domingo, 12 de junho de 2016

Entrevista. Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), líder do governo no Senado

‘Michel Temer tem legitimidade; falta autoridade política’

• Para líder do governo no Senado, desempenho do presidente em exercício é o que vai garantir sua permanência no cargo

Luiz Maklouf Carvalho - O Estado de S. Paulo

Houve dia – 9 de março de 2015, mal se vai um ano – em que o senador Aloysio Nunes Ferreira, tucano de São Paulo, soltou, na imprensa, o seguinte petardo: “Não quero que ela saia, quero sangrar a Dilma, não quero que o Brasil seja presidido por Michel Temer”. Hoje, Ferreira é o líder do governo Temer no Senado.

“A frase não tinha nada de pessoal contra ele”, disse o senador ao Estado. Naquele momento, explicou, ainda era contra o impeachment. Quando aderiu, mergulhou de cabeça, como se pôde assistir em sua enérgica participação na comissão que vai selar a sorte da presidente afastada Dilma Rousseff.

O presidente interino o convidou para líder depois de uma conversa com o senador Aécio Neves, presidente do PSDB. Ele ouviu a bancada e não pensou duas vezes em dizer sim. “O presidente Michel Temer tem legitimidade constitucional, mas ainda não tem a autoridade política que decorre da sua função constitucional.”

• Depois de indicado líder, o sr. tem falado mais com o presidente? Como é que funciona?

Não tem necessidade de ficar falando toda hora. O importante é que o canal está aberto para falar quando precisar. Eu tenho uma relação muito antiga com o presidente. Eu o conheci na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em 1963. Ao longo desses anos tivemos vários momentos de proximidade política e funcional, no PMDB. Já estive próximo, já estive mais distante, em razão das disputas no PMDB, mas sempre foi uma convivência muito cordial.


• Em março de 2015 o sr. disse a seguinte frase, publicada na imprensa: “Não quero que ela (Dilma) saia, quero sangrar a Dilma, não quero que o Brasil seja presidido pelo presidente Temer”. Na época, o vice-presidente Temer não deve ter gostado. Agora o sr. é o líder do governo Temer.

A minha reserva não era ao vice-presidente Michel Temer. Era contra o impeachment naquele momento. O que está dito aí, claramente, é que eu não considerava a tese do impeachment oportuna naquele momento.

• O que mudou de lá para cá para chegar na situação de hoje?

O que mudou foi a inevitabilidade do impeachment – e, em consequência, a inevitabilidade da substituição da presidente Dilma pelo vice-presidente Temer, conforme manda a Constituição. O que me parece evidente é que Dilma Rousseff não tem mais a menor condição de voltar a dirigir o País, nenhuma. Até as pedras da rua sabem que é uma pessoa que tem total inépcia, irresponsabilidade, e ausência completa de liderança para dirigir o País, especialmente nesse momento de crise.

• Alguns senadores declararam, depois que as gravações de Sérgio Machado vieram à luz, que podem votar contra o impeachment. Tem algum temor de que uma meia dúzia de senadores mude o voto, dada a situação do momento, quase uma crise por dia?

Nenhum temor. Primeiro, porque o fundamento jurídico da acusação é muito sólido. Segundo, porque existe a constatação, por todos, de que a Dilma não tem mais condições de dirigir o País.

• Por todos que são a favor do impeachment, o sr. quer dizer...

O senador Cristovam Buarque, eu perguntei algumas vezes a ele: você acha que a Dilma deve voltar?

• E o que foi que ele disse?

Eu não vou dizer, porque ele está meditando. É um homem da maior responsabilidade.

• Como é que o sr. administraria a possibilidade de Dilma voltar?

O Brasil afundaria numa crise muito mais grave do que esta. É combater a doença com o remédio que já matou o doente.

• Uma das suas tarefas centrais, então, é zelar para pelo menos manter a maioria que já foi obtida na primeira votação.

Eu tenho sentido que na votação definitiva nós vamos ter uma margem maior que os 55 votos da primeira votação. Estou convencido disso.

• E aí como ficaria o horizonte do governo?

Aí clarifica muito. Porque todo governo comente erros, especialmente um governo que surge a partir da rejeição de uma presidente anterior do que da aprovação do presidente que se instala. O Temer tem uma legitimidade constitucional, mas ainda não tem a autoridade política que decorre da sua função constitucional. O desempenho é que vai garantir essa legitimidade. A provisoriedade é uma hipoteca que paira sobre o desempenho, e precisa ser resgatada.

• O que foi que o presidente Temer lhe pediu ao lhe convidar para ser o líder no Senado?

“Nós precisamos reconstitucionalizar o País, levar o País novamente à normalidade, ao respeito à legislação, à normalidade financeira, portanto enfrentar o grande problema do ajuste fiscal, e estabelecer um bom diálogo com todas as forças políticas, inclusive com a oposição.”

• Uma das questões que tem marcado esse começo algo complicado do governo interino é a das denúncias, quase uma por dia, entre elas envolvendo a Lava Jato. O sr., inclusive, é alvo de um inquérito, no Supremo Tribunal Federal, não relacionado à Lava Jato, por decisão do ministro Teori Zavascki. As denúncias atrapalham muito?

O inquérito sobre mim não é relacionado ao petrolão. Está com o ministro Celso de Melo, e o próprio (Rodrigo) Janot (procurador-geral da República), quando pediu a investigação, fez questão de esclarecer, no seu despacho, que ela não se destina a apurar fatos ligados a Lava Jato. É uma investigação a respeito de R$ 200 mil que eu teria recebido na minha campanha de 2010 e não teria declarado, numa campanha que custou mais de R$ 11 milhões. Eu já tomei todas as iniciativas para apressar o inquérito, enviei à Polícia Federal todos os documentos necessários e espero que seja encerrado muito brevemente. Não há nada que me atribua qualquer responsabilidade em delito eleitoral. Isso me entristece, me aborrece e eu tenho pressa em resolver.

• E as outras denúncias – que até ministro já derrubaram? Quase todo dia tem uma nova...

A Lava Jato é algo que veio pra ficar – e vai durar. Os fios vão sendo puxados, e quando puxa um, vai puxando o outro, e o novelo vai desenrolando. Há toda uma conjugação de atos criminosos, envolvendo os mais diferentes órgãos do governo, envolvendo empresas, políticos. E é um mundo fechado, em que todos se conhecem, todos se falam, trocam favores. Mais do que a corrupção, é um mundo velho que está desabando, é um sistema de fazer política, é a promiscuidade entre os interesses públicos e privados, que estão morrendo, e ainda bem que estão morrendo. Então, é o Brasil velho que está morrendo.

• O presidente em exercício tinha dois caminhos. O primeiro era não convidar para o Ministério e outros cargos de confiança quem estivesse sendo investigado na Lava Jato. O segundo era convidar – e foi o que ele fez. O presidente não errou?

Não, porque existem pessoas que são objeto de inquérito e que não são necessariamente culpadas.

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