terça-feira, 25 de abril de 2017

A presença certa de Lula em 2018 | Cristian Klein

- Valor Econômico

Desafio da Lava-Jato é fazer de Lula preso comum

A eleição de 2018 ocorrerá sob a influência da figura de Lula, esteja o ex-presidente elegível ou não; em liberdade ou na tranca.

Solto e em condições de concorrer, apontam as pesquisas, Lula é o candidato mais competitivo no primeiro turno - o homem certo para manter unida as hostes do PT e reduzir os riscos da desidratação da bancada federal do partido.

Preso, Lula será o líder popular e ex-presidente da República que oferecerá à esquerda um cabo eleitoral martirizado. Uma candidatura deste campo ideológico que tente ignorar a presença do petista - ainda que pela ausência dele - desperdiçará votos.

Candidaturas do campo antagônico que não explorarem o tonitruante fato político serão tomadas por ingênuas. Como não há bobo numa corrida presidencial, é justamente Lula e o antipetismo a alavanca para o discurso da direita.

Não tem sido outra a estratégia de João Doria, em São Paulo. O prefeito ataca o ex-presidente para arrancar espaço no PSDB e nacionalizar seu nome, ainda pouco conhecido na massa. Doria é o maior beneficiário do ambiente de devastação promovida pela Operação Lava-Jato. Com o desenrolar das investigações e, sobretudo, a delação da Odebrecht, pouco sobrou dos personagens de relevo na esfera nacional ou estadual. Lula, Aécio Neves, Geraldo Alckmin, José Serra - os pesos-pesados das últimas quatro eleições presidenciais - estão feridos.

O governo Temer está tão fragilizado pelas denúncias que atingem um terço do primeiro escalão - e pelo desgaste com as reformas previdenciária e trabalhista - que não tem condições de cogitar senão a sobrevivência. A corriqueira solução pela qual governistas lançam ministros à Presidência - como ocorreu com Dilma Rousseff - é praticamente uma impossibilidade. Na Esplanada, há fila de oito candidatos prontos para serem ejetados de seus ministérios. Não é trampolim para posto mais alto; é cadafalso para Lava-Jato.

A classe política foi abatida a tal ponto que recai sobre um prefeito - representante da terceira esfera de governo, ainda que da maior cidade do país - as esperanças do espectro liberal/conservador.

O destino de Doria, caso se confirme o enredo, será enfrentar a experiência ou o fantasma de Lula. Sabedor do desafio, o tucano já iniciou o debate. Terá a herança que procuradores e o juiz Sergio Moro - ou magistrado de instância superior - vierem a lhe deixar.

Por mais que tome cuidado, que se juntem provas, a grande dificuldade da Lava-Jato é prender Lula como um preso comum. É não transformá-lo num preso político. É nesta condição que o petista se apresentará.

Não será muito difícil dado o ainda alto nível de popularidade do ex-presidente, e vista a demonstração de proximidade de Moro quando fotografado com Aécio e, mais recentemente, Temer.

É certo que o presidente cumpria papel institucional no ato em que o juiz recebeu honraria militar no Dia do Exército. Mas Moro já teve a devida cautela de se desvencilhar de Jair Bolsonaro. O magistrado não apertou as mãos do parlamentar, quando o deputado o abordou no aeroporto de Brasília, no vídeo que viralizou nas redes sociais. Bolsonaro tem ideias políticas radicais, mas é representante de instituição democrática e não aparece na Lava-Jato - diferentemente de Aécio e Temer, citados nas delações da Odebrecht. A política vive de símbolos dos quais grandes personagens, como Moro, não podem se distanciar, mesmo que o queira. A bolha de imparcialidade é infactível.

A personificação dramática da Lava-Jato num duelo de western entre o xerife e o ex-presidente tomado por um bandido fora da lei é a cena mais esperada dos próximos capítulos da crise política nacional. Aguarda-se o encontro em Curitiba com ansiedade.

Mas a prisão ou a eleição de Lula não dará o final feliz - ou a paz de cemitério - que se espera de um desfecho para a encalacrada em que o país se meteu. As opções não são animadoras.

Com a prisão, cresce a probabilidade de o ex-sindicalista promover e retomar a identificação com movimentos de trabalhadores que preparam para esta sexta-feira uma greve geral. A inércia da economia e a sensação de perda de direitos com as reformas no Congresso criam clima favorável a novas mobilizações.

Ao mesmo tempo, não é desprezível a capacidade de PT e centrais sindicais difundirem suas teses, como a de que o impeachment foi golpe. Como não é pequena a chance de que o partido articule suas conexões para dar ao caso dimensão internacional. Lula não é Mandela, mas vai tentar.

Com a candidatura e eventual eleição de Lula, a temperatura política tende a se elevar de maneira a repetir a polarização que se deu já nos preparativos para a campanha de reeleição de Dilma. A tal "onda conservadora" vê em Temer apenas instrumento para chegar ao seu fim, à sua representação, ao projeto em busca de um novo líder. A esquerda tem um velho líder - alvejado - e uma agenda em parte adotada pela era PT, mas fragilizada pela crise econômica, pela reação dos contrariados e pela concessão à corrupção.

Derrotar Lula tornou-se prioridade. Não importa se as delações dos executivos da Odebrecht tenham comprometido o sistema político como um todo. O ex-presidente parece ter tantos simpatizantes quanto detratores, o que torna o jogo eleitoral em 2018 mais virulento com sua presença e um possível governo sob sua condução, aparentemente mais instável.

Terá sido surpreendente se ocorrer o contrário. Na Itália, onde houve algo semelhante à Lava-Jato, a mudança no poder central foi radical, com a ascensão do não político Silvio Berlusconi. Faltou aos italianos, porém, um governo de transição como Temer, com considerável potencial de reabilitar os partidos tradicionais na disputa - seja com velhas ou novas caras.

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