quarta-feira, 17 de maio de 2017

Inflação e juros em queda favorecem a recuperação

Por Sergio Lamucci | Valor Econômico

SÃO PAULO - Notícias favoráveis se sucederam nas últimas semanas e mostram que a atividade econômica está em recuperação. O resultado do PIB no primeiro trimestre, a ser anunciado no dia 1º, deve ser positivo, a inflação segue baixíssima e os juros tendem a cair com mais força. No momento em que a Câmara se prepara para votar a reforma da Previdência, esse quadro mais favorável na economia pode ajudar o governo Temer, cuja popularidade é muito baixa.

Analistas ouvidos pelo Valor observam que há espaço para continuidade da recuperação nos próximos 18 meses, principalmente por causa da inflação baixa e dos juros em queda. Se for confirmada a previsão do IBC-Br, indicador do Banco Central, o PIB deve ter crescido 1,1% no primeiro trimestre em relação ao anterior. No dia 2 de junho, o BC deve cortar a Selic em 1,25 ponto percentual, para 10% ao ano - o mercado já prevê até 7,5% no fim de 2017.

Ontem, os números do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostraram que em abril foram criados quase 60 mil postos de trabalho, número superior às expectativas. Apesar desse resultado, o mercado de trabalho continua bastante adverso, com 14,2 milhões de desempregados. O próprio Caged de abril revela uma perda de 34 mil vagas na série com ajuste sazonal.

A queda da inflação é outro dado favorável. O IPCA, índice oficial, pode ser inferior a 4% neste ano, abaixo da meta de 4,5%. A combinação de recessão profunda com juros altos quebrou a inércia inflacionária. Para completar, os preços dos alimentos estão contidos graças à supersafra agrícola.

A retomada da atividade, porém, ainda não é contínua. Em abril, vários indicadores serão fracos, em parte por causa do menor número de dias úteis. A produção de veículos, por exemplo, recuou 3,9% em relação a março. Indicadores do trimestre atual poderão mostrar resultados contraditórios, com alta em um mês e recuo no seguinte. Uma retomada mais consistente dependerá de como e quão rápido reagirá a demanda.

Conjunto de sinais melhores na economia pode ajudar reformas
A recuperação da atividade ainda não se firmou completamente, mas algumas notícias mais favoráveis começaram a aparecer nas últimas semanas, uma tendência que tende a se repetir nas próximas. O resultado do PIB no primeiro trimestre a ser anunciado deverá ser positivo, a inflação segue baixíssima ou em terreno negativo e os juros tendem a cair com mais força. Num momento em que a Câmara dos Deputados se prepara para votar a reforma da Previdência, um quadro mais favorável na economia pode ser de alguma ajuda para um governo com uma popularidade muito baixa.

"Seria bom o sistema político, nas votações à frente, enxergar o enorme espaço da recuperação cíclica nos próximos 18 meses com inflação e juros baixos", diz o economista-chefe da Tullett Prebon, Fernando Montero. Ele lembra que o PIB no primeiro trimestre deve mostrar a primeira reação desde 2014 - o Índice a Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), espécie de prévia do PIB, mostrou alta de 1,1% em relação ao quarto trimestre, feito o ajuste sazonal.

O resultado do PIB será divulgado em 1º de junho e, "um dia antes, o BC deverá cortar a Selic em 1,25 ponto percentual, encostando-a num dígito", nota Montero. A expectativa dominante hoje é de que a taxa cairá de 11,25% para 10%, e cresceram as apostas de que os juros vão encerrar o ano abaixo de 8%, diz. O próprio Montero projeta uma Selic de 7,75% ao ano em dezembro, o Bank of America (BofA) Merrill Lynch aposta em 7,5%, o Itaú Unibanco, em 7,25% e o Fibra, em 7%.

Ontem, os números de abril do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostraram que as admissões superaram as demissões em quase 60 mil postos de trabalho, um número superior às expectativas do mercado. "Esse mesmo mês de abril de 2016 tinha registrado uma destruição líquida de 62.844 empregos", observa Montero, notando que, na indústria, houve a primeira criação de vagas para esse mês em quatro anos e, em serviços, a primeira em três anos.

É verdade que o quadro para o mercado de trabalho continua bastante adverso, com a taxa de desemprego tendo alcançado 13,7% no primeiro trimestre, o equivalente a 14,2 milhões de trabalhadores desocupados. O próprio Caged de abril revela uma perda de 34 mil vagas na série com ajuste sazonal calculada pela Tullett Prebon. Ainda assim, Montero enxerga um "retrato razoável para o emprego, uma das últimas variáveis a responder ao ciclo econômico, especialmente considerando o nível de ociosidade na economia". E, desde dezembro, a perda de vagas tem diminuído em termos dessazonalizados.

