domingo, 4 de setembro de 2016

Entrevista – Aécio Neves; ‘Sem o apoio do PSDB, não existirá governo Temer’

• Presidente do PSDB cobra uma ação de Michel Temer sobre o PMDB para acabar com as ambiguidades e abandonar os “vícios” adquiridos na convivência com o PT. Aécio diz que tucanos apoiarão o governo enquanto ele for fiel à agenda do ajuste e afirma: “Sem apoio do PSDB, não existirá governo Temer”. Para Aécio, em 30 dias, nimguém mais falará da ex-presidente Dilma

Presidente do PSDB, o senador Aécio Neves afirmou à repórter JÚNIA GAMA que o apoio dos tucanos ao governo Temer depende do cumprimento da agenda de ajustes e reformas. “Se percebermos que isto não está ocorrendo, o PSDB deixa de ter compromisso com este governo”, disse. Aécio quer que o presidente aja para acabar com o que considera “vícios” que o PMDB adquiriu na “convivência com o PT”. “Temer tem que ter uma DR (discutir a relação) com o PMDB.” A desconfiança dos tucanos cresceu após senadores da sigla aliada apoiarem o fatiamento da pena da ex-presidente Dilma.

Júnia Gama – O Globo

• A enquadrada de Temer após a posse foi direcionada ao PSDB?
O recado foi claro para aqueles que, dentro da base, em especial no PMDB, não demonstram compromisso com as reformas. O PSDB tem ecoado com muito mais clareza as posições do presidente Temer do que o seu próprio partido. Sem o PMDB agindo de forma coesa, as dificuldades de Temer serão quase intransponíveis. Esse último episódio (fatiamento da pena de Dilma Rousseff ) demonstrou, mais uma vez, a ambiguidade com que o PMDB atua.


• É o PMDB que vai definir o sucesso ou o fracasso do governo?
A fragilidade das posições do PMDB será o argumento para que outras forças políticas não se exponham na defesa das reformas. O PSDB tem compromisso com essa agenda não é de hoje. Defendi isto nas eleições. É fundamental que o PMDB se desapegue dos vícios que adquiriu na convivência com o PT, do costume de se proteger nesse discurso populista do PT que levou o país à situação em que estamos. Tenho certeza que Temer se sente muito mais confortável com as posições do PSDB do que com a ambiguidade e a falta de clareza do PMDB.

• Mas o governo também tem sido ambíguo, por exemplo, quanto ao teto salarial.
O que é um mau sinal. Nossa posição é de responsabilidade, no que diz respeito a todo aumento salarial, no momento em que sinais devem ser dados na direção da contenção dos gastos públicos. Da mesma forma, fomos contra a flexibilização das negociações da dívida dos estados. Era uma oportunidade extraordinária que se perdeu.

• Qual o limite de apoio do PSDB ao governo Temer?
O PSDB estará em 2018 se apresentando para governar o país. Enquanto Temer se mantiver fiel a essa agenda que colocamos para o país, contará com o PSDB. Se percebermos que isto não está ocorrendo, o PSDB deixa de ter compromisso com este governo. Não é uma ameaça, apenas uma constatação natural.

• Peemedebistas dizem que o PSDB não tem alternativa a não ser apoiar Temer até 2018...
Sem o apoio do PSDB, não existirá governo Temer. O PSDB não pretende sair da base, sabe que o seu papel é imprescindível. Se o PSDB sair, quem perde é o governo. As cobranças do PSDB incomodam setores do PMDB? Talvez aqueles que tenham receio de enfrentar as reformas. Mas o núcleo mais próximo ao presidente tem reafirmado o compromisso com esta agenda.

• O senhor vê no governo a disposição de implementar reformas?
Vejo isto no presidente, mas não consigo enxergar na totalidade do PMDB. Temer tem que ter uma “DR” com o PMDB. Se não começar com seu partido, uma senha estará sendo dada para que essas reformas não se viabilizem. Da mesma forma que Renan Calheiros deu uma senha ao encaminhar a votação (do fatiamento da pena de Dilma Rousseff ), de forma inoportuna, para que o PMDB tivesse uma posição equivocada e de afronta à Constituição.

• Foi aberta uma brecha perigosa, especialmente para Eduardo Cunha?
Acho que sim. E não há como inibir especulações sobre a quem interessava isto. O que não foi correto é o PMDB, através da maioria dos seus senadores, tomar uma decisão sem conversar com o PSDB. Isto deixa uma marca nesta relação, que precisará ser superada. Gerou um desconforto enorme no PSDB.

• Lewandowski (presidente do STF) errou ao aceitar o fatiamento da pena?
A decisão não foi correta. Não acredito que ele tenha uma intenção subalterna ao tomar essa decisão, mas abriu um precedente extremamente grave. O que nós assistimos foi o regimento do Senado se impondo sobre a Constituição. Algo que me parece esdrúxulo.

• Preocupa Dilma poder disputar eleição?
Não faz a menor diferença para o Brasil. Esta é uma página virada. A questão não se atém a se Dilma quer disputar eleição, até porque acredito que isto não está nos planos dela. Mas uma decisão desta gera especulação como a busca de foro privilegiado para estar fora das garras da Justiça de primeira instância.

• O discurso do golpe beneficia Dilma e o PT?
Com todo respeito que merece a presidente, acho que em 30 dias ninguém vai estar falando nela. A cada êxito do governo Temer, esse discurso vai desaparecendo.

• Houve acordo entre PT, PMDB e Lewandowski sobre o fatiamento?
Essas ilações surgiram e muitas outras envolvendo a votação do teto salarial. O tempo dirá quem efetivamente se beneficia com esta decisão.

• O senhor ainda crê que a melhor solução seriam novas eleições?
Talvez para o PSDB fosse o mais adequado. Mas para a democracia, não, porque não há previsão constitucional. Ficou claro para nós que esta decisão não ocorreria em tempo hábil. Se o TSE, amanhã, definir novas eleições, é uma saída constitucional. Mas este é o único caminho.

• E o processo no TSE de cassação da chapa presidencial?
Se alguém tem preocupação de Dilma ter os direitos políticos preservados, pode aguardar que o TSE resolverá este problema.

• O presidente Temer também é réu nesta ação...
Caberá ao TSE avaliar se Temer teve responsabilidade nisso ou não.

• O senhor acredita que as responsabilidades devem ser separadas?
Não sei fazer esta avaliação. Há pessoas que avaliam que ele não tem essa responsabilidade. Alguns diziam que os efeitos cessariam no momento do afastamento da presidente.

• A Lava-Jato afetará o governo?
Temos que deixar que a Lava-Jato continue. Não existe motivação para cerceá-la. Sempre que isso ocorreu, resultou no fortalecimento da operação. Temer tem que governar e deixar que a Justiça faça sua parte.

• E no seu caso?
São coisas tão absurdas e impossíveis de serem comprovadas que tudo isso será muito positivo. Vamos sair disso muito mais fortes. Tenho zero temor. Não apenas eu, mas vários outros também indevidamente citados. Uma coisa é um escândalo de corrupção que tomou conta do país, capitaneado pelo PT. As empresas dizerem que ajudaram A, B ou C em suas campanhas eleitorais é natural, é outra coisa.

• Em que medida a Lava-Jato pautará 2018?
Todos os grandes nomes do PSDB estarão fortes em 2018 porque passarão incólumes por isso. A questão é política, mais abrangente. De que forma a política e os partidos tradicionais chegarão em 2018? O grande desafio do governo Temer é demonstrar que ainda é possível encontrar na política soluções para o país, porque o discurso da negação absoluta da política não é adequado.

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