sexta-feira, 17 de junho de 2016

Para tucano, destino do PSDB depende de Temer

• "Uma nova eleição presidencial é um delírio. É claro que não tem a menor viabilidade jurídica"

• "Minha ida para a liderança do governo significa uma partilha do destino do governo com o PSDB"

Por Vandson Lima e Thiago Resende – Valor Econômico

BRASÍLIA - Mesmo que a proposta que limita o crescimento dos gastos públicos não seja aprovada até agosto, o Orçamento do próximo ano deve ser formulado já considerando um teto para as despesas, informou o líder do governo no Senado, Aloysio Nunes (PSDB-SP). O tucano, que jantou na quarta-feira com o presidente interino Michel Temer no dia em que a o projeto foi protocolado no Congresso, disse que o cálculo consideraria a programação de desembolsos até dezembro mais a inflação estimada para 2016.

Em entrevista ao Valor, Aloysio observou que o PSDB não tinha outra opção que não fosse participar do governo do PMDB e trabalhar para que Temer seja bem sucedido. Só assim terá chance na disputa presidencial de 2018. Mas admitiu que a parceria pode ter prazo: "Como toda aliança política quando chega na hora da eleição, é possível que os partidos, cada um, busquem o seu caminho". Porém, os tucanos, segundo o ministro, estão focados por enquanto em resolver a crise do país e buscar o ajuste fiscal.

Ainda na área econômica, o líder do governo deixou claro que o Senado vai barrar o reajuste de salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), de R$ 33.763 para R$ 39.293, aprovado pela Câmara dos Deputados no início do mês. A medida teria "efeito cascata" e agravaria a difícil situação das contas de Estados e municípios.

Diante do embate entre o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, o tucano evitou polemizar. Contudo, não quer a abertura de processo de destituição de Janot. "A preocupação do governo é impedir que essa turbulência politica provocada pela Lava-Jato, que é grande e vai continuar, não afete o funcionamento do Congresso", ponderou.

A seguir, trechos da conversa:


• Valor: Renan sinaliza que pode encampar um pedido de destituição de Janot. O senhor é a favor?

Aloysio Nunes Ferreira: A minha preocupação é fazer um aceiro [faixa ao longo de uma cerca] para evitar que o fogo que está aceso em um dos lados desse tabuleiro político contamine o outro. A preocupação do governo é impedir que essa turbulência provocada pela Lava-Jato, que é grande e vai continuar, não afete o funcionamento do Congresso. Coincide com a linha de conduta do Renan: é permitir que o Congresso funcione independentemente dessas turbulências.

• Valor: Mas, se ele abrir esse processo contra Janot, ao mesmo tempo que tramita o impeachment de Dilma, o Senado vai parar.

Aloysio Nunes: Vamos esperar até quarta-feira, quando ele disse que ele vai tomar decisão. Espero que isso não aconteça. Eu fui muito crítico desses pedidos de prisão [de Renan e outros senadores, encaminhados por Janot], que foram finalmente recusados, e com toda a razão, pelo ministro Teori Zavascki. Não vi ali fundamento para prisão, muito menos prisão em flagrante.

• Valor: Tem opinião sobre mudança na lei de delações, para evitar depoimento de quem está preso?

Aloysio Nunes: A delação tem sido um instrumento muito útil para romper determinadas carapaças seculares. E eu sou favorável que ela continue como está.

• Valor: Renan tem nove inquéritos contra ele e, ao contrário do que fez com Eduardo Cunha, o PSDB não pede seu afastamento. Por que?

Aloysio Nunes: O presidente Renan tem sido, nas suas relações internas no Senado, extremamente equânime, leal e previsível. Eu, como senador e como líder do governo, não tenho nenhuma queixa à sua conduta. As questões dele na Justiça tem que resolver na Justiça.

• Valor: Não é conivente? Qual o limite? E se ele virar reú?

Aloysio Nunes: Depende da decisão do STF. Tem que avaliar isso. O ângulo que eu analiso não é judiciário. É de ele ser presidente da Casa Legislativa na qual eu trabalho, na qual eu tenho interesses políticos e projetos para defender, meus e, agora, do governo. O presidente Renan tem que conduzido os trabalhos de forma que eu não tenho nenhum reparo. É isso que eu quero dizer. Não quero ir adiante disso.

