sexta-feira, 9 de setembro de 2016

Contagem regressiva - Rogério Furquim Werneck

- O Globo

• Logo após o impeachment, Temer já parecia propenso a ceder às pressões e deixar o anúncio da reforma para depois das eleições

Com o desfecho do impeachment, começa a se abrir ao governo Temer a janela de oportunidade com que contava para aprovar no Congresso medidas que tornem crível uma mudança paulatina do regime fiscal. Sem que tal mudança possa ser vislumbrada, não haverá como tirar a economia do atoleiro em que se encontra. Para que tenha sucesso nesse desafio, Temer não poderá alimentar ilusões sobre quão exíguo é o tempo com que efetivamente conta e quão graves serão as consequências se, aos poucos, ficar claro que ele não terá condições de aprovar as medidas que contempla.

É preciso ter em mente que a janela de oportunidade promete ser bem mais curta do que os 28 meses de mandato que o presidente ainda tem pela frente. Sem ir mais longe, basta perceber que, com a mobilização dos parlamentares com as eleições municipais, o Congresso entrou em “recesso branco”. E que a perspectiva de disputa em segundo turno em boa parte das maiores cidades do país sugere que tal mobilização pode se estender até o fim de outubro. Só então, estará de fato aberta a janela com que contará o Planalto para aprovar as medidas requeridas. Mas não por muito tempo. Serão 12 meses ou pouco mais.

Já em outubro de 2017 essa janela começará a se fechar. O encerramento do prazo legal de filiação partidária deflagrará o início da fragmentação da nova base aliada, com o reposicionamento das forças políticas que hoje a compõem, para a disputa das eleições de 2018. Poucos meses depois, com a plena mobilização do Congresso com a campanha eleitoral, a janela estará definitivamente fechada.

Por exíguo que seja o tempo com que de fato conta, o governo não parecia estar com muita pressa. Há algumas semanas havia anunciado que, em meados de setembro, divulgaria sua proposta de reforma previdenciária. Mas, há poucos dias, logo após o impeachment, Temer já parecia propenso a ceder às pressões de parte da base aliada e deixar o anúncio da reforma para depois das eleições municipais.

No início desta semana, contudo, o Planalto voltou atrás. E decidiu que, sim, a proposta de reforma previdenciária deverá ser anunciada até o fim de setembro. Convenceu-se de que, mesmo com o Congresso em “recesso branco”, é importante que o país conheça desde já o exato teor da proposta de reforma contemplada pelo governo. Tratando-se de matéria tão controvertida, é crucial que sua discussão na sociedade seja desencadeada tão logo quanto possível, para que a construção do apoio parlamentar possa se beneficiar desse debate prévio mais amplo.

A preocupação do Planalto terá de ser não só com o tempo exíguo de que dispõe. Mas também com o processo de desestabilização que terá de enfrentar, se não tiver condições de aprovar medidas concretas que permitam vislumbrar que o crescimento explosivo do endividamento público poderá ser sustado em prazo razoável.

Ainda como presidente interino, Michel Temer teve o bom senso de nomear uma equipe econômica de excelente nível, condizente com os enormes desafios que seu governo terá de enfrentar. Graças à nomeação dessa equipe e da mudança de discurso econômico que se seguiu, Temer ampliou em grande medida o prazo de carência inicial com que contava, conquistando precioso bônus de credibilidade, que lhe vem ajudando a manter sob relativo controle o processo de desestabilização que a gravidade da crise fiscal poderia deflagrar.

Será um grave erro, contudo, se Temer ficar tentado a acreditar que a simples excelência da equipe econômica será suficiente para manter esse processo de desestabilização ao largo. E que a equipe é o salvo-conduto que lhe basta para uma travessia segura até o fim do mandato.

O presidente precisa ter em mente que, finda sua interinidade, foi disparada uma contagem regressiva do prazo com que conta para que seu esforço de mudança de regime fiscal se traduza em resultados convincentes. E que a demora em apresentar tais resultados implicará inexorável aceleração dessa contagem regressiva.

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Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio

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