quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Mercado vê queda de juros menor e mais lenta após ata do Copom

• Analistas acham que há pouca chance de o BC cortar Selic para 13,5%

Geralda Doca, Lucianne Carneiro e João Ssorima Neto - O Globo

-BRASÍLIA, RIO DE JANEIRO E SÃO PAULO - Com um tom tão cauteloso quanto o do comunicado da reunião da semana passada — que reduziu pela primeira vez a taxa de juros em quatro anos — a ata do Comitê de Política Monetária (Copom) divulgada ontem pelo Banco Central (BC) aumentou as apostas de um corte de 0,25 ponto percentual da taxa Selic na reunião de novembro, a última este ano, e indicou que não vê espaço grande para a redução dos juros.

O BC destacou que a trajetória vai depender da queda da inflação de serviços e da aprovação da proposta de emenda constitucional (PEC) teto para os gastos públicos. O BC aponta que o processo “tem natureza longa e incerta”, o que impõe riscos. Nas palavras da ata, “a convergência da inflação para a meta para 2017 e 2018 é compatível com uma flexibilização moderada e gradual das condições do mercado”. Na leitura dos analistas, vai haver um ciclo de afrouxamento monetário menor e mais lento do que o esperado.

LIMITES PARA REDUÇÃO DE JURO
O documento afirma que as projeções de inflação do mercado “sugerem haver limites para a magnitude da flexibilização”.

— A ata do Copom foi um balde de água fria tanto no ritmo quanto no corte total de juros esperados pelo mercado. O documento cita que o espaço é limitado e condiciona de maneira explícita a política monetária à política fiscal. A economia cai quase 10% em três anos, o BC teria pleno espaço para redução de juros sem risco de pressão de demanda — afirma o sócio-economista da MacroAgro Consultoria, Carlos Thadeu Gomes Filho.

Bradesco, Itaú Unibanco, ARX Investimentos, Infinity Asset e Modal Asset são alguns dos bancos e gestoras de recursos que apostam em um corte de 0,25 pontos percentuais na reunião do Copom de novembro, dos atuais 14% para 13,75%. A avaliação predominante é que aumenta a chance de redução moderada, mas os analistas não descartam corte maior.

— O BC quis deixar claro que não vê espaço tão grande para o afrouxamento monetário e apontou que está mirando em 2017 e 2018. Isso aponta para um corte de 0,25, mas é claro que pode mudar. A ata aumenta a chance de corte menor, mas não fecha portas para redução maior — diz a economista-chefe da ARX Investimentos, Solange Srour.

Ela alerta que essa postura mais dura do Banco Central permitirá queda mais forte nos preços de serviços — uma das preocupações apontadas no comunicado e na ata de ontem — mas, ao mesmo tempo, a atividade econômica deve demorar mais a reagir.

— O governo está fazendo um esforço enorme para o ajuste fiscal. Como a inflação já aponta para a meta, o BC poderia ajudar a economia com um corte de juros — avalia o sócio-gestor do Modal Asset, Luiz Eduardo Portella.

Segundo ele, o comunicado e a ata já fizeram as apostas do mercado para os cortes adicionais da taxa Selic recuarem de 350 pontos básicos para 300 pontos básicos. Ou seja, a taxa, atualmente em 14%, cairia para 11% e não 10,50% no fim de 2017.

Para o economista-chefe da Infinity Asset, Jason Vieira, o Copom está esperando a aprovação do teto dos gastos. Com isso, diz ele, o Banco Central poderia até mesmo abrir mão da cautela:

— Na hora que a PEC 241 (teto dos gastos públicos) for aprovada, o BC volta ao cenário anterior e pode até cortar 0,50 pontos percentuais. O que está claro é que os juros continuam caindo.

ECONOMISTA VÊ QUEDA MAIOR
O analista da corretora Gradual Investimentos, André Perfeito, concorda. Mas ele acredita em corte maior nos juros. Como a inflação continua em queda, inclusive no setor de serviços, o juro real está muito elevado, Perfeito acredita que na próxima reunião do Copom, em novembro, o corte na Selic será de 0,50:

— A tendência é que a inflação continue em queda. Há ociosidade de mão de obra. Qualquer ruído poderá levar o BC a rever a política.

Para o economista da Guide Investimentos, Ignacio Crespo, a ata confirma o conservadorismo do Banco Central em relação à redução dos juros:

— Há uma tendência de desinflação, mas o BC está mais conservador em relação ao que o mercado esperava.

O economista observa que pouco antes da reunião do Copom, o cenário foi mudando. A PEC do teto dos gastos foi aprovada em primeiro turno na Câmara, mostrando que os membros foram surpreendidos com a rapidez. O IPCA-15 caiu (ficou em 0,19%, menor taxa para o mês desde 2009).

— O cenário de um corte mais forte, de 0,75, que alguns até acreditavam, perdeu força com a ata divulgada hoje (ontem).

Para Crespo, a inflação de serviços ainda preocupa e o BC:

— A inflação de serviços tem se mantido alta por um longo período, e só nos últimos meses é que desacelerou. Até junho, vinha caindo e, nos últimos dois meses, estabilizou. Para o BC continuar cortando os juros, vai ser necessário que esse componente continue a desacelerar.

Para o ano que vem, a estimativa do mercado é que a inflação ainda fique acima da meta de 4,5%. O mercado, incluindo a Guide, também trabalha com o IPCA de 5% em 2017.

— No nosso cenário básico, a inflação só volta ao centro da meta em 2018.

Para 2017, o economista acredita que o governo avance com a reforma da Previdência, já que vem mostrando articulação boa em torno do ajuste fiscal. Para o próximo ano, o economista está mais otimista com a retomada da economia, mas a estimativa é que o crescimento seja um pouco acima de 1%.

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