• Valor: O avanço da Lava-Jato sobre PMDB, PSDB e Temer influencia no processo de impeachment?

Aloysio Nunes: Não. A Dilma não é mais presidente e não voltará a ser. Ninguém em sã consciência admite que Dilma possa voltar e dirigir o país por mais dois anos e meio. Nem o próprio PT. É um pesadelo inimaginável.. Ela é a mesma Dilma com suas obsessões, seu rancor. Ela conseguiu destroçar a maior base política que um presidente já teve.

• Valor: E nova eleição presidencial, em outubro?

Aloysio Nunes: É mais um delírio. É no fundo uma cobertura doutrinária ou ideológica para aqueles que querem votar contra o impeachment, mas tem medo das consequências junto a opinião pública. Mesmo porque você teria um presidente eleito, numa campanha apressada, governando com esse mesmo Congresso que está aí. Com 25 partidos na Câmara, com tantas denúncias, com fisiologia, então é algo absolutamente fantasioso.

• Valor: Temer é chantageado em relação à votação no Senado?

Aloysio Nunes: Não sou porta-voz de nenhum pedido dessa natureza. É claro que tem senadores que trazem pedidos de nomeações de cargos. Pedir, pedem. Mas não significa que vai ser concedido. E mais, o sujeito pode pedir a Petrobras, o Banco do Brasil, mas na hora do vamos ver, ele vai ter que votar a favor ou não da volta da Dilma. Vai ter que arcar com as consequências desse voto. Alguns estão aí nessa franja porque querem ver as provas que vão ser produzidas para depois se pronunciarem, é legítimo. Mas isso não faz voto suficiente para barrar o impeachment. Não poderão deixar de ver o conjunto da obra, de ir além dos fatos apontados na representação e verificar o conjunto do desastre financeiro, do volume da corrupção e sobretudo as consequências econômicas. É isso que o eleitor dele está levando em conta.

• Valor: Confirmado o impeachment, vão trocar o ministério?

Aloysio Nunes: É claro que Temer está testando as pessoas que foram nomeadas. Ele fez uma escolha pessoal na área econômica, política externa, o Serra foi uma escolha dele. E o Ministério da Justiça, que são os pilares da administração, além da Casa Civil e ministros do Palácio. Os demais cargos são cargos, ainda que indicados por partidos políticos, estão sujeitos a teste de desempenho. Temer tem um desafio pela frente. Ele tem uma legitimidade que veio da Constituição, mas sua força política crescerá ou não segundo o seu desempenho.

• Valor: O PSDB tem quatro ministros fortes e o senhor na liderança. está amarrado ao governo?

Aloysio Nunes: Minha ida para a liderança do governo significa um compartilhamento político do destino do governo com o PSDB. E esta é uma escolha que nós fizemos, que decorreu da nossa participação no impeachment. A consequência lógica disso. Eu recebi a sondagem pelo líder do PMDB. E enquanto eu estava conversando com o Eunício Oliveira, Temer estava indo à casa do Aécio, saiu de lá com o apoio. Portanto, estou otimista em relação ao governo de Michel Temer. Além de gostar dele.

• Valor: O senhor e ele se conhecem há muito anos.

Aloysio Nunes: Conheço o presidente Michel Temer de quando entrei na faculdade de Direito, em 1963. O Michel era uma pessoa muito popular na faculdade.

• Valor: Qual é a prioridade de Temer, se permanecer até 2018?

Aloysio Nunes: Coisa macro realmente é estancar o crescimento da dívida pública, colocar em trajetória em queda com meios sustentáveis. Tem vários projetos que não tem um custo político elevado e que representam reformas microeconômicas interessantes, que faziam parte aliás de um conjunto de propostas do ex-ministro Joaquim Levy e que não foram consideradas pelo próprio PT. Reformas do PIS/Cofins, do ICMS. Medidas que não tem um custo político muito elevado, mas que terão resultado positivo. A própria diminuição da participação obrigatória da Petrobras nos campos de pré-sal.

• Valor: Começa com a PEC do limite de gastos?

Aloysio Nunes: Sim. É um choque de realidade. O tamanho do Estado brasileiro não pode ir além daquilo que a sociedade se dispõe a pagar, seja em termos de juros ou de tributos. E o governo propõe um limite global. É o único jeito de conter a escalada que está levando a dívida interna ao patamar que está.

