sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Pacote incentiva redução de dívida e eleva ganho do FGTS

*Refis beneficiará pessoas físicas *Multa por demissão será reduzida *Plano prevê desburocratização

Em meio à recessão e ao agravamento da crise política, o presidente Temer lançou um pacote para estimular a economia que prevê amplo programa de regularização de dívidas tributárias para empresas e pessoas físicas. Até débitos recentes, vencidos em novembro, terão condições facilitadas. O governo também vai elevar o ganho dos trabalhadores com conta no FGTS, distribuindo parte do lucro do Fundo aos cotistas. O adicional de 10% sobre o FGTS que empresas pagam em caso de demissão sem justa causa será aos poucos extinto. Para analistas, a renegociação com o Fisco ajudará empresas e consumidores de imediato, mas o conjunto de medidas não terá impacto a curto prazo.

Fôlego a empresas e contribuintes

• Pacote prevê amplo parcelamento de dívidas tributárias e melhor remuneração do FGTS

Bárbara Nascimento, Catarina Alencastro , Eduardo Barretto, João Sorima Neto, Ana Paula Ribeiro e Marcello Corrêa - O Globo

-BRASÍLIA, SÃO PAULO E RIO- Num cenário de recessão e agravamento da crise política, o governo anunciou ontem um amplo programa de regularização de dívidas tributárias para empresas e pessoas físicas. O novo regime, que faz parte de um conjunto de dez ações de estímulo à economia, tem como objetivo aliviar o bolso dos empresários e trabalhadores e reduzir seu endividamento, apontado com um dos principais vilões para a retomada da atividade. Cercado pelos ministros da área econômica e os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado, o presidente Michel Temer também anunciou mudanças no FGTS para aumentar a remuneração dos cotistas do Fundo, conforme antecipado pelo GLOBO ontem, e reduzir os custos das empresas em caso de demissão sem justa causa.

O programa de regularização tributária permitirá que os contribuintes possam pagar dívidas tributárias vencidas até 30 de novembro de 2016 em condições favoráveis. As empresas, por exemplo, poderão abater dos valores devidos prejuízos apurados até 31 de dezembro de 2015 e declarados até 30 de junho de 2016.O prazo de pagamento vai variar entre 60 e 96 meses, e as parcelas serão corrigidas pela Selic.

O governo rebateu a ideia de que se trata de um novo Refis (programa que permite o pagamento de em prazos maiores, com desconto de juros e multas). Isso porque não haverá perdão de multas ou desconto no total parcelado.

— O objetivo com essa regularização é permitir que empresas e pessoas se programem ao longo do tempo para fazer pagamentos parcelados e obter novos créditos que, no presente momento, lhes são vedados — disse Temer.

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, informou que o governo espera arrecadar R$ 10 bilhões com o novo programa. Esses recursos ajudarão o Tesouro a reforçar o caixa e fechar as contas de 2017.

O governo também anunciou mudanças no FGTS. O pacote prevê melhor remuneração dos cotistas e a eliminação gradual da multa adicional de 10% que as empresas têm de pagar em caso de demissão sem justa causa — neste caso, a redução será de um ponto percentual por ano durante a próxima década, a fim de aliviar o peso desses encargos para as empresas.

— Essa multa não é repassada ao trabalhador, mas ao próprio FGTS. É necessário fazer isso (redução) gradualmente, para que despesas de balanço do Fundo não sejam afetadas de maneira muito forte — explicou o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira.

Para alterar a remuneração dos cotistas, o governo deve editar uma medida provisória (MP) que permita a distribuição de parte do lucro líquido do FGTS aos donos das contas vinculadas. Segundo o governo, 50% dos resultados serão dividido e incorporados às contas. A previsão é que o Fundo lucre R$ 15 bilhões este ano. Com isso, o governo espera estimular sobretudo o setor imobiliário, já que, com a remuneração maior, os trabalhadores terão mais fôlego para comprar imóveis.

A previsão de sacar parte do FGTS para pagamento de dívidas, avaliada pela mesa da equipe econômica, não foi descartada. Oliveira afirmou que isso ainda está em estudo e será divulgado nas próximas semanas. O governo sofreu forte pressão do setor de construção a não adotar essa medida, para não descapitalizar o Fundo.

Tanto Meirelles quanto Temer reafirmaram, repetidas vezes, que as medidas estão sendo estudadas há vários meses, não tendo sido divulgadas em reação à crise política. Na última semana, executivos da Odebrecht citaram a cúpula do PMDB e o próprio Temer em delação à Operação Lava-Jato.

ANALISTAS: POUCO EFEITO A CURTO PRAZO
O governo tentou ainda turbinar o anúncio com medidas envolvendo o BNDES, que haviam sido apresentadas no início da semana. Entre elas, o acesso mais fácil ao crédito para micro, pequenas e médias empresas. Aquelas com faturamento até R$ 300 milhões poderão solicitar refinanciamento com recursos do BNDES. Oliveira estima que serão negociados entre R$ 10 bilhões e R$ 20 bilhões.

Para analistas, a medida com impacto mais claro e de curto prazo é o refinanciamento de dívidas. Outros pontos foram vistos pelos economistas como uma forma de evitar uma recessão em 2017.

— Todas (as medidas) têm caráter positivo, mas a maioria não tem eficácia a curto prazo. Esta recessão é marcada por um forte endividamento das famílias e das empresas, e uma profunda crise fiscal dos governos. É uma situação complexa e de recuperação demorada — diz Gustavo Loyola, sócio da Tendências.

Para Leonardo Azevedo Ventura, sócio da área tributária de Tozzini Freire Advogados, o parcelamento de dívidas tributárias ajudará as empresas a recuperar o fôlego. A ação mais importante, segundo ele, é a inclusão de dívidas vencidas até 30 de novembro. Em parcelamentos anteriores, entravam apenas aquelas vencidas até cerca de seis meses do anúncio do programa.

— É algo bem-vindo. As empresas de modo geral, dada a crise, podem ter uma folga para tomar fôlego e ter espaço para crescer e investir — explica.

Os setores financeiro e produtivo elogiaram o pacote. O presidente do Bradesco e da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), Luiz Carlos Trabuco, vê mudança de expectativas. E o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, ressaltou que isso ajudará as empresas a atravessarem o momento delicado do país.

Mas Fábio Silveira, sócio-diretor da MacroSector, vê efeito limitado nas medidas. Ele só espera recuperação quando os juros básicos, hoje em 13,75% ao ano, caírem mais fortemente:

— Enquanto estiverem nesse patamar estratosférico, não tem crescimento.

Para Claudio Frischtak, economista da consultoria Inter.B, as medidas são um sinal de que o governo tem um diagnóstico pessimista da economia:

— Quando o governo adota essas medidas é que ele está possivelmente vendo é que a situação da economia é mais frágil do que aparenta ser. São medidas fundamentalmente para conter a possibilidade de recessão em 2017.

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