segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Juntos para sempre - Ricardo Noblat

- O Globo

“Todo político pilhado na corrupção diz que é perseguido político”. Modesto Carvalhosa, jurista

O que restará da imagem de Lula esculpida com esmero ao longo dos últimos 30 anos por artesãos voluntários, no início, e depois por artistas pagos a preço de ouro e dotados do talento de transformar o feio em bonito? Sobreviverá aos graves danos que lhe reserva o desfecho próximo da Lava-Jato? Ou tombará como em Moscou tombou uma estátua de Lenin às primícias da dissolução da União Soviética?

O LENIN DE Moscou cedeu à fúria de manifestantes, assim como a gigantesca estátua do ditador iraquiano Sadam Hussein que enfeava uma praça no centro de Bagdá. Há pouco mais de quatro meses, na Ucrânia, um Lenin de 20 metros de altura que resistira, ali, à demolição de mais de mil réplicas suas, foi finalmente removido durante celebração transmitida ao vivo pelo YouTube.

QUANTO A Lula... O político que mais se destacou na história recente do país parece ter perdido em definitivo a chance de um dia ser imortalizado em bronze ou em pedra como foi padre Cícero, cuja estátua de 27 metros de altura atrai levas de romeiros a Juazeiro do Norte, Ceará. Embora cultuado no Nordeste, Lula já não controla o seu próprio destino. A Justiça é quem controla. NA SEMANA passada, pela primeira vez, Lula virou réu em um processo no qual é acusado de ter tentado obstruir a Justiça ao conspirar com o ex-senador Delcídio do Amaral (PT-MS) para impedir a delação de Nestor Cerveró, ex-diretor da Petrobras. Na denúncia feita pela Procuradoria Geral da República, ele é apresentado como a peça principal de uma organização criminosa.

ALVO ATÉ agora de seis investigações, Lula deverá em breve ser denunciado por ocultação de patrimônio e lavagem de dinheiro. A Lava-Jato reuniu indícios e provas de que ele é dono do apartamento da praia do Guarujá e do sítio de Atibaia, em São Paulo, reformados de graça pelas empreiteiras OAS e Odebrecht — ambas envolvidas na roubalheira da Petrobras. Há mais coisas por vir.

BASTA QUE Lula seja condenado por um juiz de primeira instância como Sérgio Moro, por exemplo, e em seguida por um tribunal de segundo instância, para que se torne um ficha-suja. Como tal, ficará impedido de disputar qualquer eleição à espera do julgamento em última instância. Seria o trágico fim da carreira política do primeiro operário a chegar por aqui à Presidência da República.

QUEDA vertiginosa, essa que Lula vive. Há dois anos, líderes de quase todos os partidos e donos de grandes fortunas o pressionavam para que se lançasse candidato no lugar de Dilma. Seria a volta triunfal do pai dos pobres e da mãe dos ricos. Sabia-se de sobra por que os pobres queriam o seu retorno. Somente agora, sabe-se por que tantos ricos também queriam.

FALTOU coragem a Lula para peitar Dilma. Sobrou atrevimento a Dilma para confrontar seu criador e arrastá-lo escada abaixo. Lula culpa Dilma por sua desgraça. Dilma culpa Lula por ter lhe deixado uma herança de corrupção. Cada um fala mal do outro pelas costas. Querem se ver logo pelas costas. E, no futuro, nem pelas costas querem mais se ver. Até nunca!

NÃO IMPORTA. São inseparáveis. Foram cúmplices em tudo o que fizeram para o bem e para o mal. O carismático ex-líder operário pode ser preso a qualquer momento, a não ser que fuja para o exterior. A executiva portadora de falso conhecimento econômico está às vésperas de ser deposta. À espera dela, processos e mais processos. E — quem sabe? — cadeia.

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