• Valor: Há condições de aprovar?

Aloysio Nunes: É algo fundamental. Vamos fazer. Terá um resultado muito benéfico e vai se sentir imediatamente no nível das taxas de juros, que não vão ser derrubadas na marra, mas acomodadas pela própria situação do tomador do dinheiro, que é o governo. Vai levar a maior responsabilidade do governo na elaboração do Orçamento e do Congresso na análise da peça. Chegamos a um ponto de irrealismo, de maluquice institucional, em que a Dilma mandou uma proposta prevendo crescimento real da arrecadação de 6% este ano. E o Congresso aprovou!

• Valor: Mas o orçamento costuma conter irrealismos. Vai mudar?

Aloysio Nunes: Acabou a fantasia. Vai levar a uma mudança de costumes, política, de escolha de prioridades. Se eu quero elevar o gasto em Saúde, ok, mas vai cortar onde? Vai ter que dizer. O orçamento passará a ser arena do confronto entre interesses divergentes, para valer.

• Valor: Mas dá para aprovar a PEC até quando?

Aloysio Nunes: O Orçamento de 2017 deve vir já ajustado, evidentemente [às mudanças propostas na PEC]. Corrigindo pela inflação. É claro que vai ter resistências de corporações, que são fortes no Brasil e têm influência no Congresso, mas confio que passa. O apoio na Câmara tem sido muito consistente, tem algo ali em trono de 350 a 360 votos.

• Valor: O que acontecerá com os reajustes concedidos ao funcionalismo e aprovados na Câmara?

Aloysio Nunes: Alguns desses reajustes foram aprovados pelo governo, outros não. Refiro-me especialmente a reajustes de categorias que já tinham sido objeto de negociação entre o governo anterior e o funcionalismo. Eram acordos já concluídos e acarretavam gastos já previstos no Orçamento, dentro da meta anterior de déficit de R$ 96 bilhões. Para o governo romper esse contrato, teríamos uma consequência complicada, com greves. E seria a ruptura de um acordo feito por um governo brasileiro.

• Valor: O do Judiciário é justo?

Aloysio Nunes: Fica ali entre 30% e 50%, foi abaixo do que o próprio Congresso antes havia aprovado. E que foi vetado pela presidente Dilma, e bem vetado. Ocorre que, quando esse veto foi examinado, houve uma condição para os deputados manterem o veto: abrir nova negociação com o governo. A negociação ocorreu e o resultado é este, ninguém pode dizer que não estava sabendo. Mas outros não.

• Valor: O reajuste dos ministros do STF será derrubado?

Aloysio Nunes: O reajuste de toda a magistratura, que decorre do aumento do teto, tem uma consequência em cascata. Vai pegar toda a magistratura estadual, puxa promotores, defensores, delegados de polícia. Eu não sei como o [Francisco] Dornelles [governador do Rio] vai pagar isso! Não tem como enfiar uma conta dessa nos Estados.

• Valor: O Senado vai barrar?

Aloysio Nunes: Isso [reajuste] vai esperar melhor oportunidade. Realmente tem um efeito grave nos Estados. E vai chegar aos municípios, porque quando reajusta o salários dos magistrados, isso puxa a remuneração dos deputados estaduais e, aí, dos vereadores. Está tudo vinculado, na Constituição ou na política. O Senado tem uma sensibilidade maior às questões dos Estados. Muitos de nós foram governadores e muitos querem ser.

• Valor: O Senado reverte as mudanças na lei das Estatais?

Aloysio Nunes: A aprovação da lei já foi um grande avanço. Algumas das emendas feitas na Câmara vamos confirmar, outras não. A posição do presidente Temer é que a mudança em relação ao período de experiência, de 10 anos na área para nomear a pessoa, era excessivo. Até foi dito que, observada essa regra, não podia ter nomeado o Pedro Parente na Petrobras. Os demais pontos vamos retomar o texto do Senado.

• Valor: Temer balança com essa delação de Sérgio Machado?

