quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Ministros criticam ataques públicos entre eles

• Integrantes do STF defendem Marco Aurélio, que na véspera teve seu impeachment proposto por Gilmar Mendes

Renata Mariz, Evandro Éboli e Manoel Ventura - O Globo

-BRASÍLIA- Apesar de a maioria do Supremo Tribunal Federal (STF) discordar da decisão de Marco Aurélio Mello de retirar Renan Calheiros (PMDB-AL) da presidência do Senado, ministros da Corte aproveitaram a sessão de ontem para fazer um desagravo ao colega. Em críticas indiretas às declarações do ministro Gilmar Mendes, que sugeriu o impeachment de Marco Aurélio, ministros do tribunal defenderam o direito de cada um deles decidir individualmente e demonstraram desconforto com as divergências públicas entre eles.

Em uma das declarações mais diretas sobre o tema, o ministro Teori Zavascki defendeu serenidade e criticou declarações pejorativas. Mas disse que não estava se referindo a ninguém especificamente.

— Queria manifestar profundo desconforto pessoal com fenômeno que tem se generalizado: juízes, em desacordo com a Lei Orgânica da Magistratura, tecem comentários públicos sobre outros juízes. Infelizmente, esse é um fenômeno que não depõe a favor — afirmou Teori. — Em nada contribui para um julgamento sereno e seguro, muito antes pelo contrário, a manutenção de um cenário político tenso, que propicia críticas pejorativas de caráter pessoal ou que se incentiva até mesmo propostas de descumprimento de ordem judicial, inimaginável num estado de direito, por mais que se discorde de uma decisão judicial. A presteza do ministro Marco Aurélio ao plenário servirá para afastar este nefasto cenário.

Em entrevista ao Blog do Moreno, anteontem, Gilmar afirmou que a decisão de retirar Renan da presidência do Senado, em caráter liminar, era um caso de reconhecimento de impeachment de Marco Aurélio. Ele insinuou que o colega enlouquecera:

— No Nordeste se diz que não se corre atrás de doido porque não se sabe para onde ele vai — afirmou Gilmar.

A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, também prestou solidariedade a Marco Aurélio e citou votos divergentes do ministro.

— Minha solidariedade absoluta ao trabalho desenvolvido pelo ministro Marco Aurélio, que insiste em votar de acordo com sua consciência. E, como ele mesmo brinca, vencido, mas não convencido. Só não pode é atingir a honorabilidade e correção ética e intelectual do juiz — disse Cármen. Marco Aurélio intercedeu: — Muito menos minha higidez mental — afirmou, em referência às declarações de Gilmar.

— Ordem judicial há de ser cumprida. Para que prevaleça a ordem jurídica e não o voluntarismo de quem quer que seja. Uma ordem judicial pode ser discutida e alvo de recursos. No Brasil, há excesso de recursos. O que fica difícil é verificar que se vire de costas a um oficial de Justiça, que é a mesma coisa que dar as costas ao próprio Poder Judiciário. Foi um exemplo não edificante de se educar, de civismo e de convivência pacífica — completou Cármem.

A ministra Rosa Weber também votou “endossando o desconforto externado”, referindo-se às declarações de Teori sobre Gilmar, sem tê-lo citado diretamente.

O ministro Ricardo Lewandowski, que já bateu boca com Gilmar no plenário do Supremo, afirmou que um juiz tem direito de decidir monocraticamente. Antes de discordar do voto de Marco Aurélio, e abrir a chamada divergência no plenário para derrubar a liminar, o decano Celso de Mello fez elogios ao colega:

— Vai o meu integral respeito ao ministro Marco Aurélio que, ao longo de mais de 26 anos, acumula uma carreira qualificada e brilhante. E com uma atuação que sempre se destacou por sua irrepreensível atenção à causa pública e modelar — disse Mello.

EM VIAGEM, GILMAR NÃO PARTICIPOU DA SESSÃO
Gilmar não participou do julgamento porque viajou para Estocolmo. Ao GLOBO, antes do julgamento, afirmou que quem assume o papel de superpoder deveria “calçar as sandálias da humildade”, dizendo que se referia às instituições de forma geral. Ele afirmou ainda que o episódio, que agravou a crise entre Judiciário e Legislativo, terá “desdobramentos”, mencionando os atritos recentes entre os Poderes

— Quando você tem uma votação (do projeto das dez medidas contra a corrupção que incluiu o abuso de autoridade) daquela na Câmara, de 400 votos, as pessoas que sabem ler estrelas sabem que tem algo mais forte que raiva — disse Gilmar. — Quatrocentos votos num projeto de lei significa que podia ser aprovado como emenda constitucional.

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