quinta-feira, 23 de junho de 2016

Sucessão de maus negócios levou a Oi à bancarrota – Editorial / Valor Econômico

A maior bancarrota de uma empresa da América Latina teve como protagonista uma empresa que já nasceu torta, a Telemar, depois Oi, fruto de uma privatização no geral bem sucedida, porém com falhas, e precedida por intervenções de governo desastrosas pelos resultados e suspeitas pelas intenções. A Oi entrou em recuperação judicial sob peso de dívidas de R$ 65,4 bilhões, dois terços delas em mãos de credores estrangeiros. Superalavancada em consequência de uma fusão ruinosa com a Portugal Telecom, a Oi tentou, sem sucesso, pôr de pé um plano de recuperação que colocaria 70% do capital da outrora "supertele brasileira" nas mãos dos investidores externos, que não aceitaram a oferta - queriam 95% do capital.


Uma sucessão de erros se acumulou desde a privatização da Tele Norte Leste, em julho de 1998, para produzir o estupendo fracasso atual da Oi. Conluios para a formação dos consórcios na disputa, para maximizar preços via concorrência, falharam nesse caso. As 16 operadoras de telefonia fixa da Telebrás foram arrematadas por R$ 3,4 bilhões, com ágio ínfimo de 1%, por um grupo no qual não figurava nenhuma operadora, apenas novatos e investidores, como Andrade Gutierrez, La Fonte, do empresário Carlos Jereissati e GP Investimentos. O grosso da compra foi bancada por dinheiro público, mas o comando da tele, batizada de "telegangue" pelo então ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros, foi entregue a acionistas privados, eles também financiados pelo BNDES.

BNDES e cinco grandes fundos de pensão reunidos na Fiago detinham 45% do capital total da nova empresa. AG, La Fonte e GP Investimentos, Inepar e o fundo de pensão dos funcionários possuiam o restante. Enquanto o banco e os fundos entraram com quase metade do capital, acionistas privados no comando, como AG e La Fonte receberam empréstimos do BNDES para pagar as parcelas da compra. O banco colocou 20% do capital em financiamentos para isso, ou R$ 686,8 milhões. Do caixa privado, diretamente, pouco dinheiro foi colocado na transação.

A privatização tardia colocou desafios empresariais difíceis de resolver, e todos eles passavam por muito capital e tecnologia. A explosão da telefonia celular tornou rapidamente obsoleta a telefonia fixa, cuja carência, no entanto, precisava ser atendida a um custo crescente, coberto por dívidas. Na ponta mais lucrativa do negócio, a Oi avançou menos que seus concorrentes e terminou com a menor participação do mercado, 18,6%, enquanto que a rentabilidade das linhas fixas continuou declinante. As exigências de universalização da telefonia fixa tornou-se um peso adicional em uma equação ruim.

Até que em 2008, no segundo governo de Luiz Inácio Lula da Silva, sob inspiração da intervenção estatal para formar grandes grupos, as "campeãs nacionais", surgiu a ideia de se criar uma multinacional verde-amarela. A lei foi mudada pelo presidente para possibilitar a fusão da Telemar com a Brasil Telecom. A nova empresa passou a dominar a telefonia fixa nacional, com exceção do Estado de São Paulo, em mãos da Telefonica. A Oi carregou então mais linhas fixas, consumiu caixa e viu sua dívida subir de R$ 12 bilhões para R$ 21 bilhões. A fusão teve padrão bizarro: não foram feitas diligências, o que rendeu ao adquirente pagamento de R$ 5 bilhões em pendências judiciais.

Em um ambiente de forte competição, veio a crise de 2008 e, depois, em 2013, um episódio fatal para a Oi, a calamitosa fusão com a Portugal Telecom (PT). A ideia da "multi verde amarela" resultou na entrega da direção executiva aos portugueses, maiores acionistas de uma companhia agora de capital pulverizado. Eles entraram com ativos, pouco dinheiro e muitas dívidas. Algum tempo depois, descobriu-se que o Banco Espírito Santo, principal acionista da PT, deu calote em títulos de € 900 milhões já em posse da Oi. A peripécia rendeu numerosas suspeitas de intermediação política lucrativa por políticos brasileiros, portugueses e empreiteiras, investigadas nos dois lados do Atlântico, e um espetacular aumento de R$ 30 bilhões no endividamento da tele.

Atolada em dívidas, diante da maior recessão em quase um século, queda de vendas mesmo no lucrativo mercado da telefonia celular, a Oi perdeu a capacidade de fazer investimentos necessários. Sem que o Estado e a interferência política jamais a deixassem, e com erro de estratégia de empresários privados, a Oi naufragou aos 18 anos de vida.

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