domingo, 11 de setembro de 2016

Opinião do dia – Salvador Allende

"Seguramente, esta será a última oportunidade em que poderei dirigir-me a vocês. A Força Aérea bombardeou as antenas da Rádio Magallanes. Minhas palavras não têm amargura, mas decepção. Que sejam elas um castigo moral para quem traiu seu juramento: soldados do Chile, comandantes-em-chefe titulares, o almirante Merino, que se autodesignou comandante da Armada, e o senhor Mendoza, general rastejante que ainda ontem manifestara sua fidelidade e lealdade ao Governo, e que também se autodenominou diretor geral dos carabineros.

Diante destes fatos só me cabe dizer aos trabalhadores: Não vou renunciar! Colocado numa encruzilhada histórica, pagarei com minha vida a lealdade ao povo. E lhes digo que tenho a certeza de que a semente que entregamos à consciência digna de milhares e milhares de chilenos, não poderá ser ceifada definitivamente. [Eles] têm a força, poderão nos avassalar, mas não se detém os processos sociais nem com o crime nem com a força. A história é nossa e a fazem os povos.

Trabalhadores de minha Pátria: quero agradecer-lhes a lealdade que sempre tiveram, a confiança que depositaram em um homem que foi apenas intérprete de grandes anseios de justiça, que empenhou sua palavra em que respeitaria a Constituição e a lei, e assim o fez.

Neste momento definitivo, o último em que eu poderei dirigir-me a vocês, quero que aproveitem a lição: o capital estrangeiro, o imperialismo, unidos à reação criaram o clima para que as Forças Armadas rompessem sua tradição, que lhes ensinara o general Schneider e reafirmara o comandante Araya, vítimas do mesmo setor social que hoje estará esperando com as mãos livres, reconquistar o poder para seguir defendendo seus lucros e seus privilégios.

Dirijo-me a vocês, sobretudo à mulher simples de nossa terra, à camponesa que nos acreditou, à mãe que soube de nossa preocupação com as crianças. Dirijo-me aos profissionais da Pátria, aos profissionais patriotas que continuaram trabalhando contra a sedição auspiciada pelas associações profissionais, associações classistas que também defenderam os lucros de uma sociedade capitalista. Dirijo-me à juventude, àqueles que cantaram e deram sua alegria e seu espírito de luta. Dirijo-me ao homem do Chile, ao operário, ao camponês, ao intelectual, àqueles que serão perseguidos, porque em nosso país o fascismo está há tempos presente; nos atentados terroristas, explodindo as pontes, cortando as vias férreas, destruindo os oleodutos e os gasodutos, frente ao silêncio daqueles que tinham a obrigação de agir. Estavam comprometidos.

A historia os julgará.

Seguramente a Rádio Magallanes será calada e o metal tranqüilo de minha voz não chegará mais a vocês. Não importa. Vocês continuarão a ouvi-la. Sempre estarei junto a vocês. Pelo menos minha lembrança será a de um homem digno que foi leal à Pátria. O povo deve defender-se, mas não se sacrificar. O povo não deve se deixar arrasar nem tranqüilizar, mas tampouco pode humilhar-se.

Trabalhadores de minha Pátria, tenho fé no Chile e seu destino. Superarão outros homens este momento cinzento e amargo em que a traição pretende impor-se. Saibam que, antes do que se pensa, de novo se abrirão as grandes alamedas por onde passará o homem livre, para construir uma sociedade melhor.

Viva o Chile! Viva o povo! Viva os trabalhadores! Estas são minhas últimas palavras e tenho a certeza de que meu sacrifício não será em vão. Tenho a certeza de que, pelo menos, será uma lição moral que castigará a perfídia, a covardia e a traição."
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Santiago, 11 de setembro de 1973

Temer diz ser contra reajuste de ministros do STF

• ‘Isso daí gera uma cascata gravíssima’, afirma, sobre efeito do aumento no funcionalismo

Efetivado no cargo, presidente anuncia que tomará medidas ‘que podem desagradar a setores’ e que não abrirá mão do ‘conceito do teto’, sem permitir despesas acima da inflação, inclusive nas áreas de Saúde e Educação

Dizendo-se disposto a “tomar posições que podem desagradar a setores”, o presidente Michel Temer afirmou, em entrevista exclusiva ao GLOBO, ser contra o aumento dos salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Projeto que prevê o reajuste desses vencimentos, de R$ 33,7 mil para R$ 39,2 mil em 2017, tramita no Congresso. Caso aprovado, abriria a porta para outros aumentos, por se tratar do teto salarial federal. “Isso daí gera uma cascata gravíssima. Porque pega todo o Judiciário, outros setores da administração, todo o Legislativo”, afirmou o presidente, citando apelos que vem recebendo dos governadores: “Pelo amor de Deus, Temer, não deixa passar isso”, contou. Afirmou ainda que seu governo não abrirá mão do “conceito do teto” e não permitirá despesas acima da inflação, inclusive nas áreas de Saúde e Educação. Ao se referir às acusações de “golpista”, disse que o rótulo “não pegou” e fez piada sobre seu hábito de usar mesóclises: “Tentá-lo-ei não fazê-lo.”

