sábado, 14 de janeiro de 2017

Congresso dos EUA avança para enterrar Obamacare

Obamacare na UTI

• Republicanos começam a pôr fim a programa de saúde, mas governadores do partido resistem

- O Globo

20 milhões Número de pessoas que podem ficar sem seguro de saúde se Obamacare for revogado

39 Número de estados que aderiram ao programa federal. Os 11 restantes e o Distrito de Colúmbia têm esquema próprio

US$ 75 Preço médio do seguro de saúde por pessoa, por mês

8,6% É o percentual de americanos que não estão cobertos por seguros de saúde. Antes do Obamacare, eram 15,7%

WASHINGTON - Uma das principais promessas de campanha do magnata republicano Donald Trump começou a tomar forma ontem: acabar com o Obamacare — o plano de saúde pública elaborado pelo mandatário americano de saída, Barack Obama. Seguindo a aprovação prévia no Senado, na quinta-feira, a Câmara dos Representantes dos Estados Unidos aprovou, ontem, por 227 votos a 198, a resolução que dá o primeiro passo para o fim do Obamacare, instruindo as principais comissões do Legislativo a redigirem uma lei que revogue, até 27 de janeiro, o projeto de saúde de Obama. Ambas as Casas têm hoje maioria republicana. Como já era esperado, nenhum democrata apoiou a iniciativa.

Mesmo antes da aprovação da revogação pelo Congresso, o agora presidente eleito Trump já festejava no Twitter: “O ‘Unaffordable' Care Act em breve será história!”, fazendo um trocadilho com o nome formal do programa, chamando-o de “inacessível”. O Obamacare, que obriga os americanos a contratarem planos de saúde sob pena de multa, mas fornece subsídios aos mais carentes, acabou virando objeto de uma guerra política entre republicanos e democratas. Os primeiros afirmam tratar-se de uma intromissão excessiva do Estado na vida das pessoas, com um alto custo bancado com dinheiro público que não se justificaria pelo benefício proporcionado à população, além dos aumentos nos preços e franquias — algumas grandes seguradoras abandonaram o sistema. Já os democratas acusam os republicanos de se precipitarem em eliminar uma lei que permitiu estender a cobertura de saúde a 20 milhões de americanos.

A apartidária Comissão por um Orçamento Federal Responsável afirmou, no começo do mês, que revogar totalmente o Obamacare custaria cerca de US$ 350 bilhões aos EUA na próxima década. Já os republicanos dizem que, com uma boa estratégia para substituir o plano de saúde pública, os gastos do governo serão reduzidos, além de os estados ganharem mais controle dos programas de saúde.

—É o primeiro passo crítico para dar alívio aos americanos que lutam contra esta lei — afirmou o presidente da Câmara, o republicano Paul Ryan. O Obamacare foi promulgado há sete anos — sempre alvo de objeções republicanas — num esforço para expandir a cobertura a pessoas sem seguro. Nos últimos anos, a Câmara votou mais de 60 vezes para revogar ou alterar o Obamacare, mas os republicanos não tinham esperança de sucesso com Obama na Presidência. A resolução aprovada não precisa de sanção presidencial, pois faz parte de um processo orçamentário interno do Congresso. Mas, uma vez que a revogação do Obamacare seja redigida, ambas as Casas terão de aprová-la, e a assinatura presidencial será necessária. Mas, apesar da ação rápida no Congresso, os republicanos estão longe de chegar a consenso sobre como substituir o Obamacare. O próprio Trump admitiu que o processo poderá durar dois anos.

Governadores republicanos também estão apreensivos: pelo menos cinco dos 16 que expandiram o programa de saúde com recursos federais defendem a permanência do Obamacare, e alertam os líderes do partido sobre a consequências desastrosas se a lei for revogada sem uma substituição imediata. São eles Charlie Baker, de Massachusetts; Rick Snyderof, do Michigan; John Kasichof, de Ohio; Asa Hutchinson, de Arkansas; e Brian Sandovalof, de Nevada. E analistas avaliam que outros podem se juntar ao grupo, na tentativa de influenciar os legisladores do partido. Num momento em que os democratas não têm maioria em nenhuma das Casas do Legislativo, a disputa entre governadores e congressistas republicanos torna-se a batalha real em torno do Obamacare. Ainda ontem, o presidente da Câmara, Paul Ryan, disse que o Obamacare estava em colapso e que a ação era urgente:

— As franquias estão muito altas. Temos que intervir antes que as coisas piorem. Isso não é nada além de um resgate do sistema de saúde.

Ryan foi imediatamente rebatido pela líder democrata, Nancy Pelosi:

— A taxa de crescimento nos custos de saúde em nosso país tem sido constantemente diminuída pelo Obamacare. A escolha do Congresso é entre o Obamacare ou o caos.

Ryan ainda passou por uma saia-justa durante um evento promovido pela rede CNN, quando um homem que sobreviveu a um câncer criticou o congressista pela tentativa de acabar com o projeto de saúde pública.

— Por causa do Obamacare, estou aqui hoje. Eu devo ao Obamacare a possibilidade de poder comprar meu próprio seguro — afirmou o comerciante Jeff Jeans, da plateia do evento, dirigindo-se a Ryan, no palco.

Jeans se identificou como um republicano de longa data e disse que antes se opunha à lei. Mas mudou de opinião quando recebeu um diagnóstico de apenas seis semanas de vida por causa do câncer. Dono de um pequeno negócio, ele não tinha um plano fornecido pelo trabalho, como grande parcela dos americanos. E com uma doença pré-existente, provavelmente teria dificuldades em obter cobertura. Ryan disse a Jeans que os republicanos pretendem substituir o Obamacare por “algo melhor”. Ao fim, o comerciante concluiu:

— Quero agradecer ao presidente Obama do fundo do meu coração, porque eu estaria morto se não fosse por ele.

Ontem, o presidente da Comissão de Inteligência do Senado indicou que vai abrir investigação sobre possíveis contatos entre a campanha de Trump e o governo russo, revertendo uma decisão contrária anunciada na véspera.

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