Aloysio Nunes: Veja, Temer é um homem vivido, de longa história na política. Até eu, se quisesse ajudar um prefeito, teria amigos para recorrer. Ele era vice-presidente, três vezes presidente da Câmara, não teria meia dúzia de amigos a quem ele pudesse, legitimamente, recorrer para uma contribuição legal? Para um candidato do partido dele, o maior do Brasil, na maior capital? Precisaria ficar com o rabo preso na caderneta do Sérgio Machado? Ainda mais um homem com a habilidade dele. Temer é capaz de concertar relógio com luva de boxe (risos).

• Valor: Qual o limite da participação do PSDB no governo?

Aloysio Nunes: O governo Michel Temer surge não porque tenha havido um "temerismo" na sociedade. Surgiu porque houve uma rejeição forte à Dilma. É natural que o PSDB apareça no governo como um partido que tem tradição de governo, então é hoje o maior partido na situação.

• Valor: Essa aliança acabaria às vésperas da eleição de 2018?

Aloysio Nunes: Pode ser. Como toda aliança política, quando chega na hora da eleição é possível que os partidos cada um busque o seu caminho.

• Valor: A entrada no governo não prejudica os planos do PSDB para 2018? Se o governo for bem, Temer pode querer ir à reeleição. Se for mal, o PSDB paga a conta junto.

Aloysio Nunes: Duas citações do Guimarães Rosa. Uma: viver é muito perigoso. Outro: passarinho que come pedra sabe o c** que tem (risos). Evidentemente, qualquer posição política nessa crise, que é a mais grave e multifacetada em muitos e muitos anos, terá perdas e ganhos. Acho que a única hipótese de o PSDB sair muito mal seria apoiar o impeachment e não apoiar o governo. Aí sim: se o governo dá certo, deu apesar de nós. Se dá errado, é porque nós não apoiamos. A única hipótese de o PSDB se dar bem é entrar no governo e o governo ir muito bem.

• Valor: Não tem como desvincular o PSDB do governo Temer então?

Aloysio Nunes: Não posso me descolar. Nem quero, esse amálgama foi criado pelas circunstâncias da política. Como eu ia imaginar que estaria hoje participando de um governo que quem até há pouco eram adversários nossos? O impeachment rompe os padrões usuais do comportamento político. É o desembarque na Normandia: a barcaça chegou e o fuzileiro só pode abrir e sair correndo. Não tem jeito, é isso ou morre na praia.

• Valor: PMDB e PSDB não acabarão dividindo votos em 2018?

Aloysio Nunes: Divide, mas pode somar depois, à frente.

• Valor: Tem hora para o PSDB desembarcar do governo?

Aloysio Nunes: Vai desembarcar na eleição, mas não penso nisso. Primeiro a gente precisa sair dessa encalacrada. Quem estiver pensando nisso não entendeu o tamanho dos problemas que temos hoje. Eu quero é embarcar, que o governo seja um grande sucesso para a gente chegar à eleição em 2018 em condições normais, sem confronto, pirotecnia, com civilidade, sem essa super excitação política.

• Valor: Lula pode ganhar em 2018?

Aloysio Nunes: Acho que não. É claro que ele é uma liderança individual muito forte. Mas tem também uma rejeição siderúrgica. É muito difícil ele fazer maioria absoluta.

• Valor: Serra voltou para o páreo?

Aloysio Nunes: Temos candidatos com prestígio popular, eleitoral. Aécio, Serra e Alckmin. Não é um problema.

• Valor: E a confusão em SP, com João Dória candidato a prefeito?

Aloysio Nunes: Confusão grande. Foi um processo muito radicalizado. Afastou-me qualquer fetichismo em relação às prévias. Terminou e as coisas não se acalmaram. Temos uma representação para anular o resultado. Por outro lado, o João Doria continua em uma atitude combativa, criou problemas para que pessoas do outro lado, amigos meus, se aproximassem da candidatura. É preciso ver o que ele tem a oferecer, se une o nosso eleitorado.

• Valor: O senhor vai apoiar a candidatura dele? Ou do Andrea Matarazzo, que foi ao PSD?

Aloysio Nunes: Não vou apoiar o Andrea. Ele está em outro partido. É preciso primeiro julgar a impugnação. Depois, promover uma pacificação do PSDB que tem de partir, sobretudo, do Doria. Claro que não é bom o que está ocorrendo. Ele continuou numa atitude belicosa. E precisamos saber o que ele tem para entregar ao eleitor. 'Ah, é do PSDB'. E daí?

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