quinta-feira, 27 de abril de 2017

Avanço é maior no resultado nominal | Ribamar Oliveira

- Valor Econômico

Corte deste ano garante teto de gasto em 2018 e 2019

Na área fiscal, o Brasil vive um fenômeno interessante. O resultado nominal das contas públicas (aquele que considera todas as despesas, incluindo o pagamento de juros das dívidas) está melhorando mais rapidamente do que o resultado primário (exclui o pagamento dos juros). É muito provável, e o mercado já acredita nisso, que o presidente Michel Temer passe o governo para o próximo presidente da República com dívida bruta abaixo de 80% do Produto Interno Bruto (PIB).

Em julho do ano passado, poucos acreditavam que isso fosse possível. Em certo sentido, o mercado deu um voto de confiança ao governo, pois apostou que os problemas fiscais do setor público brasileiro serão resolvidos mesmo antes do resultado concreto das reformas.

No fim de 2016, a dívida pública bruta ficou três pontos percentuais do PIB abaixo da estimativa que predominava no mercado. Em fevereiro, ela estava em 70,6% do PIB. Para este ano, o mercado projeta, de acordo com o boletim Prisma do Ministério da Fazenda, que a dívida ficará em 75,4% do PIB e em 78,5% do PIB para 2018. O próprio Banco Central reviu a sua estimativa. Em dezembro passado, projetava que a dívida bruta ficaria em 76,9% do PIB no fim deste ano. Agora, acha que ela ficará em 76,2% do PIB.

O fato é que o déficit nominal do setor público brasileiro ficou em 10,22% do PIB no fim de 2015, caindo para 8,98% do PIB no fim de 2016. Em dezembro do ano passado, o mercado previa que o déficit nominal neste ano ficaria em 9,05% do PIB. No último relatório Focus, editado pelo BC, os analistas de fora do governo reduziram a projeção para 8,5% do PIB. O governo trabalha com déficit nominal de 8% do PIB neste ano e com 7% do PIB em 2018. As estimativas tanto do governo quanto do mercado são de que o resultado nominal continuará melhorando ao longo dos próximos anos. Ainda, porém, em um nível elevado.

A mudança significativa da trajetória do déficit nominal foi produzida, de acordo com fontes da área econômica, por três fatores principais. O primeiro, e talvez o mais importante, foi a melhora nas expectativas de inflação, que está permitindo uma queda forte e continuada dos juros.

Hoje, a mediana das estimativas das instituições financeiras é que a taxa Selic ficará em 8,5% ao ano até dezembro. Há seis meses, poucos apostavam em tal cenário. O consenso do mercado era que a Selic iria para 10,75% no fim deste ano. Juros menores significam despesas menores do setor público com suas dívidas. Isso puxou a trajetória da dívida em proporção do PIB para baixo.

Outras medidas adotadas pelo Ministério da Fazenda também foram fundamentais. A primeira foi a decisão de obrigar o BNDES a antecipar o pagamento de R$ 100 bilhões dos empréstimos que recebeu do Tesouro. Depois da aprovação da medida pelo Tribunal de Contas da União (TCU), o governo utilizou os recursos para abater a dívida.

Neste momento, o BNDES possui algo em torno de R$ 170 bilhões para empréstimos. O acúmulo de recursos no caixa resulta de retornos de créditos concedidos no passado. O banco estatal, provavelmente, não encontrará demanda para tanto dinheiro. A área econômica sonha que, em algum momento, o BNDES poderá fazer outra antecipação de pagamento, o que resultaria em nova redução da dívida. A questão, no entanto, ainda não está na agenda.

Desde a época do ex-ministro Joaquim Levy, o Ministério da Fazenda luta para reduzir a despesa com subsídios, como forma de controlar a dívida. O Programa de Sustentação do Investimento (PSI) acabou. O único programa que ainda conta com subsídios é o Moderfrota.

A decisão do governo de mudar a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), com a criação da TLP, vai ajudar bastante a diminuir as despesas com subsídios e, assim, o crescimento da dívida pública. Nos próximos anos, os juros da TLP deverão convergir para os juros da NTNB de cinco anos.

A trajetória do resultado primário, por sua vez, não é tão favorável. O setor público está registrando déficit em suas contas pelo quarto ano consecutivo e não é possível ainda saber quando será obtido o primeiro superávit primário. O Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) para 2018, encaminhado pelo governo ao Congresso em meados de abril, prevê um pequeno superávit de 0,3% do PIB para 2020.

A projeção do PLDO, no entanto, parece expressar mais um desejo da área econômica. As autoridades ouvidas pelo Valor concordam que tudo dependerá da recuperação da receita tributária da União. O fato é que o Tesouro perdeu 1,9 ponto percentual de receitas no período de 2011 a 2016, excluindo-se a regularização de ativos de brasileiros no exterior - a "repatriação de recursos".

O mais complicado é que a própria Receita Federal está muito cautelosa sobre a trajetória de recuperação da arrecadação nos próximos anos. Ninguém se arrisca a estimar uma tendência, principalmente porque, durante a profunda recessão vivida pelo país, as empresas acumularam grande quantidade de créditos que irão usar para reduzir o pagamento de tributos. O maior desafio para o setor público, no entendimento da área econômica, é produzir superávit primário. A única certeza que os técnicos têm é que não será possível conseguir o superávit apenas com corte de despesas. Terá que ser pelo aumento da receita, proveniente do crescimento da economia ou do aumento da carga tributária.

Outro desafio do governo será manter as despesas da União dentro dos limites definidos pela emenda constitucional 95. Para 2018 e 2019, os técnicos consideram que não haverá problema. No curto prazo, a economia com a reforma da Previdência é muito pequena, mas o corte de R$ 42,2 bilhões realizado nas dotações orçamentárias deste ano abrirá espaço para acomodar o aumento dos gastos nos próximos dois anos. Mesmo que o governo consiga reduzir o contingenciamento de R$ 42,2 bilhões para R$ 30 bilhões, como deseja. A reoneração da folha de pagamento, promovida pela medida provisória 774, dará uma redução adicional de despesa de cerca de R$ 8 bilhões. Somados aos R$ 30 bilhões, haveria um espaço para novos gastos de R$ 38 bilhões nos próximos anos, mantendo a meta fiscal. Se houver receita, é claro.

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