quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Decisão acertada - Míriam Leitão

- O Globo

O Copom tomou uma decisão ousada, mas acertada, ontem, quando derrubou em 0,75 ponto percentual a taxa de juros. Permanece havendo incertezas fiscais e dúvidas nas políticas interna e internacional. Contudo, a economia está mais fraca do que se imaginava que estivesse neste começo de 2017 e a inflação teve um comportamento muito favorável nos últimos meses.

Quando votou ontem na aceleração forte da queda dos juros, o Banco Central estava com o conforto de saber que o ano passado terminou com a inflação dentro do intervalo de flutuação permitido para a meta. Um ano que havia começado com a taxa em quase 11%. O país está vencendo um surto inflacionário grave que levou a taxa a dois dígitos e em alguns meses, talvez maio, deverá estar no centro da meta. E essa trajetória da desinflação foi feita em meio a turbulências em que o país teve uma troca de governo e de comando do BC.

Houve um momento assustador em 2015, quando a economia já estava em recessão e a inflação continuava subindo rumo aos dois dígitos. O trabalho de correção da política anti-inflacionária começou a ser feito pelo ex-ministro Joaquim Levy, que combateu alguns dos erros da equipe do ministro Guido Mantega. Um desses foi a repressão de preços, a forma mais perigosa de tentar controlar a inflação. Levy corrigiu as tarifas de energia, o que elevou o IPCA num primeiro momento, mas era a única forma de começar a pôr ordem na casa.

A inflação não chegou a dois dígitos por acaso. Houve uma sucessão de equívocos cometidos pelo governo Dilma, como a leniência com a elevação dos preços. Por atos e palavras, passou a ideia de que o objetivo não era 4,5% mas sim 6,5%. Isso fez a taxa ficar permanentemente alta e estourar o teto em vários momentos. Outro erro foi a interferência velada na política monetária, que enfraqueceu o Banco Central.

O pior equívoco foi aumentar muito as despesas em época em que as receitas haviam parado de crescer e tentar esconder isso através das maquiagens fiscais. As sucessivas alterações na forma de calcular o déficit, e as manobras para escondê-lo, erodiram a confiança na política fiscal. No fim, o Tesouro perdeu a credibilidade, e os economistas passaram a fazer uma contabilidade própria para saber a real situação das contas públicas.

Em 2011, a então presidente Dilma disse que não combateria a inflação com o crescimento zero. Essa ideia é antiga no Brasil e já havia fracassado nos anos 1990, na hiperinflação. A aceitação de “alguma” inflação para preservar o crescimento sempre produz efeito bumerangue. E foi o que aconteceu de novo. O país teve o inverso do que a presidente Dilma prometeu: o crescimento foi abaixo de zero e a inflação foi aos dois dígitos quatro anos depois.

Uma taxa de juros de 13% ainda é alta demais para um país com uma recessão tão severa. A projeção é que o ciclo de corte continue, apesar das incertezas da conjuntura. Permanece, por exemplo, o risco fiscal. No ano passado, o déficit público foi recorde e este ano foi projetado para ser apenas um pouco menor. A negociação com os estados abrirá outra frente de gastos federais. O governo do Rio quer suspender por três anos o pagamento da dívida. O que não for pago será acumulado no principal, por isso teoricamente o governo pode dizer que não foi um gasto, já que seus ativos aumentarão. Mas o risco que se corre agora é de um calote sequencial dos estados no Tesouro.

A enorme incerteza política vivida pelo país e a incógnita externa causada pela mudança de governo nos Estados Unidos limitam a queda dos juros. Mesmo assim, já se começa a prever que a Selic pode terminar o ano em um dígito.

O Copom fez bem em acelerar o corte das taxas de juros. A economia está demorando mais do que o imaginado para começar a recuperação, a inflação teve um desempenho melhor do que o calculado meses atrás. A queda do dólar ajudou a derrubar mais a inflação, abrindo espaço para o relaxamento da política monetária.

O mercado recebeu bem a notícia, e a previsão é de um dia positivo hoje nas bolsas. Ontem mesmo, logo após a decisão do Copom, Bradesco e Banco do Brasil anunciaram redução das suas taxas de juros. Tudo isso ajuda a aliviar as famílias e empresas na difícil conjuntura que o país atravessa.

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