domingo, 12 de junho de 2016

Foge o irrecuperável tempo – Editorial / O Estado de S. Paulo

Como relator dos processos relativos à Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, o ministro Teori Zavascki tem imensas responsabilidades, pois toma decisões que podem produzir fortes impactos no mundo político. Por essa razão, faz bem o magistrado em ser prudente e abrigar-se, na discrição e no silêncio, das fortes pressões que naturalmente vem sofrendo – fazendo jus ao apelido de “esfinge”. No entanto, não se pode confundir prudência com procrastinação. Ao adiar decisões por tempo demasiado, como tem feito com frequência em casos de grande repercussão e com potencial de abalar o governo e o Congresso, o ministro adiciona desnecessária tensão a situações que já são, por sua própria natureza, explosivas.

O caso mais recente foi o encaminhamento, por parte do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, do pedido de prisão dos caciques peemedebistas Renan Calheiros, presidente do Senado; José Sarney, ex-presidente da República; Romero Jucá, senador e ex-ministro; e Eduardo Cunha, presidente afastado da Câmara. Todos eles são acusados de tramar para sabotar a Lava Jato.


O pedido foi enviado a Teori há mais de duas semanas, e o País só soube disso porque houve vazamento dessa informação à imprensa. É claro que a indiscrição de alguma das partes envolvidas se prestou a constranger Teori, para obrigá-lo a tomar alguma decisão. E é claro também que o ministro relator não deve ceder a tal pressão.

A demora excessiva de Teori em deliberar sobre questões tão espinhosas tem ensejado esse tipo de comportamento. Na política – goste ou não o ministro, no Supremo ele faz parte desse mundo –, os atores adaptam-se às circunstâncias e jogam o jogo com as estratégias possíveis, inclusive as indecorosas. O ministro Teori parece acreditar que, ao retardar o despacho de certas causas que pousam em seu escaninho – principalmente aquelas que se situam na zona fronteiriça dos atos exclusivos de cada Poder da República –, estará contribuindo para evitar a gestação ou o agravamento de crises. Mas o que se dá é justamente o contrário: o emudecimento do ministro Teori acaba por criar todo tipo de especulação, que ganha vida nas colunas de bastidores e nos corredores da política. Assim, em lugar de colaborar para solucionar a crise, o ministro adiciona a ela os elementos da incerteza e da especulação.

Foi o que aconteceu no caso do afastamento de Eduardo Cunha da presidência da Câmara. O pedido de Rodrigo Janot para que Cunha fosse impedido de continuar a usar seu poder institucional para evitar sua cassação, por quebra de decoro parlamentar, ficou na gaveta de Teori por nada menos de cinco meses. Tudo indica que o ministro estava disposto a adiar a tomada de qualquer decisão a esse respeito na presunção de que, nesse ínterim, a própria Câmara se encarregasse de afastar Cunha. Havia também a opinião, dentro do Supremo, de que o pedido de Janot era frágil e teria de ser rejeitado – o que obviamente favoreceria Cunha. Se isso é verdade, então a decisão de deixar o pedido de Janot em banho-maria, a fim de manter Cunha pressionado e de esperar que o caso se resolvesse no Congresso, foi eminentemente política, o que não parece combinar com as tendências conhecidas do ministro Teori Zavascki.

O episódio, como se sabe, teve outro desfecho. Teori se viu afinal obrigado a deferir o pedido de afastamento de Cunha, alegando razões extraordinárias, quando outra ação contra o deputado foi encaminhada ao plenário do Supremo – ocasião em que ficaria clara a demora inexplicável de Teori. Note-se que, se tem escrúpulos em imiscuir-se em assuntos que reputa deverem ser resolvidos por outro Poder, restam ao juiz os caminhos de não conhecer a causa ou de remetê-la, com suas ressalvas, ao plenário do Tribunal – e isso em prazo razoável com a urgência do problema em questão.

O discretíssimo ministro está também há um mês sem decidir sobre o pedido da força-tarefa da Lava Jato para que os inquéritos que envolvem o ex-presidente Lula sejam devolvidos à primeira instância, em Curitiba. O petista não ganhou o foro privilegiado que desejava, mas seu caso não saiu do Supremo.

Como o ministro Teori Zavascki só se manifesta nos autos, sua demora em decidir, nesses casos, alimenta teorias e versões muitas vezes perversas, mas insopitáveis.

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