sábado, 27 de maio de 2017

Delações da JBS em xeque

Gilmar Mendes quer submeter acordo com donos do frigorífico ao plenário do Supremo

Eduardo Bresciani e Carolina Brígido | O Globo

-BRASÍLIA- Depois de defender que o Supremo Tribunal Federal (STF) revise a decisão que manda para a prisão condenados em segunda instância, o ministro Gilmar Mendes abriu nova polêmica. Disse que a homologação das delações dos donos da JBS, Joesley e Wesley Batista, deve ser submetida ao plenário. Gilmar ressaltou que a lei determina caber ao juiz a homologação, mas que, em caso de tribunais colegiados, isso deveria ser submetido aos demais ministros.

Ao menos quatro ministros do Supremo defendem que pontos específicos das delações premiadas dos donos da JBS sejam revistos pelo plenário da corte. Além de Gilmar Mendes, o próprio relator da Lava-Jato, ministro Edson Fachin, estaria cogitando essa possibilidade. A delação dos donos da JBS tem provocado polêmicas, porque eles conseguiram direito a imunidade e autorização para morar nos Estados Unidos. Houve ainda questionamento sobre o valor da multa aplicada. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, escreveu artigos defendendo o teor do acordo celebrado. Ontem, Gilmar disse que, se quiser, o relator da Lava-Jato pode levar o caso ao plenário, na forma de questão de ordem.

— Eu tenho a impressão de que nós vamos ter que discutir esse tema da homologação. Eu já tinha discutido com o ministro Teori (Zavascki, antigo relator da Lava-Jato) no sentido de que essa matéria fosse discutida pela turma. Porque o que a lei diz? Que o juiz é quem homologa, mas o juiz aqui não é o relator. Quando se trata de tribunal, é o próprio órgão. Ele pode até fazer a homologação prévia, mas sujeita a referendo — disse Gilmar.

Normalmente, as questões referentes à Lava-Jato são submetidas à Segunda Turma, composta de cinco ministros. Mas, como a delação da JBS levanta suspeita contra o presidente Michel Temer, o assunto seria levado ao plenário, em um julgamento com os onze integrantes da Corte.

— A mim me parece que nesse caso, como envolve o presidente da República, certamente vamos ter que discutir o tema no próprio plenário. O caso do Sérgio Machado já tinha provocado muita especulação e, nessa época, nós discutimos essa temática com essa perspectiva — lembrou Gilmar.

OUTROS MINISTROS APOIAM POSIÇÃO
Marco Aurélio Mello concorda com o colega:

— Realmente, a negociação pode partir do Ministério Público, mas quem fixa os benefícios é o Judiciário. Nesta delação de agora (da JBS), o ministro Edson Fachin somente homologou o acordo nos aspectos formais, não o conteúdo em si. O conteúdo em si será avaliado pelo órgão julgador, que é o plenário do Supremo — afirmou Marco Aurélio.

Um outro ministro do tribunal afirmou que, recentemente, a Procuradoria-Geral da República tem firmado delações premiadas com bases muito frouxas para os investigados. A principal crítica é contra as penas brandas, em contraste com a gravidade dos crimes praticados.

— Fica fácil fazer delação assim, com penas tão amigáveis. O STF não pode permitir que isso fique assim — disse o ministro.

Fachin tem ouvido de colegas do tribunal e também de juízes auxiliares que atuam em seu gabinete que é possível rever pontos do acordo, mesmo depois da homologação. O relator estaria estudando essa possibilidade. A solução jurídica para esse impasse ainda não teria sido delineada no tribunal.

Gilmar Mendes voltou a defender que a Corte possa rever o entendimento que permitiu prisões a partir da condenação em segunda instância. Ele destacou que recebeu argumentos da Defensoria Pública do Rio de Janeiro de que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) acaba muitas vezes por rever decisões tomadas em segunda instância e disse entender que pode ser debatida a possibilidade de só fixar a execução a partir de decisões do STJ.

— Manteria o mesmo entendimento só que colocaria mais uma instância que examina essas questões. Quem me impressionou muito foi o grupo da defensoria que mostrou resultados estatísticos muito plausíveis. E estamos falando de réus pobres — disse o ministro.

Gilmar relatou que o ministro Dias Toffoli já fez essa proposta e admitiu que ele próprio estaria disposto a mudar o entendimento para acatar a tese do colega:

— O ministro Toffoli trouxe essa argumentação e nós estamos fazendo essa análise. E eu me balançaria, eventualmente, na oportunidade de se colocar no plenário, de fazer uma revisão.

A permissão para a execução penal em segunda instância foi decidida pelo STF em uma votação por 6 a 5. Gilmar ficou do lado vencedor e somente sua mudança já seria suficiente para rever a jurisprudência. Além disso, o ministro Teori Zavascki, que votou a favor da prisão em segunda instância, foi substituído por Alexandre de Moraes, que ainda não se manifestou em julgamento sobre o tema.

Gilmar disse que uma mudança na jurisprudência poderia ser feita com ajustes, que incluiriam pedir celeridade ao STJ na análise dos processos. Ele ressaltou que foi por iniciativa sua que a decisão sobre a prisão em segunda instância foi levada a plenário. Segundo o ministro, o modelo adotado desde o ano passado tem gerado muitas “confusões” e, por isso, valeria o conjunto de ministros do Supremo enfrentar novamente o debate.

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