quarta-feira, 13 de julho de 2016

Os juros escorchantes - Celso Ming

• Os juros altos no Brasil são o resultado de uma economia carente de capitais e viciada em inflação e em indexação

- O Estado de S. Paulo

É compreensível que empresários, analistas e consumidores reclamem dos juros excessivamente altos no Brasil. Mas isso não justifica a derrubada na marra dessa forte pressão arterial, independentemente do estado de saúde geral da economia.

Nesse quesito o País também está na contramão. O momento é de abundância nunca vista de recursos ao redor do mundo, situação que derrubou o preço do dinheiro (juros) no mercado internacional a níveis também nunca vistos. Os grandes bancos centrais operam a juros negativos. Enquanto isso, o Brasil continua ostentando juros básicos (Selic) de 14,25% ao ano. E se formos conferir os praticados no crédito, teremos impressionantes anomalias: 26,2% ao ano no capital de giro das empresas; 53,9% nos empréstimos pessoais; 311,3% nos cheques especiais; e 471,3% na parcela devedora do cartão de crédito.


Há um punhado de explicações para essa distorção que não cabe aqui revisitar. São avaliações exaustivas e provavelmente insuficientes para contar toda a história. No entanto, o que não se pode é tentar resolver o problema com o diagnóstico errado.

A esquerda míope atribui os juros altos demais no Brasil a variações de uma teoria conspiratória. Para ela, o País divide-se entre os que vivem de renda (rentistas), que não passaria de uma forma de apropriação de mais-valia, e o resto da população, que sustenta essa gente. Outra vertente da mesma teoria é a de que o juro escorchante é jogo dos banqueiros, que operam em oligopólio, cobram o que querem, sempre acabam influenciando a nomeação dos dirigentes do Banco Central e, nessas condições, impõem seu jogo, como se os banqueiros daqui fossem mais gananciosos e mais perversos do que os do resto do mundo, onde prevalecem juros negativos, como ficou dito.

Os juros altos no Brasil são o resultado de uma economia carente de capitais e viciada em inflação e em indexação (correção automática de preços e valores pela inflação passada). Por si sós produzem novas deformações, como a baixa disposição ao investimento e a má alocação de recursos. Nesse sentido, o “rentismo” é também consequência, e não causa do problema.

A tentativa de derrubar os juros na marra foi tentada em 2011 pela presidente Dilma e foi o fiasco retumbante conhecido, que produziu consumo excessivo, mais inflação, recessão e desemprego. O próprio governo tratou de reverter seu erro e permitiu que o Banco Central passasse a operar com juros reais positivos - e chegamos assim aos 14,25% ao ano, também no governo Dilma.

A esquerda infantil deveria ter aprendido que não é assim que se lida com essas anomalias. O primeiro passo, inevitável, é garantir equilíbrio fiscal para que despesas excessivas do governo não provoquem aumento desproporcional do consumo e, por aí, também inflação. O segundo passo é continuar a trabalhar com dinheiro curto para ajudar a derrubar a inflação. Quando os principais fundamentos da economia estiverem outra vez nos trilhos, os juros, aí sim, poderão cair para onde tiverem de cair.

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