quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Posição de ocasião - Dora Kramer

- O Estado de S. Paulo

Nada mais parecido com o PSDB votando a favor do aumento de despesas no governo Dilma Rousseff, em meados do ano passado, que o PT e partidos da área de influência defendendo ontem na Câmara a ideia de que a fixação de um teto para os gastos públicos representava a abertura das portas do inferno aos brasileiros mais pobres.

De volta à oposição, os deputados ditos de esquerda comportaram-se como se os últimos anos não tivessem existido. A proposta aprovada em primeiro turno na Câmara com os exatos 355 votos esperados pelo governo de Michel Temer, conceitualmente é bastante semelhante à Lei de Responsabilidade Fiscal criada no governo Fernando Henrique Cardoso 16 anos atrás e quase em tudo igual à proposta feita pelos então ministros Antonio Palocci e Paulo Bernardo há dez anos como forma de consertar as contas.

Na época, Dilma ganhou a parada qualificando a sugestão como “rudimentar”. Lula poderia ter bancado a posição de Palocci e Bernardo, como fez FH em relação a Pedro Malan, mas preferiu avalizar a posição da ministra-chefe de sua Casa Civil, em via de assumir a candidatura à Presidência da República. O restante da história é sobejamente conhecido e hoje reconhecido passo essencial do PT na direção do abismo administrativo.

O partido em geral, Dilma em particular, levou o País à profunda recessão com suas ideias retrógradas que agora volta a defender como se fosse uma grande inovação. Ainda bem que o governo ganhou. Prevaleceu o bom senso que no governo o PT uma vez adotou e depois abandonou para levar todos – o partido e o País – à rota do desastre.

Petistas e chamados esquerdistas voltaram ao discurso segundo o qual há economia de direita e de esquerda, como se o capital não fosse como é: obediente às leis do mercado.

É bem relativo. Não é da tradição brasileira a realização de prévias para a escolha de candidatos. A não ser quando seus defensores contam com condições objetivas de assegurar o resultado que atendem a seus interesses.

Até o PT, cuja democracia interna durante um bom tempo (aquele em que foi oposição) o diferenciou das demais legendas, adotou como prática o veto às prévias. No episódio mais traumático, o partido matou no nascedouro as pretensões de Eduardo Suplicy, Cristovam Buarque e Tarso Genro de disputar a legenda para a eleição presidencial de 1998.

A direção nacional não apenas interferiu para fazer de Lula candidato, como fez uma intervenção no Diretório Regional do Rio de Janeiro para, em nome da escolha de Leonel Brizola para vice de Lula, rejeitar o nome de Vladimir Palmeira e apoiar Anthony Garotinho para o governo do Estado.

Ali, o PT acabou-se no Rio onde dois anos depois recebeu do candidato que apoiou o premonitório apelido de “partido da boquinha”. Prévias por aqui são vistas como sinônimo de racha partidário e não o resultado normal de uma disputa interna.

Por essas e várias outras relativas ao histórico do PSDB na escolha de candidatos, é que, quando a gente vê tucanos defendendo a realização de prévias para a indicação do candidato a presidente em 2018, devemos considerar a teoria da relatividade como tese de valor absoluto.

Assaz loquaz. Governos, partidos e políticos têm o dever de se comunicar bastante com a população, o que não significa que a quantidade possa substituir a qualidade. O prefeito eleito João Doria Júnior não parou de falar desde a vitória e, em pelo menos duas ocasiões, já foi obrigado a recuar de suas afirmações. Isso em dez dias.

Conforme já demonstrado no afã de se comunicar do governo Michel Temer – até para marcar diferença da retraída era Dilma Rousseff no quesito –, o risco de se falar demais é firmar contrato com o constante desmentido.

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