quinta-feira, 1 de setembro de 2016

'Golpista' é quem está contra a Constituição, diz Temer após posse

Por Claudia Safatle, Bruno Peres e Andrea Jubé - Valor Econômico

BRASÍLIA - Consagrado presidente da República para os próximos dois anos e quatro meses, Michel Temer, logo após a posse, fez uma rápida reunião ministerial e mudou o tom em relação às acusações de sua antecessora: "Vamos contestar a partir de agora essa coisa de golpista; golpista é você que está contra a Constituição", disse. Horas antes, a ex-presidente Dilma Rousseff, em um duro discurso de saída, insistiu na tese do golpe: "Apropriam-se do poder por meio de um golpe de Estado", afirmou. Ela advertiu que fará "a mais firme, incansável e enérgica oposição que um governo golpista pode sofrer".

Na abertura da reunião ministerial, Temer disse que o governo, agora, entra em "uma nova fase", em que a "cobrança será maior". Durante a interinidade, sempre surgia "uma certa preocupação, até onde podemos ir, até onde devemos ir", ponderou o presidente.


Ele reafirmou o compromisso com a reforma fiscal, com a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241, que estabelece um teto para a despesa pública para os próximos 20 anos. "Desde 1991 o gasto cresce acima do crescimento do Produto Nacional Bruto", sublinhou o ministro chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, para mostrar que essa é uma trajetória que se esgotou.

Temer disse tanto na reunião ministerial quanto no pronunciamento levado ao ar em rede de TV, ontem à noite, que fará, também, as reformas da previdência e do mercado de trabalho. Anunciou que enviará a primeira ao Congresso ainda em setembro, mas será desaconselhado por seus ministros da área política, que recebem pressões dos candidatos à prefeito nas eleições de outubro. Os líderes da base aliada estão pedindo para que as mudanças na previdência social sejam enviadas ao Congresso só após as eleições.

A reforma trabalhista se chamará "Programa de Garantia e Geração de empregos", segundo explicou Padilha. Embora já tenham sido realizadas mais de dez reuniões com lideranças sindicais, o governo não vai esperar a anuência das centrais para encaminhar a flexibilização do mercado de trabalho, explicou o ministro da Casa Civil.

Esta reforma vai se centrar na autorização para que acordos entre patrões e empregados possam se sobrepor às normas da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), desde que não venham a ferir direitos adquiridos. Tratará, também, da terceirização, que o governo pretende chamar de "especialização". O projeto de terceirização só depende de votação no Senado para virar lei.

A preocupação central do governo, disse o presidente, é com os 12 milhões de desempregados. Segundo dados divulgados pelo IBGE na segunda feira, a taxa de desocupação atingiu 11,6%, com 11,8 milhões de trabalhadores sem emprego. "É uma cifra assustadora! Não há coisa mais indigna que o desemprego. Ele fere o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Gerar emprego é o primeiro tema das nossas preocupações administrativas, esse amargor que vemos nas ruas é pelo desemprego", falou aos seus ministros e, logo em seguida, embarcou para a primeira viagem internacional como presidente efetivo.

Temer participará da reunião do G-20, o grupo de países desenvolvidos e em desenvolvimento, que ocorrerá na cidade de Hangzhou.

Temer determinou aos ministros preguem, junto aos seus partidos, a necessidade das reformas que o Brasil precisa. "Vamos esclarecer a população que não queremos uma coisa de cima pra baixo, queremos a compreensão da sociedade brasileira", advogou.

Em pronunciamento à nação o presidente disse ter consciência "do tamanho e do peso da responsabilidade carregada nos ombros, porque recebeu o país mergulhado em grave crise econômica". Encerrado o processo de impeachment de Dilma Rousseff, ele acredita que chega ao fim também a crise de confiança que levou empresários a adiarem novos investimentos. "O momento é de esperança e de retomada da confiança no Brasil. A incerteza chegou ao fim. É hora de unir o país e colocar os interesses nacionais acima dos interesses de grupos. esta é a nossa bandeira", disse Temer.

Em um discurso de cinco minutos, ele apontou como "alicerces" de seu governo: eficiência administrativa, retomada do crescimento econômico, geração de emprego, segurança jurídica, ampliação dos programas sociais e a pacificação do país. Ao fazer uma analogia à gestão financeira no ambiente familiar, Temer destacou ter adotado como uma de suas primeira providências, ainda na interinidade do cargo, um limite para o gasto público, redução de ministérios e fim de milhares de cargos de confiança na administração pública federal.

"Nosso lema é gastar apenas o dinheiro que se arrecada", disse Temer. "O Estado brasileiro precisa ser ágil. Precisa apoiar o trabalhador, o empreendedor e o produtor rural. Temos de adotar medidas que melhorem a qualidade dos serviços públicos e agilizem sua estrutura", acrescentou o presidente.

O presidente Michel Temer acompanhou a votação final do processo de impeachment ao lado de seus ministros mais próximos no Palácio do Jaburu, residência oficial.

Enquanto aguardavam o desfecho do processo, Temer e seus ministros cumprimentaram o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, pelos 71 anos celebrados ontem.

No Congresso Nacional, Temer foi recepcionado por aliados e apoiadores em sua chegada para a solenidade de posse. Alguns deputados ensaiaram um coro com vivas à base aliada, ao presidente e ao país.

Os retratos oficiais da ex-presidente Dilma Rousseff já começaram a ser retirados das dependências do Palácio do Planalto. A foto oficial de Temer, com a faixa presidencial, entretanto, só será confeccionada após seu retorno ao Brasil. Ainda com o propósito de indicar "um novo tempo" para o país, Temer reafirmou o discurso adotado desde antes de ser alçado ao posto, de necessidade de união nacional.

O presidente fez uma transmissão simbólica do cargo ao presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), antes de viajar. Em entrevista ao Valor na última semana, o presidente da Câmara disse que vinha se preparando para a missão com leituras sobre a atuação de Marco Maciel - do PFL, que originou o atual DEM - como vice-presidente de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) em suas duas gestões (1995-2002). Ao lembrar que Marco Maciel, uma das figuras históricas do DEM, sempre foi considerado o "vice ideal" em função de sua discrição para o posto, o deputado afirmou que se trata de uma homenagem ao correligionário, que, aos 76 anos, está afastado da vida pública em função de seu estado de saúde.

Para o presidente Michel Temer, a sociedade espera da sua gestão que " façamos o que temos alardeado, ou seja, colocar o Brasil nos trilhos". E, ao fim de dois anos e quatro meses de governo, adiantou que espera poder sair "com o aplauso do povo brasileiro".

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