‘O reajuste dos ministros do Supremo gera uma cascata gravíssima’

Na 1ª entrevista como presidente da República, concedida na manhã de sexta, em Brasília, Michel Temer, de 75 anos, buscou pontuar a diferença entre o governo que se inicia, com apenas 11 dias, e a gestão interina, marcada por recuos e desconfiança: “Vou ser mais presidente”. Temer posicionou-se de forma assertiva, a inédita, contra o reajuste dos ministros do STF, uma conta de R$ 5 bilhões, fonte de atrito permanente com a base aliada, PSDB à frente.

Alan Gripp, Catarina Alencastro, Ilimar Franco, Paulo Celso Pereira, Sergio Fadul Silvia Fonseca - O Globo

Há 11 dias no cargo, o presidente também foi firme em relação às reformas e ao teto de gastos. Seu governo, diz, não abrirá mão do “conceito do teto”, que não permite despesas acima da inflação inclusive nas áreas de Saúde e Educação. Por outro lado, Temer ainda parece um tanto desconfortável com a liturgia do cargo, que herdou após o impeachment de Dilma. Não usou a faixa presidencial no Sete de Setembro e nem pretende vesti-la tão cedo. Diz achar “soberba”.

Apesar de reafirmar que não disputará a reeleição, recusa-se a formalizar um compromisso: “Todo mundo que assina não cumpre”. Em duas horas de entrevista, no gabinete presidencial, elevou o tom e deu tapas na mesa sempre que tratou da acusação de que patrocinou um “golpe”, que, para ele, “não pegou”. Mas também fez piadas, fiel a seu estilo, como ao responder se anda se policiando para evitar as chamadas mesóclises e ênclises: “Tentá-lo-ei não fazê-lo.”

No fim, um leve desabafo: “A pressão do cargo é maior do que eu imaginava.” A seguir os principais trechos da entrevista.

‘Me digam qual é o golpe? Eu só quero governar’

Após minimizar os protestos contra seu governo, Temer disse que é preciso respeitar ‘o movimento popular que está na rua’, mas afirmou que ‘o golpe não pegou’, por ser movimento político

• Como o senhor vê o aparente crescimento dos protestos de rua?
Com naturalidade. Primeiro, o rescaldo do impeachment, pois é um ato politicamente doloroso pra quem sai. Estou aqui por razões constitucionais. Sempre se fala: “Ah, mas o Temer não foi eleito”. A eleição se deu com apoio do PMDB, nós ganhamos a eleição por 3,2 milhões de votos. Sem o PMDB, a campanha perderia 4 minutos e meio de rádio e televisão. Tivemos ainda 23 diretórios estaduais apoiando. Será que esses estados não deram 1,6 milhão de votos para a chapa?

• Mas os protestos cresceram. Podem inviabilizar o governo?
A notícia que eu tinha era de um pessoal que saiu queimando pneu e destruindo carros, os chamados black blocs, e eu respondi: “Olha, são pessoas que se reúnem para depredar”. Depredação é delito. Depois, quando saíram milhares de pessoas às ruas, nós começamos a dizer: tem que se respeitar. Agora, tem uma significação política muito grande, porque é uma oposição a quem está no poder. Aqui também tem um movimento que quer derrubar o governo, por uma via transversal, que não é constitucional: fazer eleições agora. O jeito é irmos tranquilamente até 2018, e em 2018 se faz nova eleição.

Seria absurdo interferir na Lava-Jato, diz Temer

• Presidente afirma que pôr mulher na AGU ‘ajuda nessa história do gênero’

BRASÍLIA - Na entrevista concedida ao GLOBO, o presidente Michel Temer disse que “jamais” interferirá nas investigações da Operação Lava-Jato. Diz que seria absurdo se isto ocorresse. Ele também afirmou que não há hipótese de procurar um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) na tentativa de influenciá-lo na condução da operação. As declarações foram dadas antes da entrevista em que o ex-advogado-geral da União (AGU) Fábio Medina Osório acusou o governo de orientá-lo a ficar afastado da Lava-Jato.

