quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

Síndrome de pânico - Luiz Carlos Azedo

- Correio Braziliense

O que está acontecendo no Senado é uma espécie de transtorno de ansiedade, no qual ocorrem crises inesperadas de desespero e medo intenso

O senador Romero Jucá (PMDB-RR), presidente do PMDB, a pretexto de garantir isonomia de tratamento, apresentou projeto de emenda constitucional estendendo aos presidentes e vices dos três poderes a prerrogativa dada ao presidente da República de não responder por fatos anteriores ao mandato. Ou seja, abriu a nova temporada de propostas com objetivos de blindar a elite política do país contra as delações premiadas da Odebrecht. A primeira foi no final do ano passado, quando se tentou aprovar uma anistia ao caixa 2 eleitoral na Câmara e uma nova lei de abuso de autoridade, no Senado.

Depois da eleição do senador Edison Lobão (PMDB-MA) para a presidência da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que sabatinará o ministro licenciado da Justiça, Alexandre de Moraes, essa foi a segunda iniciativa importante contra a Operação Lava-Jato no Senado. Assim, vai se criando o mesmo clima de confrontação com o Judiciário e o Ministério Público Federal que havia se instalado na Casa no final do ano passado, embora o novo presidente da Casa, senador Eunício de Oliveira (PMDB-CE), não tenha o mesmo protagonismo que tinha o senador Renan Calheiros (PMDB-ASL), que o antecedeu e agora lidera a bancada do PMDB. Eunicio teve a sagacidade, porém, de pedir a Jucá para retirar a emenda à Constituição.

Uma lei básica da navegação diz que duas embarcações em rumos cruzados estão em rota de colisão quando a marcação é constante e a distância diminui. É o que está acontecendo já na segunda semana de funcionamento do Senado. Se não houver uma correção de rumo, o naufrágio será inevitável. Enquanto o presidente Temer tenta construir uma agenda positiva para seu governo, seus aliados no Senado parecem não se dar conta de que essa estratégia para sepultar a Operação Lava-Jato não tem a menor chance de dar certo.

O recado de que é melhor levar o barco devagar em meio ao nevoeiro, como no velho samba de Paulinho da Viola, foi dado ontem pelo Supremo Tribunal Federal (STF), cujo plenário, por 8 a 1, acompanhou o relator da Lava-Jato, ministro Luiz Édson Fachin, e manteve a prisão preventiva do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), conforme decisão do juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba. O único voto contrário foi o do ministro Marco Aurélio, invocando o princípio do transitado em julgado, para criticar “prisões prolongadas”.

O que está acontecendo no Senado é uma espécie de síndrome de pânico por causa da Lava-Jato. O distúrbio é considerado um transtorno de ansiedade no qual ocorrem crises inesperadas de desespero e medo intenso de que algo ruim aconteça, mesmo que não haja motivo algum para isso ou sinais de perigo iminente. No caso, porém, os motivos são verdadeiros e imediatos. A lista de senadores investigados na operação atinge a cúpula da Casa, que se transformou numa espécie de bunker contra a operação. Com as delações premiadas da Odebrecht e a morosidade do Ministério Público Federal e do próprio Supremo, o estoque de senadores enrolados só aumenta.

Crepúsculo
As eleições majoritárias de 2018 são a grande ameaça. Cronista de seu tempo, Machado de Assis descreveu como os próceres conservadores do Império foram atropelados pelas urnas (O velho Senado, Revista Brasileira, Rio de Janeiro, 1898). Eusébio de Queirós, chefe do Partido Conservador, Itaboraí, Uruguai, Saião Lobato e outros “eram cardeais, e todos formavam o consistório” do Império, mandavam e desmandava, mas já era o crepúsculo do governo conservador. “As eleições de 1860, na capital, deram o primeiro golpe na situação; se também deram o último, não sei; os partidos nunca se entenderam bem acerca das causas imediatas da própria queda ou subida, salvo no ponto de serem alternadamente a violação ou a restauração da carta constitucional. Quaisquer que fossem, então, a verdade é que as eleições da capital naquele ano podem ser contadas como uma vitória liberal. Elas trouxeram à minha imaginação adolescente uma visão rara e especial do poder das urnas.”

Machado nos conta que sua visão sobre o Senado, ao longo de quase quatro décadas, foi se alterando “nos gestos e nas pessoas”, como nos dias de hoje: “Outras figuras vieram vindo. Além dos cardeais, os Muritibas, os Sousa e Melos, vinham os de menor graduação política, o risonho Pena, zeloso e miúdo em seus discursos, o Jobim, que falava algumas vezes, o Ribeiro, do Rio Grande do Sul, que não falava nunca, — não me lembra, ao menos (…) E após ele vieram outros, e ainda outros, Sapucaí, Maranguape, Itaúna, e outros mais, até que se confundiram todos e desapareceu tudo, coisas e pessoas, como sucede às visões.”

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