segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Indústria do Rio vive sua pior fase

A indústria de transformação fluminense enfrenta seu pior momento em três décadas, segundo a Firjan. De 2012 a 2016, acumula recuo na produção de 21%, o dobro da queda registrada entre 1994 e 2000, que fora de 10,4%

Derrocada industrial
• Setor de transformação do Rio recua 21% desde 2012, pior desempenho em três décadas

Daiane Costa | O Globo

A indústria de transformação fluminense vive sua pior fase das últimas três décadas. Com a produção sem crescer há três anos, o segmento acumula recuo de 21% de 2012 a 2016, segundo levantamento da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan). Na avaliação de economistas, a crise dos últimos anos é um retrato da recessão vivida pelo país, que derrubou a demanda e paralisou os investimentos. Nestes cinco anos, a queda do setor é o dobro da registrada entre 1994 e 2000, quando havia acumulado perda de 10,4%, o que era considerado até então seu pior desempenho.

Para a Firjan, o cenário negativo foi potencializado pela carga tributária elevada do setor — quase metade de tudo que é produzido pela indústria é direcionado ao pagamento de impostos. A queda histórica ocorre após o período de maior bonança da indústria de transformação no estado. Entre 2001 e 2011, a atividade cresceu 14%.

— Certamente o desempenho da indústria do Rio de Janeiro está associado ao desempenho geral da indústria brasileira, que, em 2015, encolheu 8,3% e fechou no negativo em 2016 novamente. Os principais segmentos industriais afetados pela crise são também os que têm peso importante na economia do estado: cadeia de óleo e gás, a da construção civil e a produção de veículos automotores — analisa Guilherme Mercês, economista-chefe da Firjan.

Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), ressalta que um dos agravantes dessa crise é que alguns dos setores fortemente afetados fornecem insumos para empresas de todo o país. É o caso dos ramos petroquímico e químico. Juntamente com a indústria extrativa (petróleo e gás), eles representam a principal atividade industrial do estado:

— Os problemas de gestão da Petrobras não são o resumo da ópera. E esse atoleiro não se restringe ao Rio de Janeiro. A recuperação do desempenho industrial do Rio passa pela recuperação do país todo porque o estado é fornecedor de insumos. A retomada da economia é fundamental e dará um horizonte, um indicativo para tornar o setor mais dinâmico novamente.

EM 2017, AJUDA DA INDÚSTRIA EXTRATIVA
Para 2017, as perspectivas são de paralisação da queda da produção da indústria de transformação do estado. Segundo Mercês, haverá um respiro de 0,1%, devido a uma melhora na atividade extrativa, cujas expectativas estão ancoradas numa retomada dos projetos da Petrobras, com impacto positivo nas indústrias metal-mecânica e naval, e na demanda da indústria geral, devido à trajetória de queda dos juros.

A previsão da entidade é que, no primeiro semestre desse ano, o setor já registre aumento das horas trabalhadas e do nível de uso da capacidade instalada que, segundo o dado mais recente, de novembro, estava em 74,2%, o segundo menor nível para o mês da série histórica da Firjan, iniciada em 2003. Só não foi pior do que em 2015, quando a indústria de transformação fluminense usou, em média, apenas 71,8% da capacidade instalada em novembro. O dado atual também é inferior à média do setor no estado, que está em 80,4%. Para Mercês, se confirmada a previsão, será um indicativo de que a crise foi estancada:

— Parar de cair é um bom sinal. Significa que já não é preciso cortar custos, demitir. A indústria extrativa já caminha no campo positivo por causa da reestruturação da Petrobras. Como é um dos carros-chefe da economia do estado, ajudará a produção industrial a parar de cair.

André Macedo, gerente da Coordenação de Indústria do IBGE, destaca que, quando se observa o setor como um todo, a indústria extrativa tem um comportamento positivo destoante:

— Todos os demais vêm num movimento de queda e com viés de queda, acompanhando o nível do Brasil.