— Jamais o Executivo vai interferir nessa matéria. Cada Poder exerce o seu papel e seria um absurdo do Poder Executivo. Primeiro, impossível, inadmissível imaginar que o presidente da República possa chamar alguém do Supremo e dizer “decidam assim ou assado”. Não existe isso no Brasil. Eu jamais faria isso. Sou muito consciente dos termos da Constituição. Não tem a menor possibilidade de interferência do Executivo, nem a favor, nem contra — disse Temer.

Cármen Lúcia vai priorizar o social

As questões ligadas a minorias e os temas sociais ganharão destaque no STF durante a presidência da ministra Cármen Lúcia, que assume o cargo amanhã. Logo na primeira semana, a Corte julgará se há prevalência da paternidade afetiva sobre a biológica. Também à frente do CNJ, ela dará atenção à população carcerária.

Olhar voltado a minorias e questões sociais

• Cármen Lúcia assume a presidência do STF com intenção de levar à Corte a discussão de grandes temas

Carolina Brígido -O Globo

A ministra Cármen Lúcia assumirá amanhã a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) com a intenção de devolver à mais alta Corte do país a discussão de grandes temas. Na visão dela, isso implica voltar os olhos às minorias e aos assuntos sociais. Já na primeira semana de gestão, incluiu na pauta de julgamentos uma discussão polêmica: saber se há prevalência da paternidade afetiva sobre a biológica. O plenário também vai julgar processos sobre direitos trabalhistas e decidir se é dever do poder público fornecer medicamentos de alto custo a pacientes com doenças graves.

Sem vocação penal, STF desacelera Lava Jato

• Depois de dois anos e meio do início das apurações, nenhum político foi condenado

Beatriz Bulla - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Dois anos e meio depois do início das primeiras investigações contra políticos na Operação Lava Jato, a lista de inquéritos abertos no Supremo Tribunal Federal (STF) só cresce, mas as soluções da Corte aos casos de corrupção envolvendo parlamentares e ministros não seguem o mesmo ritmo. Nenhum político dos mais de 90 investigados foi condenado até o momento e apenas dois parlamentares respondem a ações penais: o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e o deputado Nelson Meurer (PP-PR).

Na terça-feira passada, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, admitiu a lentidão dos casos no Supremo. A culpa, pelo entendimento de Janot, não é da própria Corte. “O tribunal não foi feito para formar processo, o tribunal foi feito para julgar recurso. Quando se inverte a lógica, fica mais lento mesmo”, disse o chefe do Ministério Público. O STF, emendou Janot, “está fazendo o que pode”.

STF nega liminares para anular fatiamento do julgamento de Dilma

- Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A ministra do STF (Supremo Tribunal Federal) Rosa Weber negou liminares em pedidos de parlamentares e partidos políticos para anular a decisão do Senadoque, no processo de cassação da ex-presidente Dilma Rousseff, manteve a sua habilitação para ocupar funções públicas.

As decisões foram tomadas nesta sexta-feira (9) em mandados se segurança apresentados pelos senadores Álvaro Dias (PV-PR) e José Medeiros (PSD-MT), pelo deputado Expedito Netto (SD-RO) e por seis partidos políticos —PSDB, DEM, PPS, PMDB, Solidariedade e PSL, que ingressaram juntos.

Na sessão que definiu o afastamento definitivo da então presidente, os senadores aceitaram fazer duas votações diferentes, uma para cassar o mandato de Dilma e outra para decidir se ela seria inabilitada ou não para assumir funções públicas pelas acusação de crime de responsabilidade.

A presidente teve o mandato cassado, mas não houve votos suficientes para sua inabilitação. Com isso, ela manteve seus direitos políticos.

Parlamentares, partidos, associações e advogados entraram com mandados de segurança no STF pedindo que a decisão fosse revista, alegando que ela não poderia ser fatiada e que a perda dos direitos políticos é automática.

A ministra não aceitou julgar os pedidos de associações e advogados. Em relação aos pedidos dos partidos e parlamentares, ela decidiu não dar liminar anulando a decisão do Senado.

A ministra deu prazo de 10 dias para que as autoridades envolvidas fossem notificadas, inclusive a ex-presidente Dilma Rousseff, para que se pronunciem para que o julgamento definitivo possa ser realizado.

