sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

Ministro sub judice

• Ontem à noite, Celso de Mello deu 24 horas para Temer explicar nomeação de Moreira

Carolina Brígido, Simone Iglesias, Eduardo Barretto Juliana Castro | O Globo

-BRASÍLIA E RIO- O ministério criado para abrigar o homem forte do presidente Michel Temer viveu ontem dia de vaivém judicial. Em 24 horas, o peemedebista Moreira Franco foi ministro e ex-ministro. Sua situação no governo é indefinida desde a última quarta-feira, quando uma liminar de um juiz federal em Brasília suspendeu sua nomeação para o cargo de ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República. Ontem pela manhã, o Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, em Brasília, revogou a decisão, permitindo que ele voltasse ao posto. Em seguida, nova reviravolta: uma juíza federal do Rio de Janeiro concedeu outra liminar impedindo que ele seja ministro. À noite, mais uma liminar, da Justiça Federal do Amapá, também suspendeu a nomeação. Também à noite, o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, deu 24 horas para Temer explicar a nomeação.

Existem no STF duas ações, apresentadas pelo PSOL e pela Rede, contra a nomeação de Moreira Franco. Ontem, Celso de Mello prometeu julgá-las até hoje. Ele já recebeu um memorial sobre o assunto da advogada-geral da União, Grace Maria Fernandes. Antes de decidir, Celso de Mello vai levar em consideração os argumentos do governo e da oposição. Ele explicou que os juízes que deram liminar até agora estão no exercício correto da função, porque eram ações populares. O foro desse tipo de ação é a primeira instância da Justiça Federal.

— Os juízes de primeiro grau têm competência em sede de ação popular. Mandado de segurança obviamente deve ser no Supremo, porque o ato apontado como coator emana do presidente da República — declarou.

Nas ações ajuizadas no STF, os partidos argumentam que a nomeação não tem a finalidade de aprimorar o corpo técnico da equipe de Michel Temer, mas sim de dar a Moreira Franco o direito ao foro especial. O nome do político foi citado na delação premiada dos executivos da Odebrecht, o que poderá gerar novos inquéritos na Lava-Jato.

“O ato praticado implica intervenção direta, por ato do presidente da República, em órgãos do Poder Judiciário, com deslocamento de competência e obstrução da Justiça. As investigações contra Moreira Franco, que tramitam perante a 13ª Vara Federal de Curitiba, seriam deslocadas para a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, instância onde tramitam as investigações da Lava-Jato dos privilegiados pelo foro”, argumenta o PSOL na ação.

JUÍZA DIZ QUE SEGUE ENSINAMENTOS DE TEMER
Com a situação profissional em suspenso, Moreira Franco suspendeu a agenda de trabalho e ficou em casa à espera de uma definição jurídica. Um assessor presidencial disse ao GLOBO que a expectativa de Michel Temer era de que Celso de Mello restabelecesse Moreira no posto de ministro. Temer chegou a ser aconselhado por auxiliares a sugerir uma licença a Moreira até que sua situação se resolvesse. No entanto, o governo prefere apostar numa definição do Supremo.

Quando soube da segunda liminar suspendendo a atuação de Moreira, Temer se mostrou “indignado”, segundo relatos de auxiliares, com a justificativa da juíza Regina Coeli Formisano, da 6ª Vara Federal do Rio. Em sua decisão, em tom irônico, a juíza pediu “perdão” a Temer pela “insurgência”, mas alegou que estava sendo leal a lições de Direito aprendidas com ele. Temer chegou a pensar em responder à juíza Regina Coeli, mas acabou sendo contido pelos auxiliares.

“Peço, humildemente, perdão ao Presidente Temer pela insurgência, mas por pura lealdade às suas lições de Direito Constitucional. Perdoe-me por ser fiel aos seus ensinamentos ainda gravados na minha memória, mas também nos livros que editou e nos quais estudei. Não só aprendi com elas, mas, também acreditei nelas e essa é a verdadeira forma de aprendizado”, escreveu a juíza em sua decisão.

Regina Coeli foi um dos magistrados que suspendeu a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao cargo de ministro da Casa Civil, em março do ano passado. A juíza viu na nomeação de Moreira o mesmo propósito de garantir foro privilegiado: “Tudo leva a esse entendimento, especialmente pelo fato de que referida recriação de ministério já extinto, em cumprimento a promessas de redução da estrutura estatal, ter-se dado de forma açodada e através de Medida Provisória, que tem por pré-requisito providências urgentes e inadiáveis”.

A magistrada disse ter conhecimento da distribuição de diversas ações similares por todo o país pedindo a suspensão da nomeação e comparou a atitude de Temer ao nomear Moreira com a de Dilma ao indicar Lula.

“Por outro lado, também não se afigura coerente, que suas promessas ao assumir o mais alto posto da Republica sejam traídas, exatamente por quem as lançou no rol de esperança dos brasileiros, que hoje encontram-se indignados e perplexos ao ver o seu Presidente, adotar a mesma postura da ex-presidente impedida e que pretendia também blindar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva”, anotou a juíza.

Mais cedo, em discurso em evento da Caixa Econômica Federal, Temer afirmou que é preciso distensionar as relações entre Executivo, Legislativo e Judiciário.

— Não pode ter democracia sem que haja diálogo com os poderes constituídos. Se não dialogar adequadamente, tiver boa relação com Judiciário, viola-se o princípio constitucional do suporte ao Estado brasileiro. A harmonia está a significar que os Três Poderes governam e é preciso sempre distensão entre os Três Poderes — afirmou o presidente.

“ABUSO IMORAL E ESCANCARADO”, DIZ JUIZ
À noite, o juiz Anselmo Gonçalves da Silva, da 1ª Vara Federal da Macapá, também concedeu liminar para suspender a nomeação de Moreira. A decisão do juiz de Macapá foi tomada a pedido do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Para o parlamentar, a nomeação foi um episódio de “abuso imoral e escancarado” em que o presidente Michel Temer fez a nomeação para poder dar foro especial a Moreira Franco. Ele escreveu que o quadro é de “resplandecente desvio de finalidade”.

O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, afirmou que não há nada de errado na nomeação, pois Moreira já vinha atuando desde maio do ano passado no governo.

— Ele era ministro de fato. Temos que cumprir as decisões judiciais, não significa dizer que a gente concorda por inteiro. Se em cada medida judicial tivermos constrangimento... temos muitas medidas judiciais que não são exatamente as esperadas. Acreditamos que em grau de recurso acabe preponderando a limpidez, a plena serenidade das decisões do presidente Michel Temer.

Quanto à preocupação do governo com a possibilidade de se ver em meio a centenas de ações judiciais pelo país pedindo o afastamento de Moreira Franco do cargo, Eliseu Padilha minimizou:

— Vamos derrubando as liminares.

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