quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Câmara conclui votação, e teto de gastos vai ao Senado

• Proposta do governo é aprovada em segundo turno por ampla maioria

Planalto já se articula para garantir aval dos senadores

O projeto que fixa um teto para despesas públicas foi aprovado em segundo turno na Câmara por ampla maioria: 359 votos a favor. O governo se articula para garantir tramitação tranquila também no Senado, já em novembro. O presidente Temer jantou na segunda-feira com o presidente Renan Calheiros, que ontem disse esperar que a crise do Senado com o STF e o ministro da Justiça por causa da LavaJato “não atrapalhe” o calendário das reformas.

Aval para teto de gastos

• Câmara aprova texto por 359 votos a favor e 116 contra. Governo articula apoio de senadores

Martha Beck, Júnia Gama, Isabel Braga e Catarina Alencastro - O Globo

-BRASÍLIA- O plenário da Câmara dos Deputados aprovou ontem com folga, em segundo turno, o texto-base da proposta de emenda constitucional (PEC) que fixa um teto para os gastos públicos. O placar foi de 359 votos a favor e 116 contra, com duas abstenções. Diante do resultado, que teve margem um pouco menor que a do primeiro turno — quando foram registrados 366 votos favoráveis e 111 contrários, além de duas abstenções —, o governo já articula sua estratégia para que o projeto avance no Senado. O maior entrave está na disputa política entre o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o ministro da Justiça, Alexandre Moraes, por causa da Operação Métis, que resultou na prisão de quatro policiais no Senado.

A reação de Renan — que criticou a ação e bateu boca publicamente com a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia — preocupou o Palácio do Planalto, onde a postura do peemedebista foi vista como sinal de que ele pode causar dificuldades na tramitação da PEC. Após a aprovação do texto-base ontem, a votação das emendas estava prevista para entrar pela madrugada.

GOVERNO DIZ QUE HÁ ‘CONSENSO SÓLIDO’
O presidente Michel Temer comemorou o resultado da votação. Por meio de seu porta-voz, ele disse que a vitória mostra “consenso sólido” sobre os rumos que o governo deve tomar. A PEC do teto de gastos é considerada a base do ajuste fiscal. Nas conversas com deputados, Temer frisou que as áreas de saúde e educação serão preservadas pela PEC e pelo governo.

— Os votos obtidos refletem, não apenas o convencimento em torno de uma iniciativa, que todos sabemos que é essencial para a reconstrução da economia brasileira, mas também indica a existência de um consenso sólido em torno do rumo a seguir. Mostra-se assim reforçada a convicção da nossa sociedade com o imperativo de manter a responsabilidade com as contas públicas — disse Temer por meio do porta-voz, Alexandre Parola.

Segundo a base aliada, a diferença foi pequena nas duas votações na Câmara e não preocupa.
— Tinha gente que estava viajando e gente que está em campanha. Além disso, alguns parlamentares sofreram pressões de suas bases — disse o líder do PSD, deputado Rogério Rosso (DF).

Parte da operação de guerra para proteger a agenda econômica do governo incluiu um jantar na segunda-feira de Temer com Renan e o presidente do PMDB, senador Romero Jucá (RR) para acalmar os ânimos. Ontem, Jucá foi pessoalmente conversar com o ministro da Justiça, enquanto o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, tentou mostrar que o assunto já estava superado. Segundo Padilha, o cronograma de votação no Senado deve ser o proposto por Renan. Ele prevê a apreciação em primeiro turno no dia 29 de novembro e, em segundo turno, no dia 13 de dezembro.

— O presidente está trabalhando para não ser criada uma crise artificial que possa atrapalhar a relação do governo com o Congresso. O problema com o Renan está sendo contornado com muito diálogo e conversas — disse um interlocutor do presidente.

Temer marcou para hoje uma reunião com os presidentes dos três poderes a pedido de Renan, em mais uma tentativa de apaziguar os ânimos. Mas, como Cármen Lúcia se recusou a comparecer, o encontro foi desmarcado.

— Satisfeito, Renan não está. Esse gesto ajuda, mas Renan quer defender a instituição. Existem vários mecanismos para demonstrar insatisfação. Sabemos que PEC não é matéria fácil de se votar — resumiu um interlocutor do presidente do Senado.

Renan chegou a dizer que espera que as dificuldades não atrapalhem o calendário de votação:

— Já aprovamos o calendário de tramitação. Essa conversa de amanhã com os poderes (que acabou sendo cancelada) vai ajudar no sentido de manter o calendário. Temos muitas dificuldades no Brasil e não podemos deixá-las desbordar para uma crise institucional. Espero que as dificuldades não atrapalhem o calendário que nós já aprovamos inclusive com a oposição — disse ele.

O líder do PMDB, o senador Eunício Oliveira (CE) afirmou que a relatoria da PEC no Senado deve ficar com o partido, apesar de o PSDB ter demonstrado intenção de relatar a medida. E disse que, para agilizar sua aprovação, a emenda pode ficar até mesmo sob o comando do presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, José Maranhão (PMDB-PB). Outro candidato forte é Jucá.

Em outra frente, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e sua equipe se prepararam para continuar a peregrinação em defesa da proposta. Nas últimas semanas, ele conversou com representantes do Judiciário, empresários e participou de conversas com parlamentares organizadas pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). O ministro tem argumentado que o teto vai restaurar a confiança dos investidores, empresários e consumidores na economia e trazer de volta o crescimento e a geração de empregos:

— Esperamos que, até o fim do próximo mês, seja aprovado no segundo turno no Senado. Acho isso fundamental, porque a economia brasileira tem dado mostras de recuperação da confiança. Em alguns setores, recentemente (há) alguma preocupação em relação à retomada da atividade, a consolidação disso, principalmente no setor industrial, agora, a aprovação da PEC sinaliza de fato a consolidação de uma rota — disse ontem.

A PEC cria um novo regime fiscal pelo prazo de 20 anos. Nesse período, os gastos primários só poderão crescer com base na inflação do ano anterior. O ministro da Fazenda tem argumentado que a estratégia adotada nos últimos anos pelo governo da ex-presidente Dilma Rousseff para tentar estimular a economia corroeu as contas públicas e fez os gastos e a dívida pública dispararem. Os gastos primários saltaram de 16,7% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2011 para 19,6% em 2015. Já a dívida bruta saltou de 51,3% para 66,5% do PIB no mesmo período. Em 2016, o valor já chega a 70,1% do PIB.

A sessão da Câmara foi marcada por bate-bocas entre o presidente da casa, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), e manifestantes que ocuparam as galerias. Após muita gritaria do grupo, contra a limitação de despesas com saúde e educação, Maia ordenou aos policiais legislativos que esvaziassem o local e chamou os manifestantes de mal-educados. Eles rebateram com gritos de “Fora Temer”.

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