quinta-feira, 30 de março de 2017

Governo anuncia corte de R$ 42,1 bi em despesas

Por Fabio Graner, Cristiane Bonfanti e Edna Simão | Valor Econômico

BRASÍLIA - Com uma reviravolta de última hora decorrente da impossibilidade de considerar a receita de precatórios não sacados há mais de dois anos, o governo anunciou na noite de ontem um corte orçamentário de R$ 42,1 bilhões. Desse total, R$ 10,5 bilhões são de investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), outros R$ 10,9 bilhões de emendas parlamentares regulares e obrigatórias e mais R$ 20,1 bilhões nos demais gastos dos ministérios.

Do lado das receitas tributárias o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, confirmou a reoneração da folha de pagamentos das empresas com a contribuição previdenciária, que deve render R$ 4,8 bilhões aos cofres públicos, e a incidência de IOF sobre cooperativas de crédito, que devem render mais R$ 1,2 bilhão ao caixa da União.

Três setores ficaram fora do alcance da reoneração da folha. São eles: construção civil e obras de infraestrutura, transportes rodoviários, metroviários e ferroviários de passageiros e comunicações, por serem considerados intensivos em mão de obra e onde a desoneração da folha teria produzido efeitos benéficos.

Outros R$ 10,1 bilhões serão obtidos com a relicitação das usinas hidrelétricas da Cemig, cujas concessões venceram. Para contar com essas receitas de forma líquida e certa, o governo esperou as decisões do Superior Tribunal de Justiça que se completaram ontem.

Em relação aos precatórios, o ministro da Fazenda explicou que, após consultas ontem a ministros do STJ, ficou claro que o governo não poderia contar com uma receita estimada em R$ 8,7 bilhões.

Segundo ele, havia uma questão procedimental, decorrente da interpretação do Tribunal de Contas da União (TCU), de que receitas sem garantia não podem ser incorporadas nas contas. Os precatórios não sacados só poderão ser usados pelo governo para fechar as contas após decisão de cada juiz responsável pela causa que o originou.

"Na medida em que os precatórios sejam liberados para a União, isso vai diminuir substancialmente o valor contingenciado, levando a uma redução esperada de cerca de R$ 8 bilhões, podendo chegar a cerca de R$ 8,7 bilhões", disse o ministro.
Desde a semana passada, a decisão do governo em torno do contingenciamento vinha sendo aguardada, depois de se anunciar a deficiência orçamentária de R$ 58,2 bilhões sem as medidas para fechar o rombo e garantir o cumprimento da meta fiscal de déficit de R$ 139 bilhões neste ano.

Tentou-se, até a tarde de ontem, reduzir o contingenciamento para cerca de R$ 32 bilhões. No entanto, o corte teve que ser maior do que desejava o governo pela subtração das receitas dos precatórios.

Na manhã de ontem, os Ministérios da Fazenda e do Planejamento divulgaram nota conjunta para mostrar o quanto o orçamento da União está engessado. O montante total passível de contingenciamento no Orçamento de 2017 era de R$ R$ 132,8 bilhões. Desse total, informou, R$ 36,7 bilhões são despesas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

A nota destacou que, "mesmo que toda a despesa do PAC fosse contingenciada, o que não seria possível, porque parte das obras já está em andamento, não seria suficiente para compensar a deficiência de R$ 58,2 bilhões do Orçamento deste ano". "Portanto, caso fosse praticado um corte do tamanho da insuficiência orçamentária existente para o cumprimento da meta fiscal estabelecida na LDO, ou seja, se fossem cortadas R$ 58,2 bilhões de despesas, seriam eliminadas 44% de todas as despesas discricionárias do governo central". "Na prática, esse montante significaria a impossibilidade de o governo federal terminar o ano fiscal de 2017 sem comprometer despesas importantes nas áreas de saúde e educação".

A opção política do governo de não elevar impostos justifica o contingenciamento R$ 42 bilhões do orçamento, montante maior que os R$ 30 bilhões esperados, na avaliação do economista Juan Jensen, sócio da 4E consultoria. Ele considerou o anúncio do governo satisfatório "dentro do que é possível" para cumprir a meta de déficit primário de R$ 139 bilhões para este ano. "Tem que ver como será a execução, mas R$ 42 bilhões é um corte robusto, e o que está colocado de arrecadação com receitas não recorrentes me parece factível", disse Jensen.

A decisão do governo de não elevar impostos para cobrir a "deficiência" de R$ 58,2 bilhões no Orçamento neste ano foi acertada, na avaliação de Alexandre Espírito Santo, economista da Órama Investimentos e professor do Ibmec do Rio. "O país já tem carga tributária muito elevada e a alta de tributos reduz a renda disponível", diz ele, o que poderia atrapalhar a recuperação da atividade econômica. O fim da possibilidade de contribuição previdenciária sobre o faturamento, não deve ser considerado uma alta de impostos, diz Espírito Santo. "Entre o fim da desoneração da folha e alta da carga tributária, é muito melhor encerrar a desoneração", diz ele. (Colaboraram Tainara Machado e Ligia Guimarães, de São Paulo)

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