quinta-feira, 2 de junho de 2016

PIB cai 0,3%, menos do que o esperado, e pode indicar 'fundo do poço'

Por Tainara Machado, Arícia Martins, Alessandra Saraiva e Robson Sales – Valor Econômico

SÃO PAULO E RIO - A queda de 0,3% do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre, na comparação com os três meses anteriores, feitos os ajustes sazonais, foi considerada uma surpresa positiva por economistas, mesmo que modesta. O número foi divulgado ontem pelo IBGE. Como a confiança dos empresários, especialmente na indústria, também mostrou certa reação nos últimos meses, o número reforçou a expectativa de virada da economia até o fim do ano.

O resultado melhor do que o esperado - analistas consultados pelo Valor Data projetavam, em média, queda de 0,8% - deve contribuir também para uma rodada de revisões do PIB para o ano. Tendências, Santander Asset Management e Banco ABC Brasil, que estimavam recuo de 4% no ano, agora avaliam que o número deve ficar mais perto de -3,5%, segundo avaliações preliminares. O Banco Brasil Plural, que já estimava queda de 3,5%, revisou a projeção para contração de 3,2%.


David Beker, chefe de economia e estratégia do Bank of America Merrill Lynch (BofA) no Brasil, manteve estimativa de retração do PIB no ano em 3,5%. Ele avalia que o resultado reforça a projeção de que a atividade voltará a crescer no quarto trimestre. Segundo ele, a confiança demora cerca de dois trimestres para ter efeito sobre a economia real. Como os indicadores estão avançando agora, a reação da atividade deve vir mais para o fim do ano. De qualquer modo, diz, o PIB do primeiro trimestre, ainda que fraco, foi a primeira surpresa positiva em muito tempo.

Juan Jensen, sócio da 4E Consultoria, também afirma que o resultado pode ser considerado "bom", até porque quase todos os componentes do PIB surpreenderam positivamente. Segundo ele, a estimativa atual da consultoria, de queda de 3,9% do PIB no ano, deve ser revista e pode melhorar em até 1 ponto percentual, em sua avaliação. "Se de fato este for o fundo do poço e os resultados daqui para frente forem um pouco melhores, as projeções vão melhorar sensivelmente".

Para analistas, o forte ajuste pelo qual passou o país desde o ano passado, com realinhamento de preços, desvalorização do câmbio e alta de juros, parece enfim colocar algumas engrenagens da economia para funcionar. A contribuição do setor externo, por exemplo, foi de 1,5 ponto percentual no trimestre, resultado de um aumento de 6,5% das exportações e de retração de 5,6% das compras do exterior, na comparação com o trimestre anterior.

Mesmo o investimento, que amargou o décimo trimestre consecutivo de queda, teve recuo de 2,7%, um pouco menos intenso do que no período anterior (-4,8%) e do que as projeções (-3,7%).

Para economistas, o investimento será chave para reverter a trajetória de deterioração da atividade econômica, porque é o primeiro componente do PIB a responder a uma melhora das expectativas, já que ainda há poucos motores funcionando na economia. O consumo deve continuar deprimido, com contínua piora do mercado de trabalho e do crédito.

A melhora está mais concentrada na indústria, mas o Índice de Confiança Empresarial, que se estabilizou em cerca de 70 pontos entre setembro e fevereiro, mostrou altas mais fortes nos últimos três meses. Por enquanto, destaca Aloisio Campelo, superintendente adjunto de Ciclos Econômicos do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV), a melhora tem se concentrado nas expectativas.


Danilo Passos, economista na Santander Asset Management, observa que os dados das sondagens de maio foram positivos, mas diz ser preciso esperar alguns meses para saber se a tendência vai se confirmar. Como a confiança demora cerca de dois trimestres para ter efeito sobre a economia real, é possível que o pior momento tenha ficado para trás e que o segundo semestre seja mais positivo, diz. Ele ressalta, porém, que a melhora das expectativas é resultado da perspectiva de avanço da gestão econômica, principalmente fiscal, e que isso precisa se concretizar.

Além da confiança, há outros sinais que sugerem estabilização da atividade mais à frente, diz Alessandra Ribeiro, sócia e economista da Tendências Consultoria, como a redução dos estoques e a reação das vendas de veículos. Caso esse movimento seja sustentável, os empresários devem tirar alguns projetos de investimento da gaveta, contribuindo para reduzir o ritmo de queda dos investimentos. "Com a ajuda do setor externo, isso pode estabilizar o PIB", diz.

Para ela, a formação de capital fixo só deve virar de fato, na comparação anual, no segundo trimestre de 2017. "Claro que temos uma capacidade ociosa tremenda, o que limita recuperação, mas em períodos de crise muito acentuada, o empresário não investe nem para compensar a depreciação do estoque de capital, e isso começa a voltar", diz.

Ao longo de 2017, afirma, as concessões de infraestrutura também devem começar a sair do papel, contribuindo para que o investimento volte a crescer e encerre o ano que vem com alta de 2%.

Passos, do Santander, espera um número até melhor para o investimento no ano que vem, com alta de 5%. Ele faz a ressalva, porém, de que não é preciso muito para voltar a crescer, diante da base deprimida de comparação - do pico recente até o fim de 2016, a formação de capital deve acumular redução de quase 40%.

Mesmo que as quedas diminuam, observa Cristiano Oliveira, economista-chefe do Banco Fibra, as consequências da redução do estoque de capital do país ainda serão sentidas por muitos anos. No primeiro trimestre, a taxa de investimento foi só de 16,6%, o que trouxe o PIB potencial para algo como 0,8% e 1,6%.

Em nota, o Ministério da Fazenda afirmou que o resultado decorre de "desenvolvimentos domésticos" e que espera-se retomada da economia nos próximos trimestres, "como consequência da implementação tempestiva de iniciativas recentemente anunciadas".

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