O empresário industrial fluminense continua pessimista. Levantamento mais recente, de janeiro, mostra que o índice de confiança medido pela Firjan (ICEI-RJ) está em 43,5 (abaixo de 50, o que indica pessimismo) e abaixo do indicador nacional, cuja média é de 50,1 pontos. Desde abril de 2015, esse indicador do estado apresenta pessimismo maior do que o brasileiro. Mercês explica que esse descolamento se mantém a situação fiscal do estado começou a se agravar, enquanto o governo federal começou a traçar planos para combater os problemas da União, anunciando a PEC do teto de gastos e a reforma da Previdência. O resultado de janeiro, no entanto, interrompeu uma série de três quedas seguidas do indicador. Foi a primeira vez, na série histórica iniciada em 2010, que o ICEIRJ avançou em janeiro, na comparação com dezembro. De acordo com o índice, essa melhora ocorreu por causa do otimismo com o cenário econômico daqui a seis meses.

Essa mistura de pessimismo com a realidade atual e expectativa positiva em relação ao segundo semestre do ano fica clara numa conversa com industriais que têm amargado perdas com a crise. Marcelo Oazen, diretor da Plastlab, empresa de Madureira produtora de 2,5 mil itens diferentes de plástico, diz que o faturamento da empresa, nos últimos sete meses, caiu 40% devido à queda na demanda.

— Sou uma indústria que fornece para outras indústrias, hospitais e confeitarias. Todo mundo sofreu com a crise. Tive de baixar os preços dos meus produtos para não perder mais clientes. Está bastante complicado. Isso tem tudo a ver com a recessão, que secou o dinheiro de todo mundo, e com a insegurança jurídica e o ambiente de negócios que se deteriorou muito no estado — diz Oazen, fazendo referência à liminar da Justiça que proibiu o governo estadual de renovar ou conceder incentivos fiscais a empreporque sas para que elas permaneçam ou se instalem no estado.

Para não demitir nenhum dos 80 funcionários nem diminuir o ritmo de produção, o empresário trouxe alguns serviços que eram terceirizados para dentro da empresa:
— A maior parte do meu pessoal tem muitos anos de casa. É um capital que não conseguirei repor lá na frente.

CONCESSÕES PODERIAM ALIVIAR CRISE
Marcelo Kaiuca, sócio-proprietário da Multibloco e presidente da Associação das Empresas do Distrito Industrial de Queimados, opera hoje com apenas metade da capacidade instalada de sua fábrica, produtora de blocos, canaletas, meios-fios, pisos e tubos de concreto. Como depende da construção civil para escoar a produção, sentiu em cheio a crise que também atingiu o setor imobiliário. No auge da produção, impulsionada pelas obras dos eventos esportivos internacionais que o Rio sediou nos últimos anos, chegou a usar 90%. Reclama que as obras inacabadas ou travadas no estado e no município, como a extensão da Linha 4 do metrô até a Gávea e a duplicação do trecho da Serra das Araras na Via Dutra (BR-116), estão atravancando a retomada do mercado de trabalho e da indústria no estado.

— Estamos há 30 anos no mercado. Já passamos por todos os planos econômicos e sempre víamos luz no fim do túnel. Mas essa crise é a pior de todas. Pode ser o ano da retomada da indústria, mas taxa de juros não se baixa por decreto e ela ainda tem de cair muito para ter efeito positivo, e as reformas ainda terão de ser votadas — avalia Kaiuca, que precisou reduzir o quadro de funcionários, que já foi composto por 170 pessoas e hoje se resume a 120.

Nas contas da Firjan, há 33 projetos de concessão de competência do estado e 93 de competência municipal que podem atrair, respectivamente, investimentos na ordem de R$ 22,4 bilhões e R$ 18,7 bilhões. Além de tirar essas concessões do papel, a entidade defende que a solução para a crise passe pela diminuição da carga tributária, da manutenção das políticas locais de incentivos fiscais para atrair mais empresas e aumentar a arrecadação.

Em 2016, 14.439 empresas foram extintas no Estado do Rio, o pior cenário em pelo menos 17 anos. Com isso, o saldo entre abertura e fechamento foi de apenas 27 mil empresas, o menor desde 2007 e próximo ao mínimo histórico registrado no estado (22,5 mil em 2003). Os dados são da Junta Comercial do Estado do Rio de Janeiro.

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