sábado, 4 de fevereiro de 2017

À venda, mas não agora

• Estado diz que privatização da Cedae só começa a sair do papel daqui a um ano e meio

Selma Schmidt | O Globo

Um ano e meio é o prazo estimado pelo secretário estadual de Fazenda, Gustavo Barbosa, para o lançamento do edital de venda da Cedae, após uma eventual aprovação do projeto de lei que autoriza a privatização da companhia. A proposta foi enviada anteontem pelo governador Luiz Fernando Pezão à Assembleia Legislativa (Alerj), e deverá ser discutida em plenário na próxima terça-feira. No entanto, transformá-la em lei e conseguir implementá-la não será uma missão fácil para o Palácio Guanabara. Servidores prometem fazer protestos de terça a quintafeira nas imediações da Alerj, e deputados já estão se mobilizando contra a desestatização da empresa.

A privatização da Cedae é parte de um acordo firmado no fim do mês passado entre a União e o estado, cujo objetivo é socorrer financeiramente o Rio. O documento prevê a suspensão do pagamento das dívidas com o governo federal, bancos e organismos internacionais por três anos, além da autorização para contrair novos empréstimos de até R$ 3,5 bilhões.

— A venda da Cedae é vital para o acordo do estado com a União. Em três anos, postergar as dívidas significaria um alívio de R$ 26 bilhões — analisa Barbosa. — Além disso, com o empréstimo previsto nesse acordo e com os cerca de R$ 3 bilhões que pretendemos arrecadar com a venda antecipada de royalties, já aprovada, conseguiremos equilibrar as contas do estado ainda em 2017.

No mesmo projeto da privatização, o governo pede autorização para contrair empréstimos. No entanto, como atingiu o teto de endividamento, o Palácio Guanabara precisará conseguir aprovar uma liminar no Supremo Tribunal Federal, até que o Congresso Nacional analise a possibilidade de mudanças na Lei de Responsabilidade Fiscal.

Questionado sobre o valor da Cedae, o secretário de Fazenda disse que ainda será fixado, mas ele cita avaliações feitas há aproximadamente quatro anos que estimavam seu preço entre R$ 4 bilhões e R$ 8 bilhões. Uma fonte do governo, no entanto, fala em R$ 7 bilhões.

PROMESSA DE INVESTIMENTOS EM CAXIAS
Em pé de guerra com a Cedae, Duque de Caxias, um dos 64 municípios atendidos pela companhia, ameaçou romper seu contrato com a empresa. Em uma reunião ontem com representantes da companhia, o prefeito Washington Reis optou por uma trégua: a companhia se comprometeu a investir R$ 600 milhões em obras, em três anos, visando à melhora no abastecimento de água no município. O programa será gerenciado pela prefeitura, que, em janeiro, criou a chamada Central de Água e Saneamento de Duque de Caxias (Casduc).

Apesar de o presidente da Alerj, Jorge Picciani (PMDB), manifestar otimismo em relação à tramitação do projeto de privatização da Cedae na Casa, a bancada de oposição começa a se articular para derrubá-lo. Flávio Serafini (PSOL) está convocando parlamentares contrários à proposta para uma reunião na segunda-feira:

— Será uma reunião suprapartidária. Os deputados do PSOL votarão contra, e muitos parlamentares de outros partidos farão o mesmo. Aprovar esse projeto, que é muito vago, seria dar um cheque em branco ao Executivo. A Cedae é a empresa de saneamento mais lucrativa do Brasil. Além disso, as duas privatizações mais recentes feitas pelo estado, a do Maracanã e a das barcas, não deram certo. Estão querendo devolver.

Para o deputado Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB), o projeto deverá receber um grande número de emendas. Ele critica que tenham sido incluídos, na mesma proposta, pedidos de autorização para o estado contrair um empréstimo de R$ 3,5 bilhões e de alienação das ações da Cedae:

— Se o projeto não for aprovado, cai tudo junto. Se passar, o governo respira por mais algum tempo. Um suspiro, porque empréstimo não é solução para os problemas do estado.

Já o deputado Comte Bittencourt (PPS) apresentará uma emenda na qual defenderá uma outorga onerosa — um pagamento inicial para a concessão dos serviços de distribuição de água e tratamento de esgoto por um determinado prazo:

— Defendo um formato diferente, um que não seja o da venda da companhia. O estado preserva a empresa pública, que atua em uma área estratégica que é a de captar, tratar e distribuir água. Quero abrir com o governo um debate sobre uma alternativa antes da venda definitiva da Cedae.

Empresa de economia mista, majoritariamente do estado, a Cedae vem dando lucro desde 2012. Em 2015, o ganho foi de R$ 248,8 milhões (45,9% menor que o ano anterior), segundo o último balanço publicado pela companhia. No ano passado, de acordo com informações obtidas por Flávio Serafini, chegou a R$ 380 milhões, sendo que R$ 68 milhões foram repassados em dividendos ao estado.

A Cedae atua em 64 municípios e tem 5.940 funcionários, todos celetistas, que poderão, de acordo com Gustavo Barbosa, ser assumidos pelo eventual comprador da companhia.

De acordo com o projeto do Executivo, se a privatização for aprovada, o estado terá seis meses, prorrogáveis por igual período, para a contratação instituições financeiras federais — BNDES, Banco do Brasil ou Caixa Econômica — que ficarão responsáveis pela avaliação e pela estruturação da operação de alienação das ações da Cedae.

— Queremos contratar essas instituições o mais rapidamente possível. Elas é que farão a avaliação dos ativos e a modelagem da venda — diz Barbosa, acrescentando que não foi fixado um prazo para esse estudo ficar concluído.

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