sexta-feira, 15 de julho de 2016

Corra, Rodrigo, corra - César Felício

• O novo presidente da Câmara assume com uma base frágil

- Valor Econômico

A vitória de Rodrigo Maia (DEM-RJ) na corrida pela presidência pela Câmara dos Deputados assinala o fim do Centrão e o declínio definitivo da influência na casa do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), afastado do mandato desde maio por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

Em seu curto mandato de pouco mais de seis meses, Maia deverá ser um presidente da Câmara alinhado com o Planalto, em uma perspectiva de negociação partidária, e não de varejo. Maia foi presidente de seu partido, historicamente alinhado com o PSDB, e sob esta perspectiva deve se comportar diante de Temer. O baixo clero, ao menos temporariamente, desce do altar.


A chamada "velha oposição", composta por DEM, PSDB, PPS e PSB, demandava desde a articulação do impeachment um aumento de seu espaço institucional, estabelecendo um contrapeso à hegemonia pemedebista no Senado. Conseguiu, na esteira da implosão do pântano organizado por Cunha e com o discreto apoio do PT, cuja prioridade era neutralizar o presidente afastado.

A organicidade de Maia é uma boa notícia para Temer. O DEM tem um compromisso ideológico com uma política de ajuste fiscal e desmonte do Estado. Temer terá na presidência da Câmara um dirigente disposto a trabalhar por estas causas por um preço muito menor do que o que seria cobrado pelo Centrão.

O problema para o Planalto são as circunstâncias em que se deu a eleição do novo presidente da Câmara. Maia conseguiu 120 votos no primeiro turno, uma marca que o deixaria apenas em terceiro lugar, na eleição para a presidência da Câmara em 2015, vencida por Cunha.

Teve ainda 45 votos a menos que Júlio Delgado (PSB-MG) em 2013, quando este foi derrotado por Henrique Eduardo Alves, do PMDB. Nunca, na história da Câmara dos Deputados, houve um presidente tão minoritário. Para se encontrar algo semelhante, há que se recuar até 2005, quando Severino Cavalcante teve 124 votos no primeiro turno.

Rodrigo Maia está assim longe do perfil de liderança que teve Eduardo Cunha, Aécio Neves, Aldo Rebelo, Arlindo Chinaglia, Marco Maia, Michel Temer, João Paulo Cunha, Luiz Eduardo Magalhães, Inocêncio Oliveira, Ibsen Pinheiro, Paes de Andrade e Ulysses Guimarães, para citar 12 de seus antecessores.

Trata-se de um presidente da Câmara frágil, a quem cabe cumprir uma agenda emergencial do governo e organizar a sucessão que vale na Câmara, a da Mesa Diretora que será eleita em fevereiro e que dirá quem é o verdadeiro herdeiro do espólio cunhista. Ele não recebeu um mandato de seus eleitores da noite de terça para dar a direção deste debate.

O deputado do DEM triunfou em uma aliança circunstancial com a esquerda, com o endosso do Palácio do Planalto, apenas para remover um cadáver da sala. É algo diferente do que aconteceu em 1997. Naquele ano, Fernando Henrique Cardoso entrou com tudo na eleição para a presidência da Câmara, porque sabia que sua agenda de reformas dependia da eleição de Michel Temer para a presidência da Câmara. Os adversários do pemedebista eram a negação desta agenda e tendiam a se unir no segundo turno. Temer levou a presidência na primeira votação por apenas um voto de diferença.

No caso de Maia, seus apoiadores divergem em relação ao futuro. Sua vitória beneficia de modo mais claro o PSDB, que resguardou seu líder Antonio Imbassahy para a disputa do próximo ano.

Para Temer, evitou-se a eleição de um adversário, como seria o pemedebista Marcelo de Castro. Temer evitou perdas, mas em relação à articulação política tudo ainda está por ser feito.

O Planalto vende aos agentes do mercado uma mercadoria dificílima de entregar, que é a da promulgação ainda este ano da emenda constitucional que limita o gasto público.

A proposta, alma da estratégia econômica do governo, está no primeiro degrau de tramitação na Câmara. O Congresso terá a partir de hoje 15 dias de recesso branco. Maia afirmou que espera votar a proposta no plenário até o fim do ano, mas o tema ainda não saiu da Comissão de Constituição e Justiça. Quando sair, em meados de agosto, serão no mínimo 11 sessões na Comissão Especial. O país entra em ritmo eleitoral e Maia promete um esforço concentrado, com dois dias de sessão por semana. Aprovada na Comissão, a emenda é votada em dois turnos no plenário, com intervalo de cinco sessões e todo tipo de obstrução possível.

Concluído toda a tramitação na Câmara, chega a vez do Senado e, muito provavelmente, do ano de 2017. "Dá para concluir este ano entre os deputados e só isso será um feito. Não se pode pensar que no Congresso tudo é possível e assim criar derrotas que não existem", disse Antonio Queiroz, diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), profundo conhecedor do Congresso.

Já houve precedente do Senado aprovar emenda constitucional em 14 dias, mas esta prática não se tornou um hábito. O recorde foi registrado em 2006, quando votaram a toque de caixa a Emenda 51, que facilitou a contratação de agentes comunitários de saúde, tema bem mais fácil de se obter consenso do que a emenda de Meirelles.

Para a oposição, o que importava era matar o matador. Sem Cunha no cenário, sai de cena uma agenda conservadora muito cara ao Centrão, mas de escasso interesse para o PSDB e DEM. Somente Cunha foi capaz de colocar na pauta temas como a redução da maioridade penal, a restrição ao aborto legal, a criminalização de movimentos sociais O PT sabe que as perspectivas de criar obstáculos para a emenda constitucional que limita gastos públicos ou a futura reforma da Previdência são mínimas, mas na eleição de 2017 o poder de barganha cresce.

"As esquerdas no segundo turno tiveram que escolher entre um candidato que fará tudo para aprovar ao ajuste fiscal ainda este ano, mas sem compromisso com uma agenda de costumes; e outro que é o inverso. Escolheram enterrar a agenda conservadora", opinou Queiroz.

Entre os 13 contendores, só houve um claro perdedor. O declínio de Cunha começou a ser traçado quando Waldir Maranhão (PP-MA) se afastou de seu comando. A divisão do Centrão ontem mostrou que Cunha não organizou sua sucessão. Cabe agora a Rodrigo Maia e a Temer saber lidar com a fera acuada.

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