Crise em campanhas revive debate sobre financiamento eleitoral

• Tema volta com força no Congresso nos debates sobre reforma política

Isabel Braga - O Globo

BRASÍLIA A crise financeira que atinge a maioria das campanhas nas eleições municipais, as primeiras sem doações empresariais, deve reacender no Congresso Nacional o debate sobre financiamento eleitoral dentro da reforma política. Vivenciando o dia a dia das campanhas, líderes de partidos como PR e PTB voltaram a defender o retorno do financiamento empresarial.

O tema, porém, é polêmico, e líderes de partidos como PMDB, PSDB e DEM, que eram favoráveis a esse modelo, dizem que será muito difícil retomar esse tipo de financiamento neste momento, diante das denúncias da Operação Lava-Jato sobre corrupção envolvendo doações de empresas a partidos e políticos. O PT entende que o debate tem que ser feito, mas se opõe à volta de doações de empresa e quer ampliar o financiamento público das campanhas.

PSDB e DEM querem foco na redução da fragmentação

• Partidos defendem fim das coligações nas eleições proporcionais

Isabel Braga - O Globo

BRASÍLIA - O líder do PSDB na Câmara, Antonio Imbassahy (BA) defende que o Congresso Nacional concentre sua energia na votação dos dois pontos da reforma política que têm por objetivo reduzir a fragmentação partidária no país: o fim das coligações nas eleições proporcionais a partir de 2022 e a criação da cláusula de desempenho para acesso ao fundo partidário e ao tempo de propaganda gratuita de rádio e TV. São pontos da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) apresentada no Senado pelos tucanos Aécio Neves (MG) e Ricardo Ferraço (ES) e que pode ser votada na Comissão de Constituição e Justiça da Casa esta semana.

Fundos de pensão contrariam práticas de mercado nos aportes em empresas

• Segundo estudo do Insper e cinco gestores ouvidos pelo ‘Estado’, fundos investiram dinheiro demais em uma empresa só, escolheram gestores sem experiência e deixaram influência política pautar decisões ao aplicar dinheiro dos pensionistas

Fernando Scheller, Mônica Scaramuzzo - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Os fundos de pensão quebraram as principais práticas de mercado na hora de investir o dinheiro de seus pensionistas em private equity (compra de participações em empresas). A avaliação consta em estudo sobre o investimento em private equity de 45 fundos, elaborado pela escola de negócios Insper, e foi corroborada por cinco gestores do setor consultados pelo ‘Estado’.

Realizado em parceria com a Spectra Investments e concluído no início deste ano, o estudo mostra que os fundos de pensão – e em especial os do setor público, como Petros (Petrobrás), Previ (Banco do Brasil), Funcef (Caixa Econômica Federal) e Postalis (Correios), citados na Operação Greenfield – ignoraram o que “é benchmark (referência) internacional na gestão de private equity”, diz a professora responsável pelo levantamento, Andréa Minardi, pesquisadora do Centro de Estudos de Finanças do Insper.

É disparate sugerir que impeachment é equivalente à repressão da ditadura – Ferreira Gullar

- Folha de S. Paulo

Após um processo de impeachment que durou cerca de nove meses, a presidente Dilma Rousseff teve que deixar o governo. Esse é um fato de grande importância, pois assinala o fim da hegemonia política do Partido dos Trabalhadores e de seu líder, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Deve-se observar, ainda, que a deposição de Dilma importa igualmente ao fim do regime populista no Brasil, a exemplo do que aconteceu na Argentina e ameaça ocorrer também na Venezuela, na Bolívia e no Equador. A identificação desses governos ficou evidente durante o tempo em que o PT governou o país. E mais evidente se tornou, agora, após o impedimento de Dilma Rousseff, quando os governantes populistas retiraram seus embaixadores do Brasil, como protesto à deposição da presidente petista.

A invasão dos zumbis – Fernando Gabeira

- O Globo

Semana de trabalho na Baixada Fluminense. Tardes quentes e muitas carreatas de candidatos atravancando o caminho, sobretudo no feriado de Sete de Setembro. Não posso fugir de um tema ao falar com as pessoas por aqui. A semana foi marcada por um escândalo nos fundos de pensão. O rombo nas contas de quatro deles, Petros, Previ, Postalis e Funcef, somam mais de R$ 50 bilhões. Como foi possível chegar a essas cifras? Onde estavam todos os mecanismos de controle? Que magia permitiu que uma suspeita que data de mais de 13 anos continuasse nas sombras?