A forte queda da inflação é outro fator favorável. Os índices de preços têm surpreendido seguidamente para baixo, mostrando um quadro inflacionário sob controle. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) pode ter alta inferior a 4% neste ano, confortavelmente abaixo da meta de 4,5%. A combinação de uma recessão cavalar com juros altos enfim quebrou a inércia inflacionária. Para completar, os preços de alimentos também tem ajudado, devendo ter uma alta muito pequena no ano, graças à supersafra agrícola. Essa inflação cadente vai permitir ao BC cortar mais os juros e, na visão de grande parte dos analistas, acelerar a redução da Selic. Há também obviamente uma melhora do poder de compra dos trabalhadores.

Em relatório, o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, enfatiza o bom resultado do Índice Geral de Preços - 10 (IGP-10) de maio, com queda de 1,1%. O comportamento foi favorável no atacado, no varejo e no componente de custos da construção, ressalta ele. "A primeira boa notícia é que contratos indexados a IGPs estão sendo reajustados abaixo da meta de inflação medida pelo IPCA. Um componente relevante da inflação via indexação está caindo e vai puxar a média para baixo." Outra boa notícia, segundo Gonçalves, é que a forte queda dos preços no atacado passará, ao menos em parte, para os índices ao consumidor.

Montero também ressalta o impacto positivo da safra deste ano para a economia, que deve ser 26,2% maior que a do ano passado. "A quarta estimativa do IBGE para a safra de 2017 aponta 233,1 milhões de toneladas de cereais, leguminosas e oleaginosas. Isso equivale a um ganho de 48,4 milhões de toneladas ante a safra de 184,7 milhões de 2016 ou mais 233 kg de grãos por brasileiro", compara ele, lembrando que o Brasil exporta um pouco mais da metade de sua safra - foram cerca de 100 milhões de toneladas em 2016. "A infraestrutura, entretanto, dificultará escoar esse tamanho salto em volume e, até mesmo, estocá-lo. Essa fenomenal oferta agrícola despejará boa parte ao mercado interno que, assim, terá que consumi-la."

No PIB, essa supersafra foi a principal responsável pelo crescimento registrado no primeiro trimestre, segundo os analistas. É possível que haja uma variação negativa da agropecuária no segundo trimestre, depois da expansão superior a dois dígitos esperada para o setor a no período de janeiro a março, mas o segmento continuará a ajudar nos demais trimestres, assim como a queda da inflação e os juros menos altos, diz Montero. "Um bom primeiro trimestre e o encaminhamento das reformas pode garantir a confiança no segundo semestre." Se a reforma da Previdência não passar ou for muito diluída, os analistas apontam o risco de reversão da melhora da economia, especialmente pelo impacto sobre a confiança.

A retomada da atividade, porém, ainda não engatou um ritmo forte. Em abril, a expectativa é que vários indicadores venham fracos, em parte por causa do menor número de dias úteis. Foram 18 neste ano, e além disso houve a greve geral no dia 28. Em 2016, abril teve 20 dias úteis. A produção de veículos, por exemplo, recuou 3,9% em relação a março, segundo o ajuste sazonal da MCM Consultores , com base nos números da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).

A herança estatística negativa deixada pelo recuo da produção industrial em março, de 1,8% sobre fevereiro, também deve atrapalhar os números de atividade do segundo trimestre. O carregamento estatístico ficou em -1,2%, o que quer dizer que, se a indústria não crescer nada em relação ao nível de março, haverá uma queda no segundo trimestre de 1,2% em relação aos três meses anteriores.

Desse modo, indicadores relativos ao segundo trimestre poderão mostrar resultados contraditórios, com uma alta num mês sendo sucedida por um recuo no mês seguinte. Alguns analistas veem a possibilidade de um PIB negativo de abril a junho, embora várias outras projeções apontem para estabilidade ou pequena alta. Nas próximas semanas, porém, haverá alguns resultados importantes, como o do PIB do primeiro trimestre e a queda mais forte da Selic, num momento em que os deputados discutem a reforma da Previdência, considerada fundamental para tornar viável o cumprimento do teto de gastos e para garantir a sustentabilidade das contas públicas.

Montero ressalta outro ponto. "Como e quão rápido reagirá a demanda é o reverso da questão sobre quanto poderão cair os juros. A chave é que temos dois problemas - juros astronômicos e demanda anêmica - que juntos fazem uma solução. O que nos permite juntar esses dois problemas para ver quanto um cancela o outro é a inflação baixa, que atesta a grande ociosidade e libera os juros."

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