quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Opinião do dia – Celso Lafer

Arendt, como se vê pela menção a esses dois livros, não era facilmente identificável no âmbito das disciplinas acadêmicas – Filosofia, Teoria Política, História – nem se enquadrava nos cânones políticos usuais: esquerda/direita, liberal/conservador. Como disse em 1972: “A esquerda pensa que sou conservadora; os conservadores, que sou de esquerda; e eu não me incomodo, pois entendo que as questões substantivas do século não serão iluminadas por esses rótulos”. Nas suas palavras: “I somehow don’t fit”. Ela não se enquadrava nos rótulos e estava à vontade com o que denominou a tradição subterrânea do pária consciente que elaborou, refletindo, por exemplo, sobre Heine, Bernard Lazare e Kafka.

Para ela, “o importante é compreender”, e para compreender o mundo do século 20, com suas rupturas e descontinuidades que se prolongam no século 21, é necessário pensar pela própria cabeça e disseminar, à maneira de Lessing, os fermentos do conhecimento provenientes desse empenho. Isso requer levar em conta a baliza da experiência, tendo em vista a fragmentação dos “universais” provenientes do hiato entre passado e futuro, que pôs em questão a pertinência da tradição do pensamento. Nessa moldura, elaborou os exercícios de pensamento político que singularizam os ensaios de Entre o Passado e o Futuro, seu primeiro livro publicado no Brasil.

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Celso Lafer é professor emérito da USP. ‘Hannah Arendt, 110 anos’, O Estado de S. Paulo, 20/11/2016.

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