segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Calero: presidente pediu ‘chicana’

O ex-ministro da Cultura Marcelo Calero, em entrevista ao “Fantástico”, acusou o presidente Temer de lhe pedir que fizesse uma “chicana” (manobra jurídica) para beneficiar Geddel Vieira Lima. Ele confirmou ter gravado conversa com Temer. O presidente negou a acusação e chamou a gravação de atitude indigna.

Calero diz que Temer propôs ‘chicana’ para ajudar Geddel

• Presidente nega e diz que ex-ministro foi ‘indigno’ ao gravá-lo

Jailton de Carvalho e Isabel Braga - O Globo

-BRASÍLIA- O ex-ministro da Cultura Marcelo Calero acusou o presidente Michel Temer de propor que fosse feita uma “chicana”, manobra jurídica para conseguir, via Advocacia-Geral da União (AGU), uma decisão que fosse boa “para todos” no caso do embargo proposto pelo Instituto Nacional do Patrimônio Artístico Nacional (Iphan) à construção do edifício La Vue, em Salvador, onde o ex-ministro Geddel Vieira Lima tinha comprado um apartamento. Em entrevista ao “Fantástico”, da Rede Globo, Calero contou que a orientação de Temer foi dada numa reunião para a qual o presidente o havia convocado no Palácio do Planalto.

Um dia antes dessa reunião, ao receber o primeiro relato de Calero sobre a questão, Temer teria dado outra orientação, dizendo que não era preciso atender ao pleito de Geddel.

— Em menos de 24 horas, todo aquele respaldo que ele me havia garantido, ele me retira. Me determina que eu criasse uma manobra, um artifício, uma chicana, como se diz no mundo jurídico, para que o caso fosse levado à AGU — disse Calero ao “Fantástico”.

A interferência da AGU no caso seria uma tentativa de revogar decisão da direção nacional do Iphan, que mandou parar a obra por questões de preservação do patrimônio em Salvador, depois que a representação do órgão na Bahia, controlada por Geddel, havia liberado a construção do prédio de 31 andares.

Calero disse que gravou uma ligação telefônica que fez a Temer para pedir demissão, mas assegurou que a conversa é formal. O ex-ministro evitou confirmar se também gravou conversas telefônicas com Geddel e o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, mas fontes ouvidas pelo GLOBO confirmam que Calero usou um gravador digital para registrar conversas com Temer, o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, e Geddel.

PF VAI FAZER TRANSCRIÇÃO
As conversas estão sendo transcritas pela Polícia Federal e deverão servir de base para futura decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre pedido de investigação de Geddel por suposta advocacia administrativa, entre outros crimes. O STF deverá decidir se a investigação é extensiva a Padilha e Temer.

Ontem, antes de a entrevista do exministro ser divulgada, Temer classificou de indigna a decisão de Calero de gravar secretamente uma das conversas que os dois tiveram sobre o assunto.

— Com toda franqueza, gravar clandestinamente, sempre algo desarrazoável, é indigno. Um ministro gravar o presidente da República é gravíssimo — disse Temer. — Se gravou, eu espero que essa gravação logo venha à luz, vou exigir que venha à luz. Vocês sabem que sou cuidadoso nas palavras, jamais diria algo inadequado.

Apesar de dizer que não defendeu nenhum interesse privado do ex-ministro Geddel, Temer admitiu que soube que ele era dono de um apartamento do La Vue na quinta-feira da semana retrasada, um dia antes de Marcelo Calero se demitir do Ministério da Cultura. O apartamento de Geddel estaria avaliado em mais de R$ 2 milhões.

— Eu não estava patrocinando nenhum interesse privado, data venia — disse.

O presidente disse que, a partir de agora, examinará se pede ao Gabinete de Segurança Institucional para gravar todas as suas audiências. Afirmou ainda que está analisando nomes para substituir Geddel na Secretaria de Governo.

— O perfil será com alguém de lisura absoluta; por outro lado, alguém que tenha uma boa interlocução com o Congresso — disse.

Ao “Fantástico”, Calero rebateu as acusações de que agiu errado ao gravar as conversas:

— Eu vi algumas declarações dizendo que eu teria sido desleal. Eu acho que o servidor público tem que ser leal, mas não pode ser cúmplice. Leal, mas não cúmplice.

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