segunda-feira, 6 de junho de 2016

O que resta a Dilma – Ricardo Noblat

- O Globo

“Quando você tem razão, ninguém se lembra disso; quando está errado, ninguém esquece” Muhaammead Ali, o melhor do boxe mundial

Receosos de complicações futuras com a Justiça, políticos de todas as cores apressaram na Câmara a aprovação do impeachment de Dilma. Esperavam assim que o governo Temer pudesse barrar o avanço da Lava-Jato. Não barrou, por impossível. Agora, com medo de ser atingido por novas delações, é o próprio governo Temer que tenta apressar o desfecho do impeachment no Senado. Não conseguirá, por absurdo.


TEMER NEGA A PRESSA. Esqueceu, porém, de avisar a respeito os que defendem seu governo no Senado. Ali, na semana passada, comissão especial, de maioria governista, encurtou em 15 dias o prazo de acusação e de defesa de Dilma. Esqueceu-se, porém, de combinar com o ministro Ricardo Lewandowski, que preside a fase final do impeachment em nome do Supremo Tribunal Federal.

É IMPROVÁVEL que o ministro concorde com qualquer mudança no rito e calendário do julgamento fixado pela maioria dos seus pares. Se o fizer, abrirá espaço para mais uma série de recursos judiciais da defesa que poderão servir para atrasar o processo. Quanto mais tudo se arrastar, melhor para Dilma. Sem apoio político para voltar ao exercício da Presidência, só lhe resta contar com o imprevisível.

POR TAL, entenda-se alguma coisa que decrete o fracasso precoce de Temer. Para ele, quanto tudo correr mais rápido, melhor. Temer diz que é igual a zero a chance de ser ferido por uma bala perdida da Lava-Jato. Mas não descarta que balas certeiras possam abater mortalmente alguns dos seus auxiliares e políticos importantes. Qualquer marola seria ruim para travessia tão penosa.

EM UM PONTO, pelo menos, concordam a presidente afastada e o presidente interino: a situação de transitoriedade do governo atual “não é útil” para o Brasil. Temer disse-o em entrevista ao SBT. Indiretamente, Dilma diz quase todo dia ao bater em Temer e no seu governo. O PT já não bate muito. Largou Dilma à própria sorte. E Lula calou-se. Tem mais com o que se preocupar.

O IDEAL PARA DILMA teria sido permanecer no cargo até o último ato do seu julgamento. Para Temer, um processo relâmpago de impeachment que confirmasse sua Presidência em definitivo. As Olimpíadas vêm aí. Há chefes de Estado, entre eles os dos Estados Unidos, da Inglaterra e da Alemanha, que não querem passar pelo constrangimento de cumprimentar dois presidentes do Brasil.

MAS A TRANSITORIEDADE está prevista em lei — e, para alterá-la, só mexendo na Constituição, tarefa que o Congresso se nega a enfrentar desde o impeachment de Fernando Collor. De resto, algo traumático como um impeachment exige tempo para ser assimilado por todos os seus personagens, o povo incluído. Como tirar às pressas do poder quem foi posto ali pela maioria dos eleitores?

O QUE TEM FEITO mal ao país ultimamente não é a transição de um governo para outro, mas o clima de confronto estimulado por Dilma. As ruas, é fato, não respondem mais com energia crescente ao discurso do golpe. Entre 500 e mil pessoas, apenas, compareceram a uma manifestação estrelada por Dilma no Rio. Vinte vaiaram Temer, ontem, defronte de sua casa, em São Paulo.

PESQUISA da Confederação Nacional da Indústria feita nos primeiros quatro dias do governo Temer mostrou que atingiu o patamar mais alto, em um ano e meio, a confiança dos brasileiros em relação a emprego, renda e inflação. Dilma parece destinada a sair de cena da mesma maneira como quis governar: sozinha.

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