Herança não reconhecida - Pedro Malan

- O Estado de S. Paulo

O século 20 destruiu religiões seculares que prometiam, para seus seguidores, a salvação aqui na Terra: fascismo, stalinismo, nazismo, maoismo e outros “ismos” que viraram “wasms” (o “já era” da gíria carioca). Restaram duas grandes formas de acreditar: religiões tradicionais que prometem a seus fiéis a salvação na vida eterna, após a morte, e nacionalismos variados, inclusive em suas manifestações mais preocupantes, como o nacional-populismo e o nacional-estatismo, que com frequência andam juntos, e que ainda prometem a salvação terrena para os seus seguidores, beneficiários e demais crentes.

Crenças são o que são, matérias de fé ou paixões da imaginação, que correspondem, com frequência, a emotivas necessidades humanas. Há diferentes graus do acreditar, mas como bem notou Fernando Pessoa, “o que há de bom ou mau em qualquer crença, qualquer, é o modo como se crê. O bem ou o mal estão no psiquismo do crente, não na crença em si”. Em outras palavras, o mau de uma crença e o mal que esta pode causar estão naqueles que utilizam a força do acreditar como critério de verdade. Pior, quando creem que “sua verdade” poderia, pela força da repetição, prevalecer sobre mentes e corações de incrédulos ou portadores de outras crenças. E pior ainda, quando creem que as instrumentalidades do poder do Estado devem ser utilizadas para tal propósito. Não costuma dar certo.

Caos parlamentar - Sérgio Besserman Vianna

- O Globo

• Não há luz alguma sobre como seremos capazes de reconstruir a República

Muitos aspectos da vida política e institucional do Brasil são disfuncionais e obstáculos quase intransponíveis, se queremos evitar a armadilha dos países de renda média e recuperar um trajetória de crescimento que leve ao aumento do bem-estar da população brasileira.

Vivemos agora no lusco-fusco entre a morte já constatada da Nova República e o surgimento de alguma luz sobre como avançar na direção de uma democracia de qualidade superior. O axioma de Ulysses Guimarães, de que “cada novo Congresso é sempre pior do que o anterior”, tornou-se insustentável. A demanda tsunâmica por mais igualdade não é compatível com o intransponível fosso que se abriu entre a representação política e os cidadãos.

Minirreforma política muda muito na direção correta – Samuel Pessôa

- Folha de S. Paulo

Tramita no Senado PEC (proposta de emenda à Constituição) de minirreforma política. De autoria do senador do PSDB do Espírito Santo, Ricardo Ferraço, conta com relatoria do senador do PSDB de São Paulo Aloysio Nunes Ferreira. O projeto institui a cláusula de desempenho e veda coligação para eleição proporcional.

A intensa crise política atual tem inúmeras causas. A elevada fragmentação partidária agrava o problema: aumenta o custo do Executivo no exercício de seu poder de agenda no Congresso Nacional, dificultando, portanto, a governabilidade.

Difícil governar com 32 partidos e outros 35 na fila para a obtenção de registro.

No meio do atoleiro, fora do debate dos gringos - Rolf Kuntz

- O Estado de S. Paulo

Só os muito otimistas podem ver alguma boa notícia nos últimos números da inflação, ou até um sinal verde para um primeiro corte de juros. Além de entravar o crescimento econômico, financiamento muito caro dificulta a arrumação das contas de governo e atrapalha, de modo especial, o controle da dívida pública. Mas um corte precipitado pode ser desastroso, como se viu entre os meses finais de 2011 e o fim de abril de 2013, quando a política frouxa, ao gosto da presidente Dilma Rousseff, abriu enorme espaço para o avanço da inflação.

Para iniciar o corte, facilitar a expansão do crédito e começar a diminuir o custo do capital, o Comitê de Política Monetária (Copom) apontou três condições indispensáveis. Nenhuma é visível neste momento, apesar do recuo, no varejo, do custo da alimentação. Se quiserem afrouxar a política na próxima reunião, os membros do comitê, formado por diretores do Banco Central (BC), terão de apresentar uma explicação digna de citação em manuais – exceto, é claro, se fatos muito surpreendentes ocorrerem até lá. O próximo encontro para deliberação está marcado para os dias 18 e 19 de outubro.

Temas cruzados - Míriam Leitão

- O Globo

Terrorismo, desemprego e mudança climática. Esses três assuntos estiveram em todas as discussões dos líderes presentes na reunião do G-20. Desses temas que mobilizam os líderes mundiais, dois nos dizem respeito diretamente. O Brasil precisa urgentemente criar emprego para seus 12 milhões de desempregados. O clima já mostra seus rigores no país, como no Nordeste, há cinco anos em seca.

