sexta-feira, 3 de março de 2017

A campanha da “santinha” - Luiz Carlos Azedo

- Correio Braziliense

Dilma Rousseff teria recebido R$ 150 milhões da Odebrecht para suas campanhas eleitorais, dos quais R$ 50 milhões foram a contrapartida à MP do Refis

A expressão “santinha do pau oco”, ainda muito popular no Brasil, é utilizada para se referir às pessoas que se fazem de boazinhas, mas não são. É o caso da ex-presidente Dilma Rousseff, que teria recebido R$ 150 milhões da Odebrecht para sua campanha eleitoral, dos quais R$ 50 milhões foram a contrapartida da Medida Provisória nº 470/2009, conhecida como MP do Refis, editada pelo governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Esse acerto teria sido feito com o ex-ministro Guido Mantega, segundo o empresário Marcelo Odebrecht.

No chamado Ciclo do Ouro (séculos XVIII e XIX), os contrabandistas utilizavam imagens de santos, ocas por dentro, para ocultar ouro em pó, moedas e pedras preciosas, que eram roubadas ou garimpadas clandestinamente. No caso da Lava-Jato, a Odebrecht utilizou contas no exterior para pagar o marqueteiro da campanha de Dilma Rousseff, João Santana, que está preso em Curitiba. Marcelo Odebrecht prestou depoimento quarta-feira no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), na ação do PSDB que pede a cassação da chapa Dilma-Temer.

Embora sigiloso, parte do depoimento vazou. Marcelo Odebrecht depôs por determinação do ministro Herman Benjamin, relator do processo de cassação da chapa Dilma-Temer no TSE. Depois de se comparar a um “bobo da corte”, Marcelo afirmou que as operações eram tratadas diretamente com o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega. Contou que o PT não usou o valor da contrapartida pela medida provisória do Refis na campanha de 2010, mas cobrou a propina para a campanha de Dilma, de 2014. A assessoria da petista negou que ela tenha autorizado pagamentos via caixa dois em suas campanhas presidenciais.

Alívio
No Palácio do Planalto, o depoimento foi recebido com alívio, porque o empresário acusou Dilma frontalmente, ao dizer que a ex-presidente da República tinha pleno conhecimento das operações, mas poupou o presidente Michel Temer de uma acusação formal de recebimento de dinheiro de caixa dois, como se especulava. O ex-presidente da Odebrecht confirmou o encontro com Temer para tratar de doações para o PMDB, mas disse não ter discutido valores com o então vice-presidente.

Além de Marcelo Odebrecht, outros quatro executivos da companhia devem ser ouvidos a pedido do TSE. Ontem, prestaram depoimento Benedicto Barbosa da Silva Junior e Fernando Reis no Rio de Janeiro; Cláudio Melo Filho e Alexandrino de Salles Ramos vão falar na próxima segunda-feira, em Brasília. O depoimento do ex-presidente da empreiteira deslocou o presidente Temer do foco das acusações, mas isso não significa que o assunto esteja encerrado.

Marcelo Odebrecht disse não ter tratado de valores com Temer, mas que esse assunto foi discutido entre o ex-vice-presidente de Relações Institucionais da empreiteira Claudio Mello Filho e o ministro licenciado da Casa Civil, Eliseu Padilha, cuja situação fica cada vez mais complicada na Lava-Jato. Na delação, Melo Filho contou que Temer pediu R$ 10 milhões a Marcelo Odebrecht, o que o ex-presidente da empresa não confirmou. Parte do valor destinado ao PMDB, segundo Mello Filho, foi repassada via Padilha no escritório do advogado paulista José Yunes, ex-assessor de Temer.

Na semana passada, Yunes prestou depoimento espontaneamente. Confirmou ter recebido um “pacote” destinado a Padilha em seu escritório, do qual desconhece o conteúdo. Ex-assessor da Presidência e amigo de Temer, o advogado disse ter sido uma “mula involuntária” do ministro licenciado da Casa Civil. O depoimento está sendo interpretado como uma atitude de Yunes para proteger o presidente da República.

Aécio e Marina
Marcelo Odebrecht também disse à Justiça Eleitoral que a empreiteira destinou recursos para as campanhas de Aécio Neves (PSDB), Eduardo Campos (PSB) e Marina Silva (que substituiu Campos como candidata do PSB), mas não esclareceu se os pagamentos foram feitos via caixa dois. O tucano teria pedido R$ 15 milhões no fim do primeiro turno das eleições, mas Marcelo Odebrecht se recusou a fazer a doação diretamente. O dinheiro teria sido repassado para aliados do tucano, por meio do ex-diretor da Odebrecht Sérgio Neves e do empresário Osvaldo Borges, apontado como operador do tucano. Aécio e Marina negam a existência de caixa dois nas respectivas campanhas.

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