ex-ministro da Previdência de Dilma Carlos Gabas e Luís Gushiken, ex-ministro das Comunicações de Lula, morto em 2013. Gabas, que ganhou fama por ter levado Dilma para passear na garupa de sua Harley-Davidson, foi um dos alvos da operação de ontem — ele se recusou a depor.

— Há um mandado para eu depor ou ficar calado. Optei por depor, mas com minha advogada. Pode marcar data e horário — disse Gabas.

Na sede do do PT em SP, os investigadores apreenderam caixas com recibos da campanha de 2014 e listas de repasses a candidatos.

Entre os beneficiários de propina estaria o secretário de Gestão do município de São Paulo, Valter Correia, um dos presos. Ele foi secretário adjunto do Planejamento. Ontem, pediu exoneração ao prefeito Fernando Haddad.

Os advogados do ex-ministro informaram que o contrato com a Consist não passou pelo aval do então ministro. Guilherme Gonçalves informou que o escritório prestou serviços à Consist e nunca fez pagamentos ao ex-ministro. A Consist afirmou que colabora com as investigações.

(Colaboraram: Stella Borges e Luiza Souto)

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