Mudança climática não é aquilo com o qual se preocupar no futuro, mas o risco para o qual se preparar agora. Os cientistas precisam sempre de estudos rigorosos antes de definir que um fenômeno decorre de mudança climática ou faz parte das oscilações naturais que a Terra sempre viveu. Essa precisão científica do diagnóstico é importante, mas não deve adiar as decisões a tomar, porque o fato está diante de nós.

Algodão entre cristais - Dora Kramer

- O Estado de S. Paulo

A crise persiste, a turbulência resiste e os conflitos de natureza política ainda insistem em marcar presença no ambiente de maneira contundente. Ciente do cenário nacional ainda conturbado em que assumirá amanhã a presidência do Supremo Tribunal Federal, a ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha – mineira de Montes Claros, onde nasceu há 62 anos sob o signo de Áries – fará um discurso de panos quentes, no sentido da união do País, do fim da ideia da divisão entre “nós” e “eles”.

Ela acredita que a fala estará em sintonia com o anseio da maioria da população e irá ao encontro da necessidade mais urgente do Brasil: a pacificação entre as forças políticas (sem prejuízo do exercício da oposição e da liberdade de expressão) e a harmonia entre os Poderes. Notadamente no âmbito do Judiciário – aqui entendido o destaque ao tribunal que presidirá pelos próximos dois anos.

Mais obstáculos - Merval Pereira

- O Globo

Contrariando a jurisprudência do STF, a decisão do ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), de desbloquear a indisponibilidade de R$ 2 bilhões em bens das empreiteiras Odebrecht e OAS que havia sido decretada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), em função do superfaturamento na construção da refinaria Abreu e Lima em Pernambuco, é mais uma medida polêmica que pode inviabilizar a tentativa de recuperar dinheiro desviado da Petrobras no escândalo investigado pela Operação Lava-Jato.

O ministro Marco Aurélio Mello, além de questionar o poder do TCU de bloquear bens de empresas particulares, concordou com a defesa da empreiteira, que alegou que a medida colocaria em risco a própria sobrevivência da construtora, já em recuperação judicial: “A manutenção da medida cautelar [bloqueio] pode sujeitar a impetrante à morte civil. A eficácia da tomada de contas especiais nº 000.168/2016-5, bem como de outros processos de controle conduzidos pelo Tribunal de Contas, e o ressarcimento por eventuais prejuízos causados ao erário dependem da permanência da construtora em atividade”, afirmou o ministro.

Os três oitos - Luiz Carlos Azedo

- Correio Braziliense

• Fosse Temer um presidente mais rigoroso com a equipe, teria demitido o colaborador; fosse o ministro mais coerente com o que pensa, teria pedido demissão

Tudo o que o presidente Michel Temer não precisa nesta altura do campeonato é abrir novas frentes de batalha. Não tem força para isso. Já enfrenta uma oposição encastelada em vários órgãos e empresas federais, que se rearticula a partir dos movimentos sociais para desestabilizar o governo. Mas, para isso, precisa controlar os trapalhões de sua equipe, que conseguem adicionar problemas imaginários aos obstáculos reais, com declarações infelizes e propostas equivocadas, mas que servem para engrossar o caldo do Fora, Temer!

‘Assim é, se lhe parece’ - Eliane Cantanhêde

- O Estado de S. Paulo

O governo Michel Temer parece aquele boneco Bobão: cai para um lado, cai para o outro, gira desengonçado, mas acaba de pé. A oposição está irritada e animada, botando suas bandeiras vermelhas na rua, com a propaganda do “golpe” e do “Fora, Temer”. E, da arquibancada, a grande maioria da população ainda olha, desconfiada, sem tirar conclusões. O impeachment passou, mas o jogo ainda está sendo jogado.

Começar um governo depois de um longo e traumático processo de impeachment é muito diferente de assumir sob embalo de uma campanha acirrada, de uma vitória nas urnas e de uma vibrante festa de posse. No caso de Temer, acrescentem-se as circunstâncias: uma crise de dar dó, Orçamento destroçado e a Lava Jato pairando sobre tudo e todos.

Ressuscitar as estatais – Editorial / Folha de S. Paulo

Interrompida a marcha de insensatez que caracterizou a gestão das empresas estatais nos últimos anos, parece iniciar-se uma restauração. Será um longo caminho, em vista do colosso de prejuízos nas duas principais empresas, Petrobras e Eletrobras.

A Petrobras é a mais vistosa, não só pela rapinagem trazida à luz pela Operação Lava Jato, mas pela deterioração dos processos decisórios, que passaram a responder apenas a ditames políticos, não a orçamentos e custos.

Em conjunto, as decisões erradas e os danos decorrentes de corrupção já levaram a petroleira a reconhecer prejuízos próximos de R$ 100 bilhões. Nessa estimativa entram desde propinas da ordem de R$ 6 bilhões até reavaliações de projetos que estouraram os orçamentos, como a refinaria de Abreu e Lima e o complexo petroquímico do Rio de Janeiro.

Guerra de comunicação – Editorial / O Estado de S. Paulo

A política, como definiu o escritor italiano Carlo Bini, é o governo da opinião. Embora a boa administração seja essencial para a conservação da capacidade de governar, é evidente que, numa democracia, os líderes devem se sustentar também na opinião pública, que será tanto mais compreensiva com o dirigente quanto maior for a capacidade deste de demonstrar a legitimidade de seus planos e atos. É evidente que não se trata de uma tarefa simples, especialmente quando a arena política, que é o campo do embate democrático de ideias, está prestes a ser assaltada por radicais dispostos a questionar dia e noite a legitimidade do governo não em razão de suas decisões, mas sim de sua própria natureza, como é o caso dos que hoje se opõem ao governo do presidente Michel Temer, qualificando-o de “golpista”, o que não dá margem a nenhum tipo de diálogo.

Mas o fato é que o slogan “fora Temer” vem ganhando ares de movimento com algum potencial para constranger o presidente, não em razão da procedência dos argumentos em que se baseia, mas pelos erros cometidos por Temer e sua equipe no terreno da comunicação – erros que, se não forem rapidamente corrigidos, podem dificultar ainda mais a sua já hercúlea tarefa de presidente de consertar o País, arruinado pelos mesmos petistas que ora arrebanham adeptos para sua causa niilista e antidemocrática.

Aprovar terceirização é parte importante das reformas – Editorial / O Globo

• Projeto de lei que se encontra no Senado reduz a enorme insegurança jurídica existente no mercado de trabalho, e assim incentiva a geração de empregos

Estabelece-se que a sociedade e seus costumes seguem na frente no curso da História, para depois vir o arcabouço jurídico e sancionar novas realidades no entrelaçamento social. Não é tão simples assim, mas costuma acontecer dessa forma em atividades muito reguladas, com excessiva interferência do Estado, e que passam por algum choque decorrente da modernização de práticas impostas pela realidade.

Caso exemplar é a varguista Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), de 1943, aprovada ainda na ditadura do Estado Novo, contaminada pelo fascismo de Mussolini. Não é por acaso que as relações trabalhistas no Brasil são de conflito, porque o Estado tenta normatizar tudo. Talvez fosse possível no Brasil daqueles tempos. Na globalização, nem pensar.

Chile: da revolução à democracia - Alberto Aggio

Gramsci e o Brasil, setembro de 2013.

Uma coluna de fumaça espessa e escura levantou-se na área central de Santiago do Chile na manhã de uma terça-feira, 11 de setembro de 1973. Era um estranho acontecimento. Não parecia um incêndio qualquer, mas algo mais grave e ameaçador, especialmente porque minutos antes foi possível ouvir o ruído dos caças da Força Aérea do Chile em voos rasantes sobre o centro da cidade, onde fica o Palácio La Moneda. O que ocorria não era fortuito.

O governo do socialista Salvador Allende chegava ao fim com seu suicídio no interior do palácio, que estava sendo bombardeado. O golpe militar e o regime autoritário que se instaurou em seguida alterariam profundamente a história contemporânea do Chile. Foi derrubado não apenas o governo da Unidade Popular (UP), que Allende encabeçava, mas suprimida a democracia em todos os aspectos da sociedade chilena.

O presidente deposto, que assumira o mandato em novembro de 1970, queria construir o socialismo por meio de mecanismos democráticos. Através de decretos do Executivo, Allende realizava estatizações e, em alguns momentos, procurou também fazer alianças no Parlamento com a Democracia Cristã (DC), um partido considerado de centro. Para ele e parte importante da esquerda de então, socialismo significava poder popular e estatização. Mas havia vertentes da esquerda que se opunham às vias institucionais. Fortemente influenciados pela Revolução Cubana, amplos setores da UP e do Movimiento de Izquierda Revolucionaria (MIR) procuraram acirrar as contradições. Queriam acelerar as mudanças, pressionando o governo. As bases sociais mobilizadas por esses setores buscavam resolver a chamada “questão do poder” para implantar mais rapidamente o socialismo.

Cuándo de Chile - Pablo Neruda

Oh Chile, largo pétalo
de mar y vino y nieve,
ay cuándo
ay cuándo y cuándo
ay cuándo
me encontraré contigo,
enrollarás tu cinta
de espuma blanca y negra en mi cintura,
desencadenaré mi poesía
sobre tu territorio.

Hay hombres
mitad pez, mitad viento,
hay otros hombres hechos de agua.
Yo estoy hecho de tierra.
Voy por el mundo
cada vez más alegre:
cada ciudad me da una nueva vida.
El mundo está naciendo.
Pero si llueve en Lota
sobre mí cae la lluvia,
si en Lonquimay la nieve
resbala de las hojas
llega la nieve donde estoy.
Crece en mí el trigo oscuro de Cautín.
Yo tengo una araucaria en Villarrica,
tengo arena en el Norte Grande,
tengo una rosa rubia en la provincia,
y el viento que derriba
la última ola de Valparaiso
me golpea en el pecho
con un ruido quebrado
como si allí tuviera
mi corazón una ventana rota.

El mes de octubre ha llegado hace
tan poco tiempo del pasado octubre
que cuando éste llegó fue como si
me estuviera mirando el tiempo inmóvil.
Aquí es otoño. Cruzo
la estepa siberiana.
Día tras día todo es amarillo,
el árbol y la usina,
la tierra y lo que en ella el hombre nuevo crea:
hay oro y llama roja,
mañana inmensidad, nieve, pureza.

En mi país la primavera
viene de norte a sur con su fragancia.
Es como una muchacha
que por las piedras negras de Coquimbo,
por la orilla solemne de la espuma
vuela con pies desnudos
hasta los archipiélagos heridos.
No sólo territorio, primavera,
llenándome, me ofreces.
No soy un hombre solo.
Nací en el sur. De la frontera
traje las soledades y el galope
del último caudillo.
Pero el Partido me bajó del caballo
y me hice hombre, y anduve
los arenales y las cordilleras
amando y descubriendo.

Pueblo mío, verdad que en primavera
suena mi nombre en tus oídos
y tú me reconoces
como si fuera un río
que pasa por tu puerta?

Soy un río. Si escuchas
pausadamente bajo los salares
de Antofagasta, o bien
al sur, de Osorno
o hacia la cordillera, en Melipilla,
o en Temuco, en la noche
de astros mojados y laurel sonoro,
pones sobre la tierra tus oídos,
escucharás que corro
sumergido, cantando.

Octubre, oh primavera,
devuélveme a mi pueblo.
Qué haré sin ver mil hombres,
mil muchachas,
qué haré sin conducir sobre mis hombros
una parte de la esperanza?
Qué haré sin caminar con la bandera
que de mano en mano en la fila
de nuestra larga lucha
llegó a las manos mías?
Ay Patria, Patria,
ay Patria, cuándo
ay cuándo y cuándo
cuándo
me encontraré contigo?

Lejos de ti
mitad de tierra tuya y hombre tuyo
he continuado siendo,
y otra vez hoy la primavera pasa.
Pero yo con tus flores me he llenado,
con tu victoria voy sobre la frente
y en ti siguen viviendo mis raíces.

Ay cuándo
encontraré tu primavera dura,
y entre todos tus hijos
andaré por tus campos y tus calles
con mis zapatos viejos.
Ay cuándo
iré con Elías Lafferte
por toda la pampa dorada.
Ay cuándo a ti te apretaré la boca,
chilena que me esperas,
con mis labios errantes?
Ay cuándo
podré entrar en la sala del Partido
a sentarme con Pedro Fogonero,
con el que no conozco y sin embargo
es más hermano mío que mi hermano.
Ay cuándo
me sacará del sueño un trueno verde
de tu manto marino.
Ay cuándo, Patria, en las elecciones
iré de casa en casa recogiendo
la libertad temerosa
para que grite en medio de la calle.
Ay cuándo, Patria,
te casarás conmigo
con ojos verdemar y vestido de nieve
y tendremos millones de hijos nuevos
que entregarán la tierra a los hambrientos.

Ay Patria, sin harapos,
ay primavera mía,
ay cuándo
ay cuándo y cuándo
despertaré en tus brazos
empapado de mar y de rocío.
Ay cuando yo esté cerca
de ti, te tomaré de la cintura,
nadie podrá tocarte,
yo podré defenderte
cantando,
cuando
vaya contigo, cuando
vayas conmigo, cuándo
ay cuándo.